THE DELAGOA BAY WORLD

31/12/2023

O DIA EM QUE O MUNDO CONHECEU EUSÉBIO, 19 DE JULHO DE 1966

Imagens retocadas.

O jogo aconteceu ao fim do dia 19 de Julho de 1966 (uma terça-feira) no venerando Estádio Goodison, desde 1892 a casa do clube Everton, situado nos arredores da relativamente proletária cidade britânica de Liverpool, durante o Campeonato do Mundo de Futebol de 1966, em que se disputava a Taça Jules Rimet, de ouro maciço.

De entre as 32 equipas presentes para a competição naquele ano de 1966, figuravam Portugal e a Coreia do Norte.

A equipa de Portugal, com uma expressiva costela moçambicana, no Mundial de 1966.
A equipa da Coreia do Norte, 1966.

A Coreia do Norte surge de forma rocambolesca no campeonato, uma mistura de sorte, talento e muita política. A sua mera presença no Reino Unido foi uma aventura. O Reino Unido não reconhecia nem tinha relações diplomáticas com o então já estado pária.

Por sua vez, Portugal vivia os últimos anos da ditadura de partido único de Salazar e já alimentava uma guerrilha nacionalista na Guiné, em Angola e no Norte de Moçambique.

Em 12 de Julho, em Ayresome Park, a Coreia do Norte joga pela primeira vez no Grupo 4, contra a União Soviética, e vence por 3-0.

O segundo jogo foi contra o Chile. O resultado foi 1-1.

O jogo seguinte foi épico para o Norte-Coreanos. Foi contra a Itália, um potentado, que, desgraçadamente, tinham perdido contra a União Soviética mas vencido o Chile.

A Coreia do Norte vence os Italianos com um excepcional golo de Pak Doo-Ik e qualifica-se para os oitavos de final.

Nesses oitavos de final, a ser disputado no dia 19 em Goodison Park, defrontariam a equipa de Portugal, onde Eusébio, Torres e Coluna pontuavam. Por um lado, havia uma expactativa de que Portugal não poderia perder, especialmente conhecida a actuação prévia dos norte-coreanos.

Por outro lado, a actuação dos asiáticos fora excepcional. Nesse jogo, a audiência estava totalmente expectante do que iria acontecer.

Entre a audiência, solitário, estava um açoreano que adorava futebol e que deixara a família em Lourenço Marques (mulher e sete filhos) por um mês, para ver o campeonato: o meu Pai.

Bilhete de entrada para o jogo dos Oitavos de Final do Campeonato do Mundo de Futebol, 19 de Julho de 1966.

O jogo ficará para a História. Os Coreanos marcaram, sem resposta portuguesa, nos minutos 1, 22 e 24 . O guarda-redes era Alberto da Costa Pereira, nascido em Nacala e que viera do Belenenses.

Ao intervalo, todos em choque, o resultado era 3-0 em favor da Coreia do Norte.

A segunda parte foi a entronização do avançado, Eusébio, que tomou conta do jogo e marca quatro golos em menos que meia-hora, incluindo dois penalties. O marcador foi fechado no fim de segunda parte com um quinto golo marcado por José Augusto.

Resultado: 5-3, vitória de Portugal.

Após este jogo, Portugal perderia nas Meias-Finais contra a Inglaterra (que venceria o Campeonato) e a equipa da Coreia do Norte regressou ao seu país, primeiro recebidos como heróis mas depois mal tratados pelo regime, alguns acabando em campos de trabalhos forçados. Com o passar das décadas, alguns foram reabilitados e em 2002, a convite dos britânicos, os membros da equipa foram recebidos no Reino Unido com simpatia e admiração em 2002.

Até esta data, este foi o melhor desempenho de uma equipa de futebol portuguesa num campeonato mundial.

Para Eusébio, foi a apoteose.

Eusébio dá uma breve entrevista ao sair do túnel, 1966.
Uma cópia do Morning Telegraph de Sheffield, edição de 20 de Julho de 1966, com um autógrafo de Eusébio, inscrito sobre uma fotografia de um dos seus golos contra a Coreia do Norte no dia anterior.

