Imagens retocadas, gentilmente cedidas por Fernando Martins, neto de Fernando Tito Martins.
Imagens retocadas, gentilmente cedidas por Fernando Martins, neto de Fernando Tito Martins.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagens retocadas, gentilemente cedidas por Luis Deveza Portugal, neto de Luiz Portugal, que aparece com a sua mulher, na fotografia.
Armindo Monteiro, aqui ministro português das Colónias em 1932 (sentado, 5º a contar da esquerda), merece uma curta nota. Um indivíduo culto, sofisticado e cosmopolita, formado durante a 1ª República e que a sobreviveu politicamente, terá sido efectiamente a “concorrência” de Salazar pelo cargo de primeiro ministro (ele foi nomeado precisamente em 1932) e o principal mencionável para o substituir, excepto que a Velha Raposa o driblou sucessivamente (a começar pelo cargo de ministro das Colónias entre 1931 e 1935, depois de ter sido uma espécie de adjunto do ditador nas Finanças), depois ministro dos Negócios Estrangeiros, até o afastar em 1943, altura em que Monteiro foi exonerado do cargo de embaixador em Londres (1937-1943) para um confortável cargo de administração (em Lisboa) na Refinaria Colonial, uma empresa da “moçambicana” Sena Sugar Estates. Para um esboço biográfico mais completo de Armindo Monteiro, ver aqui.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagem retocada.
O texto original veio da Enciclopédia Portuguesa e Brasileira de Cultura, vol. III, pág. 229, mas foi muito significativamente editado por mim.
Esboço Biográfico
Álvaro Xavier de Castro nasceu na Cidade da Guarda em 9 de Novembro de 1878, filho do Dr. José de Castro e de Maria Benedita de Castro Pignatelli.
Acabou o curso de oficial de infantaria em 1901, o curso de Direito em 1908 e ainda um terceiro curso que pelos vistos havia naquela altura, o de Assuntos Coloniais, em 1911, aqui já com 33 anos de idade.
Republicano convicto desde cedo (ou seja, anti-monarquia constitucional, que era o regime português até 5 de Outubro de 1910), colaborou na Revista Nova e na Arte e Vida, participando activamente em conspirações republicanas contra os Bragança em Coimbra em 1908 e em 1910.
Após o golpe militar que derrubou o Rei D. Manuel II, Álvaro foi feito deputado na Assembleia Constituinte de 1911, integrando o chamado grupo dos «Jovens Turcos», sendo ministro da Justiça no governo de Afonso Costa, em Janeiro de 1913 e ministro das Finanças no governo de Azevedo Coutinho, em Dezembro de 1914.
Foi uma das figuras que liderou a chamada Revolução de 14 de Maio de 1915 que, tendo provocado um banho de sangue em Lisboa, conseguiu derrubar o governo da altura, de Pimenta de Castro.
Nomeado então, como todos os outros dirigentes revolucionários, para postos chaves que permitissem levar a uma participação activa de Portugal na I Guerra Mundial, assim consolidando a periclitante república com uma mobilização e um banho de sangue, foi nomeado Governador-Geral de Moçambique nesse mesmo ano, substituindo Alfredo Baptista Coelho e assumindo o cargo em 31 de Outubro de 1915 na colónia onde, desde o final de 1914, os alemães assediavam a meia dúzia de portugueses lá em Cabo Delgado. Mais tarde, e adicionalmente, assumiria mesmo o comando das forças expedicionárias portuguesas em Moçambique, em Abril de 1917, após a demissão do general Ferreira Gil, em 24 de Dezembro de 1916.
Ainda não estudei o que é que exactamente ele andou a fazer em Moçambique entre 1915 e 1918, para além de se meter na questão da guerra com os alemães, que, aliás, essencialmente, foi mais ou menos o mesmo que a maior parte da chamada guerra colonial: era uma coisa qualquer, perdida lá nos confins do Norte, no meio do mato, de que se ouvia dizer qualquer coisa em Lourenço Marques, e em que quase todos os mortos (uns expressivos cinco mil) viriam a morrer de picadas de mosquitos, de acidentes, de ataques de feras, de má nutrição e da falta de tudo um pouco.
E isto tudo, basicamente, no caso de Moçambique, por causa de um tal genial alemão, Paul Emil von Lettow-Vorbeck e um punhado de Askaris, que vieram da colónia alemã a Norte de Moçambique.
