Tasha há uns anos, aqui magnificamente fotografada por Roger Neve. Para ver a foto no seu pleno esplendor, prima a imagem com o rato do seu computador.
Há algum tempo que estava para colocar aqui uma nota sobre Tasha Vasconcelos, retratada em cima, uma mulher mais conhecida pelo seu trabalho como modelo internacional. Pois ela nasceu na cidade da Beira e ali viveu até aos 9 anos de idade. Mas demorou algum tempo a abordar o tópico, pois queria aprofundar um pouco mais a minha primeira impressão de que havia nela muitos mais “brains”, suor e dureza do que alguns porventura possam pensar haver por detrás daquela cara laroca . Ontem, durante uma parte da tarde, debrucei-me sobre o assunto e mais ou menos confirmei essa impressão.
A um jornalista do Diário de Notícias, numa entrevista publicada em Março de 2010, Tasha disse que o seu nome de baptismo é “Sandra Tasha da Silveira Pereira Bravo Osório de Vasconcelos Cochofell Mota e Cunha”. Hum. Se calhar talvez não, mas o que interessa? Em tudo o que diz e se diz sobre ela sente-se-lhe um certo fascínio em redor da aristocracia hereditária, misturada com recordações vívidas, se algo idílicas, da sua infância na cidade da Beira, entre 1966 e 1974, manchadas pelo êxodo precipitado de Moçambique, aos 9 anos de idade, para a então Rodésia, para onde os pais (Fernando Mota e Cunha, engenheiro, e a mãe, Jacqueline Hards, de origem anglo-saxónica) foram viver. Ali viveu até aos 14 anos, quando Ian Smith saiu de cena e entrou (para o resto da vida, parece) Robert Mugabe. Os pais foram então para Portugal, onde ficaram alguns meses (oito, segundo um relato) e a seguir emigraram para o Canadá.
A jovem Sandra teria tido um percurso semelhante ao de tantos de nós forçados ao por vezes inenarrável e imprevisível êxodo colectivo de Moçambique e espalhados ao acaso no mundo não fossem dois pequenos detalhes: é que, enquanto crescia, alguém reparou que ela tinha 1.80 metros de altura e era muito bonita, o que mereceu-lhe a atenção de alguém da mega-indústria da beleza. “Descoberta”, eventualmente se destacou e aparentemente fez furor. Confesso que eu devia andar distraído pois na altura nem sabia que existia.
Pelo meio, sendo inegavelmente inteligente, culta, alerta e focada, para além de bonita, concluiu uma licenciatura em Paris (numa das áreas que eu estudei na Brown, para variar), cidade onde presumo se centrava o seu trabalho enquanto modelo – ainda que a foto em cima, a minha favorita de entre as centenas que se podem encontrar na internet, tenha sido tirada em Nova Iorque (actualmente, vive no Principado de Mónaco).
Quem era, ou melhor, o que era, eventualmente abriu-lhe as portas a um mundo quiçá estranho, ao mesmo tempo deslumbrante, perigoso, rarificado e por vezes deprimente, que ela deu-se ao trabalho de retratar com um despudor e franqueza quase brutais, numa auto-biografia que foi publicada no início de 2010, escrita em francês, chamada La beauté comme une arme. Nessa altura ela já respondia há muito pelo nom de guerre Tasha de Vasconcelos, tinha 44 anos e creio que o livro fazia parte de uma mudança do que ela considerava ser o caminho seguinte a trilhar, que para ela era combinava bem com as suas vocação, valências e apetências: o trabalho na área da beneficiência e apoio aos mais desfavorecidos. Para tal, e com apoio de amizades influentes feitas em anos anteriores, e muito trabalho, criou e lidera uma organização a que chamou Aide Mondiale Orphelim Réconfort – ou AMOR. Tornou-se também aquilo que os norte-americanos chamam goodwill ambassador para a União Europeia (aparentemente, no meio disto tudo, reteve a nacionalidade portuguesa).
A capa de La beauté comme une arme.
Sobre a sua vida pessoal nada sei a não ser o que constitui uma quase inesgotável resma de baboseiras, diz-que-diz e parece-que-parece que essencialmente a imprensa cor-de-rosa publicou sobre ela, o que diz pouco ou nada de concreto. A sua auto-biografia refere as aparentemente incessantes investidas por parte dos machos, alguns latinos e outros não, levando-me vagamente a crer que essa parte da vida dela – surpresa – ainda estará por resolver.
É, apesar de tudo o que tem em comum com todos os que viveram e deixaram de viver em Moçambique, um invulgar percurso para uma menina que nasceu anónima na Beira, e cresceu para ser uma espécie de princesa do mundo.
Parte de um artigo sobre o trabalho de Tasha na área da beneficiência, publicado em Portugal.