Eusébio ficaria para sempre no coração dos portugueses, que o “adoptaram” ainda que mantendo a sua identidade moçambicana. Após falecer em 5 de Janeiro de 2014, o seu corpo foi colocado no Panteão Nacional em Lisboa. Uma estátua em sua homenagem é local de romaria junto do Estádio do Benfica em Lisboa. Não sendo abertamente hostil, o regime moçambicano instaurado em Setembro de 1974 nunca conviveria facilmente com o seu legado, ainda que tenha tratado o Sr. Mário Coluna (que voltaria para Moçambique) com respeito, sendo que a ambos confiscaram imóveis seus, comprados com os seus ganhos, que nunca devolveriam, “para não abrir precedentes”. Pois, como eu entendo.

Desejo aos Exmos Leitores que têm acompanhado este blog um 2024 sem incidentes. Conto continuar a estar por aqui.

30/12/2023

CIGARROS DA SOCIEDADE AGRÍCOLA DE TABACOS EM LOURENÇO MARQUES

Imagens retocadas.

Alfa.
Minerva.
Primor.
Libertas.
Vinte e Cinco com Papel Peitoral.
Vinte e Cinco.
Batuque.
Dom Carlos.
Camelo.
Palmar.
Glória.

RICARDO CHIBANGA, O TOUREIRO DE MOÇAMBIQUE

Filed under: Ricardo Chibanga Toureiro — ABM @ 11:48

Imagens retocadas.

Ricardo Chibanga (8 de Novembro de 1942 – 16 de Abril de 2019) foi uma espécie de Eusébio da tauromaquia.

A Wikipédia resume o seu percurso (editado por mim):

Ricardo Chibanga nasceu na Mafalala, um bairro modesto de Lourenço Marques. Ele é um amigo de infância de Eusébio. Desde criança mostrou paixão pelas touradas, e visitava regularmente a Praça de Touros Minumental, que ficava mesmo ao lado de onde vivia. Em 1962, mudou-se para Portugal como assistente de um famoso toureiro. Primeiro, ele completou seu serviço militar, sendo depois o seu enorme talento como toureiro reconhecido em treinos na Golegã e Badajoz.

Tendo passado pela Escola de Toureio de Coruche, dos irmãos António e Manuel Cipriano «Badajoz», e pela Escola da Golegã, sob orientação de Patrício Cecílio, Chibanga apresentou-se em praças como a Praça de Touros de Viana do Castelo em Viana do Castelo, e a Praça de Touros do Campo Pequeno, em Lisboa, antes de rumar a Espanha.

Em Espanha — onde poderia exercer em pleno a função de matador, precisamente por não existir a proibição legal de matar o touro diante do público, tal como sucede em França e na América Latina — o primeiro toureiro de raça negra forjou-se como matador de sucesso, apresentando-se em praças tão importantes como a Real Maestranza de Sevilha ou Las Ventas, Madrid; bem como nas principais praças de França, como a Arena de Nimes ou o Coliseu de Arles.

Em outros países foi aclamado: no México, Reino Unido, Venezuela, Canadá, Estados Unidos, Indonésia, China, Angola e na sua terra natal, Moçambique. Várias celebridades o viram e admiraram como espectadores, incluindo Pablo Picasso, Salvador Dalí, Orson Welles e Christiaan Barnard, o mundialmente famoso cirurgião cardíaco.

Passou 20 anos a tourear, baseando a sua carreira em Portugal, Espanha e França.

Após o fim da sua carreira mudou-se para a Golegã, uma pequena localidade no Oeste português, onde viria a falecer, e onde, em sua homenagem, foi dado o seu nome a uma rua local.

Em 2 de março de 2019 sofreu em sua casa um acidente vascular cerebral. Morreu a 16 de abril de 2019, em sua casa na Golegã, na sequência desse AVC, depois de um período de internamento no Hospital de Torres Novas.

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29/12/2023

CIGARROS HAVANA, DA A. E. GEORGE & CO, DE LOURENÇO MARQUES

Imagem retocada.

Os Cigarros Havana eram produzidos pela empresa de tabacos A. E. George & Co., Ltd., Succsrs., em Lourenço Marques.

Maço de cigarros Havana.

26/12/2023

O COMPLEXO SCALA EM LOURENÇO MARQUES, 1931

Imagem do Boletim da Sociedade Luso-Africana do Rio de Janeiro, Maio de 1932, Pág. 27, retocado e colorido.