Em 2016, por causa do apresamento dos navios alemães atracados em vários portos portugueses, neutrais, entre os quais Lourenço Marques e penso que na Beira (foram divididos com os britânicos) o Império alemão declarou guerra a Portugal. Foi uma formalidade: os alemães andavam aos tiros com os portugueses em Angola e Moçambique há já algum tempo.
Em 17 de Dezembro de 1917 Álvaro demitiu-se do cargo de Governador-Geral de Moçambique (sendo sucedido por Pedro Massano de Amorim) devido a mais uma tomada do poder, em Lisboa, desta vez do sedutor e episódico Sidónio Pais, de quem ele não gostava, tendo sido muito activo na Revolta de Santarém, em Janeiro de 1919, desencadeada contra o regime Sidonista, o qual, no entanto, efectivamente, terminara com o súbito assassinato do próprio Sidónio em plena gare da estação ferroviária do Rossio, em Lisboa, em meados de Dezembro de 1918, ou seja um mês depois do fim da Primeira Guerra Mundial e um mês antes da sua revolta.
Politicamente a Primeira República foi uma carnificina abjecta e uma espécie de guerra civil disfarçada, uma nojeira com um nível de violência tal que justificaria a futura ditadura de Salazar e faria o sonâmbulo rotativismo da monarquia parecer quase idílico.
Na altura Álvaro aproveitou os tempos livres que tinha entre cargos e revoltas e escreveu o livro África Oriental Portuguesa [Lisboa, 1918 e que infelizmente ainda não li] e ainda fundou o seu próprio partido político, o Partido Republicano de Reconstituição Nacional – também chamado o «Reconstituinte» – via uma cisão do Partido Democrático, tendo presidido a um governo que durou uns meros dez dias, entre 20 e 30 de Novembro de 1920 e ainda a um outro governo, que durou uns prolongados 6 meses, entre 18 de Dezembro de 1923 e 6 de Julho de 1924 (na Primeira República, certamente para tirar o mau sabor do rotativismo burguês e porreiraço da monarquia, havia novos governos quase semanalmente, parecia).
Álvaro de Castro ainda viria a ser nomeado Governador-Geral de Moçambique por mais duas vezes, em 1919 e em 1926, mas em ambos os casos, expeditamente, recusou, antes de ser empossado.
Após o golpe militar e a memorável marcha de Braga para Lisboa (mas claro) levado a cabo pelo venerando Marechal Gomes da Costa em 28 de Maio de 1926, Castro foi prontamente detido e internado numa prisão em Elvas, donde se conseguiu evadir, exilando-se na capital francesa, Paris. Tendo eventualmente adoecido gravemente, pediu autorização para regressar ao seu país, tendo já chegado moribundo a sua casa, na Cidade de Coimbra, vindo a morrer poucos dias depois, a 29 de Junho de 1928, com apenas 49 anos de idade.
Penso que, para além do seu nome em tempos adornar um museu na Polana, havia uma rua em Lourenço Marques com o seu nome.
Informação adicional
Para obter mais detalhes sobre Álvaro de Castro, sugiro a leitura de Álvaro de Castro – Jovem Turco da República, da autoria de Ana Catarina Pinto [Lisboa, edit pela Assembleia da República, 2014, 240 pp].
Imagem retocada e pintada.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagem retocada.
Inicialmente era para ser uma escola primária, uma das grandes manias dos maçónicos “democratas republicanos” na Primeira República, com longa presença em Moçambique e que tiveram uma expressão peculiar em Lourenço Marques. Mas os poderes constituídos devem ter achado que a construção seria épica demais para este fim e em vez disso, transferiram para aqui o espólio do Museu Provincial, que desde 1913 estava alojado na Vila Jóia, e deram-lhe o nome de um relativamente obscuro Governador-Geral da Primeira República, Álvaro de Castro (1915-1918). No posterior processo de obliteração de tudo o que recordasse Portugal e o que os portugueses fizeram, a designação foi alterada pelos senhores que se seguiram para Museu de História Natural.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagens dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocadas.
Imagens retocadas.
Segundo a obra Moçambique: Memórias sociais de ontem, dilemas políticos de hoje, da autoria de Vítor Alexandre Lourenço (pág. 205, nota 26):
Sobre o Liceu, ver ainda esta nota muito completa do incontornável HdM.
