Imagem retocada.
A História de Moçambique não começou em 1975, quando foi declarada a sua independência, nem em 1891, quando foram delimitadas as suas fronteiras entre as potências coloniais europeias, nem em Março de 1498, quando Vasco da Gama primeiro aportou as suas costas. Nem em 1107, quando se estima chegaram os árabes muçulmanos a Zanzibar, de onde penetraram até ao actual centro de Moçambique. Conhecer essa história milenar exige uma aturada recolha, análise, contextualização e interpretação de um vasto conjunto de informações científicas, materiais, orais, documentais – e em imagem.
E no que toca a este último, Paulo Azevedo, um investigador baseado em Vila do Conde (arredores do Porto) mas que (ainda) nasceu em Moçambique, publicou hoje o que certamente se vai tornar num marco no estudo das primeiras imagens fotográficas que foram recolhidas no que hoje é Moçambique, ou, mais precisamente, dos primeiros homens por detrás das câmaras, começando menos que meio século após o francês Louis Daguerre ter anunciado a invenção da fotografia moderna.
Com 163 páginas que incluem importantes fotografias inéditas que o autor recolheu, a obra, intitulada Os Photographos Pioneiros de Moçambique, e que a partir de hoje pode ser comprada por entre 14 e 16 euros na internet aqui e aqui e aqui (portes incluídos para Portugal) é a segunda do Autor – a primeira foi Joseph e Maurice Lazarus – Photographos Pioneiros de Moçambique – e constitui de longe o estudo mais completo, para não dizer definitivo, no que toca ao tema.
De facto, o texto reflecte um trabalho inédito e aturado de recolha biográfica e curricular que exigiu centenas de horas, sobre as pessoas que, por uma ou outra razão, foram as primeiras que fotografaram em Moçambique, e as suas obras. E elas são
Benjaminn Kisch
Manuel Romão Pereira
Louis Hily
Thomas Lee
Joseph e Maurice Lazarus (os meus favoritos, e pensar que há menos que dez anos ninguém sequer sabia quem tinham sido)
Eduardo Battaglia
José Ferreira Flores
Francisco S. Silva
Ignácio Piedade Pó
Sidney Hocking
e
J. Wexelsen (quiçá o trabalho de “detective” mais impressionante da obra)
Para além destes, a obra inclui uma longa e detalhada bibliografia e ainda capítulos sobre os álbuns publicados e a Fotografia Bayly.
Ainda que com mérito, de valor incontornável e certamente uma futura referência obrigatória para qualquer tese sobre a fotografia em Moçambique e em África, enquanto um trabalho académico brilhante, a obra de Paulo Azevedo é, ainda assim, eminentemente legível e interpretável e a meu ver obrigatória para todos aqueles que quiserem entender melhor o passado moçambicano, na fase crucial do início da colonização europeia – e do arranque da sua modernização.
Outras referências nesta área (mas focadas em Manoel Pereira) são as obras de Filipa Lowndes Vicente e Luisa Villarinho Pereira, e o historiador Alfredo Pereira de Lima, mencionados na bibliografia.
Tendo este blogue ao longo dos seus onze anos de existência, pelo seu enfoque visual, cruzado muitas vezes o caminho destes homens e o trabalho que fizeram, este é um momento importante, e esta uma futura referência aqui também. Assinalo ainda com redobrada emoção o autor inclusivé me ter mencionado em 1009º lugar, depois de agradecer a tudo e todos, aquém e além mar, pela sua execução (enfim, trocámos uns e-mails, deve ser por isso) e de se ter enganado no nome deste blogue, que é, recordo, The Delagoa Bay World.
Paulo Azevedo está de parabéns e merece todo o apoio que se lhe possa prestar na prossecução do seu trabalho, que inclui o Exmo. Leitor comprar este livro fabuloso e uns desses institutos do governo darem-lhe uns dinheiros para o ajudar nas suas pesquisas, que, fui informado, não terminaram, pelo contrário.
Imagens retocadas. Postais 4, 2 e 3, editados por J. Wexelsen.
Durante uns anos, na primeira década de 1900, Wexelsen operou um estúdio de fotografia na Beira. Depois, simplesmente, desapareceu do mapa. Aguardo, sentado, que o insigne Paulo Azevedo explique.
Fotografia de J. Wexelsen, parte dos arquivos da Missão Suíça.
“O rio Zambeze [….]nasce na Zâmbia a cerca de 1.700 m de altitude. Tem cerca de 2.600 km de comprimento e uma bacia hidrográfica de 1.330.000 km2, dos quais só 3.000 km2 em território moçambicano. Mesmo assim o rio Zambeze deve ser considerado o maior rio que atravessa Moçambique. O Rio parte de uma região bastante pluviosa; depois de atravessar a região árida da parte oriental de Angola, entra novamente na Zâmbia, onde corre, formando rápidos. Em Livingstone, é um rio bastante largo e constitui o seu leito uma paisagem anfíbia. Em Lupata, depois de atravessar o desnível do Songo ele tem os seus últimos rápidos. Dai, até sensivelmente a sua foz, corre em planície, desaguando por um imenso delta.”(texto daqui).
O Estreito de Lupata fica situado no Rio Zambeze a cerca de 80 quilómetros a jusante da represa de Cabora-Bassa (agora, Cahora-Bassa) e 60 quilómetros a Sudeste da Cidade de Tete. Em certos pontos o Rio Zambeze tem uma largura de 200 metros, “encaixado” por estes enormes maciços de pedra.
Em 2014, o governo de Moçambique autorizou a construção de uma central hidroeléctrica neste local, com uma capacidade de produção de 600 MW, que certamente irá estoirar com este monumento natural por completo, mas penso que ainda não foi feita. Enfim.
Curiosidade 1: junto à Ilha de Moçambique há uma “Entrada da Lupata“.
Curiosidade 2: No Diccionario geografico das Colonias Portuguezas, no qual se descrevem todas as ilhas e porções de continentes que Portugal possue no ultramar … por un Flaviense (1842), aparece esta jóia:
(Nota: até meados do Séc.XIX, o planeta estava a sair duma mini-idade do gelo, o que pode explicar a observação de neve no meio da Zambézia, junto ao rio. O ponto mais elevado desta zona é o Monte Dómué, com 723 metros de altura em relação ao nível médio do mar, enquanto que os terrenos circundantes de situam nos cerca da 381 metros acima do mar).
Curiosidade 3: Segundo este texto, a origem das complexas formações rochosas e sedimentares de Lupata é vulcânica, provavelmente resultantes de um vulcão já extinto, activo na época situada entre os Períodos Jurássico e Cretáceo.