O Complexo Scala foi inaugurado em 1931.

CIGARROS FUTEBOL DA SOCIEDADE AGRÍCOLA DE TABACOS EM INHAMBANE

Filed under: Soc. Agrícola de Tabacos Lda LM — ABM @ 14:36

Imagem retocada.

Capa de maço de cigarros Futebol.

22/12/2023

O LUNA PARQUE EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Imagem retocada e colorida.

O Luna Parque à noite, em Lourenço Marques, anos 60. Era montado na Cidade uma vez por ano e era de frequência obrigatória, que mais não seja para ver durante o Passeio dos Tristes. Alojava-se sempre no terreno junto à Avenida da República (hoje 25 de Setembro) junto à Fazenda (hoje Gabinete do Primeiro-ministro). Ao fundo no meio do topo da imagem, a Capitania do Porto.

ALUNOS DA ESCOLA PRIMÁRIA PAIVA MANSO, JULHO DE 1933

Imagem retocada e colorida, da revista do Notícias publicada em 1 de Agosto de 1933.

Alunos da Escola Primária Paiva Manso, no Alto-Maé, Julho de 1933. Na altura o Alto-Maé estava em crescimento e ficava no extremo Poente da Cidade. Tinha a particularidade de, juntamente com a Mafalala e a Malhangalene, ser racialmente mais diverso – e mais pitoresco. Mais ou menos.

21/12/2023

FUNCIONÁRIOS DA NZASM EM LOURENÇO MARQUES, 1890

Imagem retocada e colorida, dos arquivos da Universidade de Leiden, nos Países Baixos.

A linha férrea oficialmente inaugurada a 8 de Julho de 1895 ( sendo que o serviço iniciou em 6 de Novembro de 1894), ligando Lourenço Marques a Pretória, tinha duas componentes separadas.

Do lado português (ou “moçambicano”), a linha foi inicialmente concessionada ao empresário norte-americano Edward Mcmurdo e cuja concessão foi cancelada no final de Junho de 1889 (na minha opinião um evento directamente precursor do Ultimato 11 de Janeiro de 1890), passando para a esfera do Estado português sob a empresa Caminhos de Ferro de Lourenço Marques. O cancelamento desta concessão foi um dos grandes escândalos e processos jurídicos na década de 1890, envolvendo os governos de Portugal, Reino Unido e Estados Unidos da América (em que, num discurso do State of the Union proferido ao Congresso a 3 de Dezembro de 1900, o Presidente dos EUA, William Mckinley, rosnou contra Portugal no final do processo) e só concluiria no início da década de 1900, em que Portugal perdeu – mas ganhou, pois o que confiscou valia mais que o que pagou no fim. Sendo que a víúva de Mcmurdo não teve que trabalhar mais um dia na vida.

Do lado da então República Sul-Africana (apenas o Transvaal), o projecto foi concessionado à Nederlandsche Zuid-Afrikaansche Spoorwegmaatschappij, ou NZASM, uma empresa constituída em 21 de Março de 1887 e que tinha sedes em Pretória e em Amsterdão, com accionistas alemães, holandeses e boers.

A aspiração de construir uma linha férrea entre o mar (junto da Baía de Lourenço Marques) e a capital do Transvaal remonta a 1872, quando uma proposta inicial foi feita ao Volksraad (o parlamento boer) pelo então Presidente Burgers, mas levaria mais que vinte anos a concretizar. In 1881 houve a Primeira Guerra Anglo-Boer, tendo o projecto retomado, especialmente depois de em 1886 terem sido descobertos os maiores campos auríferos no Mundo onde fica hoje Johannesburgo. Mesmo assim, levaria ainda alguns anos a concluir.

Os carris utilizariam a Bitola do Cabo (1.067 metros de largura).

