THE DELAGOA BAY WORLD

31/12/2023

O DIA EM QUE O MUNDO CONHECEU EUSÉBIO, 19 DE JULHO DE 1966

Imagens retocadas.

O jogo aconteceu ao fim do dia 19 de Julho de 1966 (uma terça-feira) no venerando Estádio Goodison, desde 1892 a casa do clube Everton, situado nos arredores da relativamente proletária cidade britânica de Liverpool, durante o Campeonato do Mundo de Futebol de 1966, em que se disputava a Taça Jules Rimet, de ouro maciço.

De entre as 32 equipas presentes para a competição naquele ano de 1966, figuravam Portugal e a Coreia do Norte.

A equipa de Portugal, com uma expressiva costela moçambicana, no Mundial de 1966.
A equipa da Coreia do Norte, 1966.

A Coreia do Norte surge de forma rocambolesca no campeonato, uma mistura de sorte, talento e muita política. A sua mera presença no Reino Unido foi uma aventura. O Reino Unido não reconhecia nem tinha relações diplomáticas com o então já estado pária.

Por sua vez, Portugal vivia os últimos anos da ditadura de partido único de Salazar e já alimentava uma guerrilha nacionalista na Guiné, em Angola e no Norte de Moçambique.

Em 12 de Julho, em Ayresome Park, a Coreia do Norte joga pela primeira vez no Grupo 4, contra a União Soviética, e vence por 3-0.

O segundo jogo foi contra o Chile. O resultado foi 1-1.

O jogo seguinte foi épico para o Norte-Coreanos. Foi contra a Itália, um potentado, que, desgraçadamente, tinham perdido contra a União Soviética mas vencido o Chile.

A Coreia do Norte vence os Italianos com um excepcional golo de Pak Doo-Ik e qualifica-se para os oitavos de final.

Nesses oitavos de final, a ser disputado no dia 19 em Goodison Park, defrontariam a equipa de Portugal, onde Eusébio, Torres e Coluna pontuavam. Por um lado, havia uma expactativa de que Portugal não poderia perder, especialmente conhecida a actuação prévia dos norte-coreanos.

Por outro lado, a actuação dos asiáticos fora excepcional. Nesse jogo, a audiência estava totalmente expectante do que iria acontecer.

Entre a audiência, solitário, estava um açoreano que adorava futebol e que deixara a família em Lourenço Marques (mulher e sete filhos) por um mês, para ver o campeonato: o meu Pai.

Bilhete de entrada para o jogo dos Oitavos de Final do Campeonato do Mundo de Futebol, 19 de Julho de 1966.

O jogo ficará para a História. Os Coreanos marcaram, sem resposta portuguesa, nos minutos 1, 22 e 24 . O guarda-redes era Alberto da Costa Pereira, nascido em Nacala e que viera do Belenenses.

Ao intervalo, todos em choque, o resultado era 3-0 em favor da Coreia do Norte.

A segunda parte foi a entronização do avançado, Eusébio, que tomou conta do jogo e marca quatro golos em menos que meia-hora, incluindo dois penalties. O marcador foi fechado no fim de segunda parte com um quinto golo marcado por José Augusto.

Resultado: 5-3, vitória de Portugal.

Após este jogo, Portugal perderia nas Meias-Finais contra a Inglaterra (que venceria o Campeonato) e a equipa da Coreia do Norte regressou ao seu país, primeiro recebidos como heróis mas depois mal tratados pelo regime, alguns acabando em campos de trabalhos forçados. Com o passar das décadas, alguns foram reabilitados e em 2002, a convite dos britânicos, os membros da equipa foram recebidos no Reino Unido com simpatia e admiração em 2002.

Até esta data, este foi o melhor desempenho de uma equipa de futebol portuguesa num campeonato mundial.

Para Eusébio, foi a apoteose.

Eusébio dá uma breve entrevista ao sair do túnel, 1966.
Uma cópia do Morning Telegraph de Sheffield, edição de 20 de Julho de 1966, com um autógrafo de Eusébio, inscrito sobre uma fotografia de um dos seus golos contra a Coreia do Norte no dia anterior.

Eusébio ficaria para sempre no coração dos portugueses, que o “adoptaram” ainda que mantendo a sua identidade moçambicana. Após falecer em 5 de Janeiro de 2014, o seu corpo foi colocado no Panteão Nacional em Lisboa. Uma estátua em sua homenagem é local de romaria junto do Estádio do Benfica em Lisboa. Não sendo abertamente hostil, o regime moçambicano instaurado em Setembro de 1974 nunca conviveria facilmente com o seu legado, ainda que tenha tratado o Sr. Mário Coluna (que voltaria para Moçambique) com respeito, sendo que a ambos confiscaram imóveis seus, comprados com os seus ganhos, que nunca devolveriam, “para não abrir precedentes”. Pois, como eu entendo.

Desejo aos Exmos Leitores que têm acompanhado este blog um 2024 sem incidentes. Conto continuar a estar por aqui.

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