A Escola Comercial
Sobre a Escola Comercial Azevedo e Silva, ler esta épica e imensamente rica e abrangente dissertação escrita por Luisa Maria Pina Valente Antunes, intitulada O Ensino Técnico Profissional Industrial s Comercial em Lourenço Marques durante o Estado Novo – A Escola Comercial Dr. Azevedo e Silva (Universidade de Lisboa, Instituto de Educação, 2010, 198 páginas). Pode e deve ser descarregada em PDF (e lido). Tem quase tudo o que o Exmo. Leitor alguma vez possa querer saber sobre a Escola Comercial de Lourenço Marques mas não tinha a quem perguntar. Leia-se, por exemplo, estes excerptos:
O ano de 1952 ficou assinalado por importantes acontecimentos,7 como a adopção na Província de Moçambique da Lei. Nº 2:025, de 19 de Junho de 1947 (sobre o Ensino Profissional), do Decreto-lei Nº 37:028, de 25 de Agosto de 1948 (sobre o Ensino Profissional, Industrial e Comercial), do Decreto Nº 37:029, da mesma data (Estatuto do Ensino Profissional Industrial e Comercial), adaptação concretizada pelas Portarias Ministeriais nºs 13:883, 13:884 e 13:885, de 15 de Março de 1952 e desdobramento da Escola Técnica Sá da Bandeira em duas escolas, uma industrial e outra comercial (Decreto Nº 38:679, de 17 de Março de 1952). Este desdobramento foi devido ao crescente interesse pelo ensino técnico, separando-se o ramo comercial do ramo industrial. Em 1951-52 existiam 1747 alunos, surgindo em 1952-53 a Escola Comercial de Lourenço Marques (com 1187 alunos) e a Escola Industrial de Lourenço Marques (com 562 alunos)8. A Escola Industrial de Lourenço Marques funcionou nas instalações da Escola Técnica Sá da Bandeira, e a Escola Comercial de Lourenço Marques, que abriu portas em 18 de Novembro de 1952, ocupou as instalações abandonadas pelo Liceu Salazar, que entretanto tinha passado para o seu novo edifício.
E uma efeméride:
A Escola Comercial de Lourenço Marques entrou em funcionamento no dia 18 de Novembro de 1952 com 1187 alunos.
E o nome:
Em 1963, a Escola Comercial de Lourenço Marques passou a designar-se pela Portaria Nº 16:933 de 1 de Junho, Escola Comercial Dr. Azevedo e Silva. A razão desta mudança de nome prende-se com o facto de a Direcção dos Serviços de Instrução ter proposto esta alteração como forma de homenagear e perpetuar na memória o nome do Dr. Azevedo e Silva. Esta figura destacou-se por ter sido advogado, jornalista, investigador na área do Direito Administrativo, tendo realizado no século XIX estudos de Direito Comercial e o comentário ao Novo Código Comercial. A sua presença nesta Província ficou ligada à fundação da primeira Escola de Ensino Técnico em Moçambique, a Escola Prática Comercial e Industrial 5 de Outubro, em Lourenço Marques.
Sobre o edifício em cima:
A organização espacial dos edifícios das escolas do Ensino Técnico era marcada pela matriz de base fundada na classe, dominando as salas com actividades centradas no professor e situando-se os espaços especializados (laboratórios, bibliotecas, ginásios) a nível complementar. (Silva, 2002) Américo Violante, professor efectivo e Director da Escola Comercial de Lourenço Marques em 1956, refere que a Escola se encontrava provisoriamente instalada no conjunto de edifícios, em que até 6 de Outubro de 1952, funcionou o Liceu Salazar. O edifício principal da Escola Comercial de Lourenço Marques localizava-se na Avenida 24 de Julho, e tinha sido construído para um Internato de Raparigas/Instituto Feminino, e entretanto foi lá instalada uma bateria de artilharia, nesse mesmo espaço foi instalado em 1919, o Liceu Nacional 5 de Outubro.
Sobre as relações entre o que era uma instituição invulgarmente integrada do ponto de visto socio-económico, é nada menos que o meu caro Eneas Comiche, um antigo aluno e hoje um político da Frelimo ao mais alto nível – e o actual Presidente da Câmara de Maputo – que disse (p.115):
As turmas eram mistas, a relação era boa, ainda mantemos ligações de amizade que duram até hoje, eram uma relação de confiança absoluta. Não fazíamos distinção entre brancos, negros, indianos, chineses, convivíamos todos, nunca senti racismo (…), era uma vivência sã, fazíamos grupos de estudo, havia um contacto com os pais”(Amandine Carvalho), “(…)As relações entre alunos eram muito boas, ainda hoje tenho grandes amigos feitos na Escola Comercial, éramos colegas, é verdade que havia contingências sociais, mas dentro da Escola eu nunca me senti discriminado, naquela altura nós, os pretos, éramos poucos, havia muitos brancos, alguns indianos e amarelos, mas a convivência era sã(…)
Imagem dos arquivos da Fundação Calouste Gulbenkian, retocada.