Apesar das imensas dificuldades em ambos os lados, que incluíram um acidente que provocou uma das maiores explosões artificiais não-nucleares no mundo emBraamfontein no dia 19 de Fevereiro de 1896 (70 mortos e 200 feridos), o lado moçambicano da linha ficou operacional primeiro e o primeiro comboio viajou de Lourenço Marques e entrou em Komatipoort no dia 1 de Julho de 1891, após concluída a ponte sobre o Rio Incomáti (pela ZNASM). Dado que quase todos os materiais vinham de barco através de Lourenço Marques, exceptuando o traçado entre Pretória e Balmoral, a linha da NZASM foi construída de Leste (lourenço Marques) para Oeste (Pretória). Assim, a porção entre Komatipoort e Nelspruit ficou concluída em 20 de Junho de 1892. A linha entre Nelspruit e Waterval Boden abriu em 20 de Junho de 1894 e Balmoral (perto de Witbank) em 20 de Outubro de 1894, onde ligou com a parte, atrás mencionada, desde Pretória.

Uma dificuldade técnica considerável foi a parte entre Waterval Boden e Belfast, pois a inclinação do terreno era elevada e os combois “borravam-se” para subir aquilo, e depois era sempre a travar para descerem a longa escarpa.

A NZASM construiria muito mais linhas férreas dentro do Transvaal, tais como a linha entre Johannesburgo e Boksburg (na verdade a primeira de todas a linhas férreas a operar no Transvaal), depois extendida para Krugersdorp e penso que também de Pretória para Johannesburgo, e ainda de Roodeport para Springs (onde havia minas de carvão, essencial para as locomotivas). Também construíram a linha de Kaapmuiden para Barberton, 78 quilómetros da Zuiderlijn, lingando Pretória ao Cabo, 256 quilómetros da Zuid-Oosterlijn, ligando Pretória a Durban, e a Zuid-Westerlijn, ligando o Transvaal ao Estado Livre de Orange.

Funcionários da NZASM posam para uma fotografia em Lourenço Marques, 1890.

Fontes

https://en.wikipedia.org/wiki/Netherlands%E2%80%93South_African_Railway_Company

20/12/2023

A CÂMARA MUNICIPAL DE LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Imagem retocada.

A fachada sul da Câmara Municipal de Lourenço Marques, anos 60.

VITRAL DA SÉ CATEDRAL DE LOURENÇO MARQUES

Imagem de José Neves.

Um dos vitrais da Sé Catedral de Lourenço Marques, devotada a Nossa Senhora da Conceição, Padroeira da Cidade.

19/12/2023

BRINDE DA MERCEARIA LAURENTINO EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Imagem de Maria Aleixo, retocada.

Até ao final da década de 1960, tirando os bazares, a Cantina da Polícia no Alto-Maé, e a Cantina Militar no Bairro Militar, a Cidade abastecia-se de comida em mercearias e lojas de frutas e vegetais. Só no virar da década é que surgiram “supermercados”, o Ganha Pouco só de nome, e o Montegiro na Avenida António Ennes (hoje Julius Nyerere) na esquina ao lado do Ateneu Grego. Perto da minha casa na Polana havia o China” (porque era gerido por chineses, suponho) que vendia um pouco de tudo, desde cigarros Havana à peça, petróleo para candeeiros e fogões, fósforos, bebidas, rebuçados à peça, Choingas, berlindes, etc. Comprar lá alguma coisa que não fosse simples era uma aventura, pois se eu tivesse que explicar, os donos não falavam português e eu não falava chinês.

As mercearias tinham os seus clientes, alguns com “lista”, ou seja, pagavam uma vez por mês. Aviavam tudo à peça e a retalho, a partir de um balcão, e aquilo levava eternidades à espera enquanto e ia enchendo o cesto (não havia sacos de plásticos, tudo embrulhado em papel).

Com a mudança de turno em 1974 e a confusão subsequente, praticamente desapareceram.

Brinde da Mercearia Laurentino em Lourenço Marques. Penso que é um recipiente para colocar leite quente, para servir com café.

O PRIMEIRO RAID AÉREO LISBOA-LOURENÇO MARQUES, 5 DE SETEMBRO A 28 DE OUTUBRO DE1928

Recorte da Revista Turismo (Janeiro-Março de 1959) gentilmente enviado pelo Paulo Azevedo.

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18/12/2023

A PRIMEIRA CASA SALM EM LOURENÇO MARQUES

Imagens retocadas.

