THE DELAGOA BAY WORLD

16/12/2023

A PISCINA DO DESPORTIVO EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 70

Era um clube, mas ao mesmo tempo detinha e operava, praticamente sem custos para os atletas, quiçá a melhores instalações desportivas da capital moçambicana. A piscina, a primeira para lazer e prática de natação, salto e pólo aquático, construída no final dos anos 40 e inaugurada em 24 de Julho de 1949, usou uma engenharia especial proposta por um engenheiro alemão, “flutuava” sobre o solo, que ali tinha uma linha freática praticamente à superfície, resultando que, de outro modo, a piscina afundar-se-ia com o peso. Tinha 33.3 metros por 25 jardas, o comprimento a dimensão de uma piscina olímpica na altura, e uma parte funda com cerca de 4.5 metros, permitindo os saltos das suas pranchas com 3, 5 e 10 metros de altura. Num edifício do lado esquerdo, operava uma potente bomba, ligada a gigantescos filtros, que mantinham a água da piscina limpa (bem, de vez em quando aquilo descambava). A piscina tinha o nome formal de Paulino dos Santos Gil, então talvez o maior empresário de Moçambique, que contribuiu de forma expressiva para a sua construção.

O mesmo sucedeu com o campo de futebol, cuja construção foi uma história épica, que contei num artigo que escrevi aquando do centenário do Desportivo em 2021 e merece ser lido. Nas décadas de 1920 e 1930 o campo de futebol do Clube ficava situado directamente em frente à entrada principal, encaixado entre essa entrada (que não existia então) e a então Câmara Municipal da Cidade, que hoje é um tribunal. No final dos anos 30, a Câmara fez uma troca, em que o campo, que tinha bancadas de madeira do lado da Câmara Municipal, foi demolido e foi cedido um terreno a seguir ao campo do Sporting. Mas nada se fez até que o Benfica, com quem o Desportivo tinha uma afiliação, não só ganha o campeonato nacional como a Taça Latina, e é decidido fazer uma turnée que iria até Lourenço Marques. Para que os eventos na Cidade não se realizassem nos estádios do Sporting ou do Ferroviário, os sócios do Desportivo construiram um novo estádio em…. menos que oito semanas. O campo também tinha o nome de Paulino dos Santos Gil.

A piscina do Grupo Desportivo Lourenço Marques, anos 70.

Em frente à piscina, vê-se um edifício redondo, construído na década de 1940 antes da piscina. que, com a esplanada, coberta nos anos 60, permitia realizar eventos particulares e do clube, que permitiam angariar receitas para operar as suas instalações. Festas de fim do ano, passagens de filmes, festas de final do ano,carnaval, bingos, ocorriam ali. Do lado esquerdo, nos anos 50, foi construida uma piscina para crianças, composta por dois círculos interligados entre si. A meio, havia uma pequena carreira de tiro, que no meu tempo (anos 60 e 70 até 1975) não era assim tão utilizado, se bem que tinha uma secção activa. Esta piscina tinha o seu próprio sistema de filtragem de água. Mais à frente, junto à casa das máquinas, ficava o que foi originalmente um campo de hóquei, construída com velocidade vertiginosa quando os jogadores do Desportivo ganharam o campeonato do Mundo penso que no final dos anos 40 (quem me contou isto foi o Sr. José Craveirinha, sócio, depois conhecido pela sua poesia). Foi depois convertido para uso no basquet, depois de construído um novo estádio de hóquei na década de 1950 (na foto,do lado direito, vendo-se a bancada poente), que foi desenhado pelo Eng. Tomás Gouveia, um sócio e Pai das Irmãs Gouveia (João, Dulce, Anabela e Lídia). Ainda antes de 1975, esse espaço foi coberto e era usado também para a prática do basquet. A Norte deste estádio, havia uns campos de ténis que foram convertidos no final dos anos 60 para uso no mini-basquet.