Imagem retocada, tirada daqui e mencionada aqui.
Um comentário prévio.
Eu tento seguir, na medida do possível, os trabalhos académicos relacionados com Moçambique, actividade assaz difícil pois não sou académico e a informação é tendencialmente disseminda das formas mais quixotescas, desde em livros que custam 150 euros e que se têm que mandar vir da Patagónia do Sul, até artigos de meia dúzia de páginas que sítios idióticos predadores “alugam” por 50 dólares para serem lidos online durante apenas 24 horas. Pelo menos um académico que sigo e que respeito (o que é infrequente) assegurou-me que, para além da obrigação profissional de produzir e publicar, ele não ganha um tusto com a publicação dos seus trabalhos sobre Moçambique – sendo, claro, esta, também, uma das razões que nunca jamais consideraria uma carreira académica (ou de jardinagem, que também aprecio muito mas que paga muito mal), ficando-me, no que concerne à minha peculiar curiosidade em relação ao que aconteceu no que é hoje Moçambique, por este modesto blog (e mais três), onde acumulo as poeiras que vou destapando aqui e ali.
Uma rara excepção é o sítio Academia.edu, que, não sei se por causa das suas regras ou de eu ter feito alguma canganhiça de que não me recordo, me vai enviando este ou aquele artigo académico, que invariavelmente leio, e que, recentemente, me chamou a atenção para um curto e quase simpático trabalho do académico brasileiro Daniel de Lucca (o documento diz que é professor numa tal Escola de Sociologia e Política, em São Paulo mas o sítio diz também que lecciona numa tal Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira), que, um tanto ambiciosamente, rotulou “Moçambique em Timor e Timor em Moçambique: diáspora, guerra e revolução nas margens do índico”. Nas suas notas até descobri que tinha mencionado este blog, de onde copiou uma imagem, pelo que, portanto, só pode ser boa gente.
O texto do Daniel tem potencial mas ficou um pouco pela rama, donde espero que um dia ele volte à carga e reforce algumas coisas, especialmente neste caso das relações entre o Moçambique da Frelimo e o suporte dado aos timorenses no indescritível período da dominação indonésia. Recuou, na sua análise, até à II Guerra Mundial. Achei pouco o que ele disse e algo incompleto, e vai ter dois problemas em breve: todos os protagomistas ou já morreram ou estão a morrer, e alguns tornaram-se gente importante e aproveitam para dourar a pílula. Eu, que já bebi uns improváveis copos com os Lobatos, em Moçambique e na casa deles lá nas montanhas em Timor, entre as esplêndidas mas delapidadas plantações de café do tempo colonial, quase sei mais que ele.
Desse texto, realço duas coisas que não têm quase nada a ver com o assunto e que têm que ver com Moçambique:
1. Uma citação absolutamente priceless do Samora, feita por nada menos que Luis Guterres, um dos timoreses referenciáveis, que quando cumprimentou os aparentemente pelintramente vestidos delegados da Fretilin em Maputo em 1975, lhes segredou, pragmaticamente: “Se quiserem ser bem tratados pelos que te recebem [sic], devem-se vestir melhor que eles”.
