Fotos enviadas pelo Alfredo Correia, falta identificar quem as tirou.
Hastings Kamuzu Banda foi durante mais que três décadas o líder fundacional e mais ou menos incontestado do Malawi, um país nascido dos lobbies missionários e caprichos escoceses junto da corôa britânica no fim do Século XIX e que acabou parcialmente encravado com Moçambique, entre Tete e Niassa. Foi uma figura ímpar em quase todos os aspectos, de entre os quais uma improvável amizade próxima com o governo português, especialmente o Eng. Jorge Jardim, na década crucial que antecedeu a Independência moçambicana, na qual dificultou consideravelmente a guerrilha da Frelimo, se bem que tudo indique que jogava para os dois lados.
Após 1975 e até à sua retirada da política em 1994 (morreu em 25 de Novembro de 1997 , supostamente com cerca de cem anos de idade, numa clínica em Joanesburgo) Banda manteve relações particularmente difíceis com Machel e Chissano. Machel, que odiava Banda e lhe chamava “fascista” pelas costas, morreu num acidente aéreo em Outubro de 1986, depois de regressar dum encontro cujo tema era precisamente o apoio de Banda à Renamo e ao regime sul-africano contra Moçambique. Um mês antes, em 11 de Setembro de 1986, Machel deslocou-se a Blantyre para pressionar Banda, que tudo indicava havia aberto as portas do seu país para que a Renamo atacasse o Norte a partir da fronteira malawiana. Nessa reunião de duas horas, na qual estiveram presentes Kenneth Kaunda e Robert Mugabe, segundo o livro de Ian Christie sobre Machel, o presidente moçambicano atirou com tudo à cara do venerando presidente-para-toda-a-vida, incluindo uma cópia de um passaporte do Malawi passado a Afonso Dlakhama, já então o líder da Renamo. Mas quando, poucos dias depois, se assistiu a ai início de um mortífero ataque em território moçambicano a partir do Malawi, coordenado pela Renamo e em três frentes, aparentemente liderado por tropas especiais sul-africanos, Samora, que já estava severamente pressionado em várias frentes, perdeu a cabeça e ameaçou atacar o Malawi. Numa conferência de imprensa em Maputo, disse: “nós colocaremos mísseis na fronteira com o Malawi se o apoio aos bandidos não cessar. E nós encerraremos o trânsito de mercadorias entre o Malawi e a África do Sul que passa por Moçambique [Ian refere que na altura passavam por território moçambicano cerca de 70 camiões por dia nessa rota]. Uns dias mais tarde, numa visita a Tete, Machel disse à imprensa: “as autoridades do Malawi tornaram o seu país numa base para mercenários de várias nacionalidades, mas principalmente sul-africanos. Eu creio que o Presidente Hastings não é responsável, quem é responsável são alguns ministros, soldados, membros da polícia e da segurança do Malawi que foram comprados pelos sul-africanos e outros países que não nomearei agora, apesar de termos as provas na nossa posse.”
Num artigo da BBC, o administrador da sua herança estima que o Dr. Banda, que em 1971 já ostentava o título de “presidente Vitalício”, deixou uma fortuna pessoal que estima em 319 milhões de libras estrelinas, o que não é nada mau, considerando a miséria que por ali grassava e a que por ali ainda abunda.
Em baixo, imagens de uma “histórica” visita de Estado que o Dr. Banda fez a Moçambique colonial, aqui em Nampula, no dia 27 de Setembro de 1971, onde foi recebido pela hierarquia colonial com as honras e a pompa devidas. A cúpula da Frelimo, na altura já após o rescaldo do assassinato do Dr. Mondlane e consequente ascensão da troika hardliner comunista (Machel, Marcelino e Chissano) a qual nunca teve um momento fácil com o líder malawiano, deve ter rangido os dentes duas vezes. Um dos grandes objectivos estratégicos do Presidente malawiano em relação a Moçambique era abrir uma linha férrea entre o seu país e o porto moçambicano de Nacala, que está em fase de reabilitação agora mas cuja inauguração (do troço final da linha férrea) foi a razão da sua visita a Nampula e a Nacala em 1971.
Uma nota para adicionar algum surrealismo: apesar de ter tido relacionamentos com mulheres, e em baixo se fazer acompanhar por uma “primeira dama”, Banda nunca casou. Mas teve uma longa relação com Cecilia Kadzamira, que fazia o lugar de primeira dama, e que se vê com ele nesta visita a Nampula, e que teve por sua vez um percurso também invulgar.