Quando, nos anos 60, todos os dias ia a pé para a escola primária Rebelo da Silva (actual 3 de Fevereiro) e desde a Rua dos Aviadores (actual Rua da Argélia) via a Avenida Fernandes Tomás (acho que agora é a Mártires da Machava) para a escola, que ficava na Pinheiro Chagas (actual Dr. Eduardo Mondlane), passava sempre por três casas que achava particularmente interessantes: a Villa Margherita (que foi usada para um pequeno museu de geologia), a Vila Algarve (a infame sede da Pide, que eu desconhecia por completo e que hoje está uma sucata) e a Residência Salm (que eu chamo assim, dado que acho que li no Grande Rogério diz que foi mandada fazer por este empresário de Lourenço Marques -mas não tenho a certeza). Hoje fica na esquina da Avenida Mártires da Machava e Rua José Mateus. Do outro lado dessa esquina fica uma espécie de mercado denso de palhotas, cheio de gente, onde se vende tudo e mais alguma coisa e que durante décadas estava vazio e servia apenas como corta-mato se eu quisesse ir à Pastelaria Cristal.

A Vila Algarve, anterormente mandada construir pelo empresário de origem algarvia José dos Santos Rufino (o tal dos álbuns e da lotaria) foi vendida ao Estado para servir de sede da Pide em Lourenço Marques, que, depois de uma presença residual, se instalou em Moçambique de armas e bagagens no início da década de 1960. Por cima casa da original de Rufino, que tinha apenas rés-do-chão, fizeram mais um andar e, supostamente, câmaras de tortura e celas, etc – o folclore em redor da casa (de que, que eu saiba, nunca se fez um estudo detalhado) é rico. Mas mantiveram a traça pictoresca. típica burguesa à antiga portuguesa com lindos painéis de azulejos, o que, a posteriori, para além de se situar numa pacata zona residencial a todos os títulos insuspeita, dá a tudo um ar surreal. É normal turistas irem lá fotografar aquilo, apesar de ser uma ruína com tapumes.

A linda Residência Salm, na Polana, numa foto de um dos álbuns de Santos Rufino, cerca de 1927. Com um terreno espaço e um desenho elegante.

A Residência Salm (há uma outra Casa Salm, mais recente, uma daquelas do Pancho Guedes) lá se foi aguentando mais ou menos intacta durante mais do que cem anos. Imagino que mudou de mãos para alguém bem conectado da Nomenklatura após a Vassourada que começou em 1974 e deve ter ido sendo alugada a estrangeiros, em dólares.

Até agora.

A Residência Salm, numa foto recente.

A verdade. no entanto, é que a pressão imobiliária na actual Maputo é muito forte (a inexplicável procura e oferta indicia origens muito suspeitas dos dinheiros que a alimentam em ambos os lados) e a Cidade, tal como antigamente, não quer, ou não tem meios, de manter nem sequer o seu mais expressivo património.

Pelo contrário.

A Residência fica numa zona agora considerada “nobre” e situa-se num lote com 2000 metros quadrados. Há uns dias, a empresa A Predial colocou num jornal de Maputo um anúncio de um leilão em que se convidam investidores para licitarem a propriedade, o que deverá ter acontecido em 6 de Dezembro.

Anúncio da Predial, Limitada, publicado no Diário Económico de Maputo, 16 de Novembro de 2023. Refere que o terreno tem 2 mil metros quadrados e que já tem projecto aprovado para se construir ali um prédio com 21.450 metros quadrados para uso residencial. Se se estimar uma área de implantalão de mil metros quadrados e apartamentos de 200 metros quadrados, estamos a falar de um prédio com pelo menos 20 andares e 107 apartamentos. Com uma média conservadora de 4 pessoas por apartamento, estimo que ali viverão 429 pessoas – cem vezes mais que anteriormente. A 400 mil dólares por apartamento, estamos a falar de cerca de 43 milhões de dólares.

Eu já nem me refiro à pressão sobre a já de si periclitante infra-estrutura (ainda largamente colonial) da Cidade de Maputo para este tipo de construção. Não conheço grande evolução nos sistemas de saneamento da cidade (esgotos e estações de tratamento de águas residuais) que, ao que sei, continuam a atirar essas águas residuais sem qualquer tratamento para a Baía, que já deve ser mais veneno pestilento que água do mar. Nem o reforço da rede eléctrica da Cidade, que já teve remendos mas que deve precisar de uma reposição geral. Mas passar, num único terreno, de uma casa de uma família para um mastodonte desproporcional com 20 andares, onde viverão mais do que 400 pessoas, especialmente tendo em conta que este é apenas um de inúmeros projectos, é obra.