Em 1971, ano do cinquentenário do Clube, os sócios projectaram criar um novo pavilhão desportivo, o maior que a Cidade teria, também desenhado pelo Eng. Tomás Gouveia. Até houve uma cerimónia de descerramento de uma “primeira pedra” no dia 23 de Maio desse ano. Felizmente, atrasou-se e acabou por nunca ser construído, pois digamos que a partir de 1974 as prioridades de quem veio a seguir passarm a ser outras.

Há duas semanas, foi conhecido um processo de falência, resultante da contracção de dívidas pelas sucessivas direcções, dando o seu património como garantia. O que prenuncia o fim do clube, após 102 anos de existência.

14/12/2023

A MORTE DO ANTIGO GRUPO DESPORTIVO LOURENÇO MARQUES

Imagem retocada e colorida. Post dedicado à grande nadadora do Desportivo, Dulce Gouveia, que ontem celebrou o seu 71º aniversário em Cascais e cujo Pai, o eng. Tomás Gouveia, gratuitamente, desenhou e dirigiu a construção, na década de 1950, do campo de basquet situado à direita de quem entra no Desportivo.

No meu blog “desportivo” The Delagoa Company, ontem, referi a publicação de um aviso judicial, há cerca de duas semanas, no Notícias de Maputo, indicando a falência do Grupo Desportivo de Maputo e a previsão da execução do seu património pelo Banco Comercial e Investimentos, SA (cujos accionistas são um instrumento da CGD e do BPI e terceiros da Insitec que nunca percebi quem são) e posterior venda, para ressarcir os seus credores.

O símbolo do Grupo Desportivo Lourenço Marques, 1921-1975.

A agonia final do Clube, fundado em 1921 com o nome do putativo e de outro modo anónimo navegador que andou por aquela zona há quinhentos anos, já era previsível nos últimos anos, por absoluta incompetência, incúria e quiçá má fé dos seus subsequentes dirigentes (um deles o advogado Michel Grispos, que discretamente vendeu o estádio de futebol do clube há menos que dez anos), uma massa associativa que obviamente estava a assobiar para o lado, e a contaminação do seu espaço com terceiros que ali fizeram um salão de festas/discoteca tipo Bollywood em Cuecas e tornaram a histórica piscina, inaugurada em 1949, num tanque para lavar os pés aos fins de semana. No fim, aposto cem Meticais que por detrás disto tudo estão interesses imobiliários, empresários “de sucesso” com rios de dinheiro cuja proveniência só eles e Deus sabem, que ali farão milhões com algum empreendimento imobiliário apetitoso.

Para criar mais uns ricos. Mais uns Florindos, que tanta falta fazem a Moçambique e aos moçambcanos.

Não descansaram enquanto não deram cabo daquilo e deliberadamente chuparam, a crédito e a prestações, pelos vistos, o valor e os recursos criados com muito sacrifício nas décadas de 1940 e 1950. Que o BCI, um banco detido maioritariamente por dois bancos com sede em Lisboa – um já é hespanhol – e supostamente com algumas credenciais lá na Praça (bem, mais ou menos) se predispusesse para fazer este frete, sabendo perfeitamente que a seguir iria ter que executar o clube para recuperar o que emprestou, é de bradar aos céus. Mas depois vem, como os outros bancos, carpir para a rua e encher as páginas dos pasquins àcerca da sua elevada responsabilidade social e da sua moçambicanidade. Pois.

E lá vão cem anos de tradição que era boa e sã tradição, ao ar. A não ser que se recorra à velha e desgastada cassette de que tudo o que foi feito antes de 1975 era para destruir.

Eu costumo pensar, e agora se torna verdadeiro, por exclusão de partes, que o Desportivo, que era os seus sócios e os seus descendentes, que fizeram o Clube, reside em Portugal e os seus membros almoçam juntos uma vez por ano na Linha do Estoril. Eu apenas guardo umas boas memórias e umas fotografias, só para lembrar como era.

O que ficou em Maputo era apenas um sítio, e pelos vistos muito mal frequentado.

Bom proveito para todos.

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