2. O comentário do Daniel, tendencioso, desnecessário e errado, feito en passand, em que ele simplesmente escreve que os brancos de Moçambique (os “colonos”presumivelmente como eu – claro), logo após a independência, andaram “a sabotar e a resistir” à Nova Ordem Frelimiana. Escreveu ele: “De facto, as dificuldades enfrentadas pelo país africano cresciam rapidamente: as crises de produção que sucederam a independência; o êxodo de portugueses e outros profissionais técnicos especializados; o boicote e a sabotagem dos antigos colonos; a hostilidade da Rodésia de Ian Smith e da África do Sul do apartheid; além da guerra com a Renamo (…).” Obviamente o Daniel, que sei que não estava lá portanto não viu, engoliu sem questionar o discurso de cassete-padrão da Frelimo – que ainda hoje é usado – e achou por bem repassá-lo. Pois. Só que é tudo falso. No mínimo, o êxodo foi orquestrado pela Frelimo, que sabia precisamente que ia chacinar completamente a economia moçambicana herdada, mas que, liricamente, achava que os camaradas comunistas russos, chineses, etc, iriam de seguida criar a Nova Economia Socialista. A “hostilidade” da Rodésia e dos Boers foi definitvamente assegurada assim que o Samora anunciou na rádio que ia começar a apoiar a guerrilha naqueles países, a partir de bases em Moçambique; e gostava que o Daniel me desse evidência concreta dos tais boicotes e sabotagem dos antigos colonos, a seguir a 1975. Já o presciente Joe Hanlon uma vez veio com aquela fábula dos “colonos” cimentarem os canos de água das suas casas e empresas antes de, generosamente, serem expropriados, presos e expulsos pelos heróicos libertadores. Mas quando lhe perguntei, directamente, onde é que ele foi buscar essa história, a resposta dele foi que aquilo era o que se dizia em Maputo. Ai sim Joe? és tão esperto mas essa é a tua fonte? alguém disse? Nestas coisas, o Professor Daniel deve tentar aprender a pôr de lado o porreirismo fraternal afro-brasileiro, muito comum em alguns textos académicos brasileiros, e a estudar e contextualizar os factos com rigor e tentar não emprenhar pelos ouvidos.
Enfim.
O que considerei mais interessante no artigo escrito pelo Daniel, no entanto, foi a fotografia em baixo, tirada no dia 11 de Dezembro de 1945 pelo sargento Australiano Keith Benjamin Davis no pátio do forte timorense de Bobanaro, na fronteira entre o então revertido território de Timor e, presumo, a outra metade da ilha, que formalmente ainda era uma colónia holandesa, de uma companhia de Tropas Landins. O que o Daniel refere eu já sabia mas merece ser referida aqui.
No início de 1942, os japoneses invadiram Timor (na altura ninguém se referia a Timor como “Timor-Leste”), que muito teoricamente poderia ser usada como base para atacar Darwin, no Norte da Austrália, 600 quilómetros de Dili em linha recta, e em três anos e meio fizeram tanta chacina na metade portuguesa da ilha, o que, por comparação, fez o pior do colonialismo português parecer um acto de irmandade inter-étnico (quase precisamente o mesmo viria a ser feito pelos indonésios, entre 1975 e 2000).
Logo no final de 1941, Salazar, neutral, formal, didáctico, solícito e sempre cioso dos direitos épico-dinásticos portugueses relativos às suas possessões ultramarítimas, e inicialmente pouco ciente da ferocidade nipónica, ordena que os seus militares montem uma expedição militar para retomar a colónia asiática, a partir da pequena e plácida Lourenço Marques (que o Daniel chama “Maputo” quando se refere a Lourenço Marques em 1942), em Moçambique, de onde, em 26 de Janeiro de 1942, parte em direcção ao Oriente, em dois navios da marinha portuguesa, o João Belo e o Gonçalves Zarco. Volvidas umas semanas, ao se aproximarem da ilha e percebendo da potencial chacina face aos pouco cooperantes japoneses, fizeram uma prudente marcha-atrás e demandaram a pequena colónia de Goa, ali mais perto.
Até Agosto de 1945, que foi quando os norte-americanos, para variar, derrotaram e ocuparam o Japão, a acção portuguesa limitou-se a actos de diplomacia. Salazar gastou o tempo todo em considerandos, pareceres, negociações e telegramas, trocados com o beligerantes envolvidos, para assegurar que Timor no fim voltasse para a posse portuguesa – documentação que o Ministério dos Negócios Estrangeiros português, invulgarmente, publicou, penso que nos anos 80, em dez fartos volumes, presumivelmente, impecavelmente sanitizados, para mostrar o génio do ditador de saber navegar as turbulentas águas da política internacional daquela década..
Segundo o excelente sítio Defesa Nacional, citado pelo Exmo. Leitor Fernando Silva Morgado em baixo nos comentários, que deve ser lido, os portugueses, também em Lourenço Marques, prepararam em Lourenço Marques, desde Junho de 1944, uma segunda expedição para recuperar Timor.
Como acontecera em 1942, esta segunda expedição para retomar Timor incluía também uma companhia de Tropas Landins, recrutadas no Sul de Moçambique, que aparentemente foram recebidos como (entenda-se o paradoxo) libertadores pelos martirizados timorenses.
Imagens retocadas.
Imagem gentilmente cedida por João Silva e retocada.
Imagens retocadas.