E depois há esta imparável destruição de património arquitectónico. Maputo está a deixar de ser uma cidade com uma beleza, proporção e um percurso histórico, para ser um sítio, e descaracterizado. Quase tão mau como aquilo que foi feito nas décadas de 60 e 70. quando os portugueses “invadiram” aquilo.

Fica esta referência e esta memória.

AMÁLIA E ALBERTO RIBEIRO NO RESTAURANTE MIRAMAR EM LOURENÇO MARQUES, 1951

Imagens retocadas.

Conhecia vagamente o Restaurante Miramar e basicamente nunca fui lá salvo a compra de uma Coca-Cola ou uma chuinga da Chiclets. Mas era um dos locais conhecidos da Cidade. Penso que já não existe e praticamente a antiga zona pública junto à praia foi tomada por negócios, cortando ali a vista para o mar.

O Restaurante Miramar, na praia em frente ao Parque de Campismo de Lourenço Marques.
O Miramar atrás. Em primeiro plano, uma paragem de machimbombo.

No entanto, no que resta do local, há duas placas, uma, a referente à fadista portuguesa Amália Rodrigues, indicando a data em que o restaurante abriu: na noite de quinta-feira, dia 29 de Março de 1951.

E em que a diva do fado de Portugal actuou.

As placas no Miramar.

A Amália todos conhecem. Visitou Moçambique várias vezes e foi sempre bem recebida.

Mas quem era Alberto Ribeiro, cuja placa indica ter estado lá em 28 de Junho de 1951?

O sítio de A Voz de Ermesinde tinha isto a dizer sobre Alberto Ribeiro (editado por mim):

Alberto Dias Ribeiro nasceu em Ermesinde no dia 29 de fevereiro de 1920. Dono de uma excelente voz, que, desde muito novo, o catapultou como um autêntico ídolo, nas artes musicais e cénicas, notabilizou-se no teatro, cinema e televisão, gravando alguns discos de grande sucesso.

Actuou nas maiores casas de espectáculo de Portugal e do mundo, esgotando lotações e colhendo do público fortes aplausos. Foi um cantor de sucesso e, só não foi mais longe porque chegou a recusar muitos convites. Entre as canções interpretadas por Alberto Ribeiro há algumas que se consagraram como grandes êxitos, nomeadamente, “Coimbra”, “Adeus Lisboa”, “Carta do Expedicionário”, “Soldados de Portugal”, “Marianita”, “Serenata dos Olhos Verdes”, “O Porto é Assim”,“Senhora da Nazaré”, “Marco do Correio”, “Última Carta”, o “Fado Hilário” e “Eu Já Não Sei”.

Para ele foram feitas, especialmente, duas peças de Ópera, por um autor italiano, em que ele recusou tomar parte, pois não aceitou as propostas, considerando-as aberrantes.

Foi actor, cantor e cabeça de cartaz em muitos espetáculos. Entrou em vários filmes e atuou em muitas peças teatrais, especialmente em revista.

Um dos filmes em que ganhou grande popularidade foi o “Capas Negras” (1947), tendo contracenado com Amália Rodrigues. Outras películas em que participou foram: “Um Homem do Ribatejo” (1946), “Ladrão de Luva Branca” (1946), “Cantiga da Rua” (1950), “Rosa de Alfama” (1953), “O Homem do Dia” (1958), “Canção da Saudade” e “Manhã Submersa” (1980). Alberto Ribeiro foi, com António Vilar, um dos maiores galãs do cinema português do seu tempo.

Depois de deixar os palcos, partiu para o Brasil, onde terá vivido praticamente toda a década de 1950. Aí ter-se-á dedicado sobretudo à actividade comercial, no ramo imobiliário, o que lhe retirou tempo para continuar a dedicar-se ao labor artístico. O seu regresso definitivo a Portugal terá ocorrido já na década seguinte.

O seu regresso à Europa é acompanhado de grande sucesso. Para além de ter actuado em diversos palcos de Portugal, fez digressões por vários países europeus, regressando a Portugal, precisamente quando se iniciavam as filmagens do filme «Canção da Saudade», de acentuadas características musicais, onde toma parte como o mais representativo cantor. Essa película é uma co-produção com Espanha, tendo Alberto Ribeiro interpretado o «Fado Hilário», e na versão espanhola aparece a cantar o fado «Coimbra».

Alberto Ribeiro tinha casa em Lisboa, cidade onde também vivia uma sua irmã.

Faleceu no Porto, em Maio de 2002, com 82 anos.

17/12/2023

ANÚNCIO DE CAPILÉ DO DIAS DOS XAROPES EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Imagem de José Neves, retocada e colorida.

Um copo de capilé bem gelado com uma fatia de limão era uma bebida comum na Cidade. Era um banho de açúcar mas na altura isso era normal. Curiosamente, fiz toda a escola primária na Rebelo da Silva com o filho do dono da empresa na década de 1960.

Anúncio do Capilé do Dias dos Xaropes, anos 60.

O PRIMEIRO VOO COMERCIAL DA TAP ENTRE LISBOA E GOA, JULHO DE 1961

Imagem retocada.

Foi uma espécie de esforço efémero, em quase total contraciclo com os ventos da História, que espelha adequadamente o choque entre as dialécticas portuguesa e do mundo (bem, da Índia neste caso) naquela altura. Enquanto que a Índia britânica se tornou independente (junta e violentamente com o Paquistão, após uma partição que faz o que aconteceu com Israel, uns meses, depois, numa brincadeira de crianças) em 15 de Agosto de 1947, e insistia na “devolução” de Goa, Salazar promovia voos regulares entre Lisboa e a capital do seu Estado.

O primeiro voo entre Lisboa e Goa ocorreu em Novembro de 1930, quando o Marão saiu no dia 1 do campo aéreo da Amadora e aterrou no aeródromo de Diu no dia 18, pilotado pelo Capitão Moreira Cardoso e o Tenente Sarmento Pimentel. Voltaram de barco para Portugal e basicamente daí nada resultou em termos de ligações aéreas entre Lisboa e a Índia Portuguesa.

Em 1951, as autoridades portuguesas criaram os TAIP – Transportes Aéreos da Índia Portuguesa – tendo o primeiro avião chegado a 10 de Agosto desse ano. Todo o historial dos TAIP pode ser lido neste precioso documento.

Em Maio de 1955 foram inaugurados três novos aeroportos na Índia Portuguesa, em Goa, Damão e Diu e asseguradas ligações entre este territórios e Karachi, no Paquistão, já que a Índia boicotava as ligações com os territórios cuja soberania reclamavam.

Só em Julho de 1961 se inaugurou uma carreira comercial regular directa entre Lisboa e a Índia Portuguesa.

Postal alusivo ao primeiro voo comercial regular da TAP entre Lisboa e Goa, 8 de Julho de 1961. Levava 19 horas e fazia cinco escalas.

A chegada do Lockheed Super Constellation da TAP a Goa nesse dia em 1961 pode ser vista neste filme da RTP. E aqui, uma semana mais tarde, um curto filme do primeiro voo de regresso de Goa para Lisboa.

Apenas cinco meses depois, a 17 de Dezembro do mesmo ano – faz hoje 62 anosna chamada Operação Victória, ordenada por Jawaharial Nehru, então o mercurial primeiro-ministro da Índia, e em dois dias, 45 mil tropas indianas invadiram (ou “libertaram”) o até então Estado Português da Índia, pondo fim a 451 anos de presença portuguesa na região, que na altura incluía os territórios de Goa, Damão, Diu, Gogolá, Simbor e a ilha de Anjediva.

Durante a invasão, no dia 18 de Dezembro de 1961, estavam estacionados no aeroporto de Dabolim um DC-4 Skymaster dos TAIP e um Super-Constellation da TAP. Depois de se efectuarem reparações na pista e na torre de controlo nessa noite, entretanto bombardeadas pelo exército indiano, os dois aviões levantaram voo para Karachi, de onde seguiram para Lisboa.

À semelhança das convulsões ocorridas com a independência da Índia britânica em 1947, quando a colónia britânica foi violetamente separada com a criação da actual Índia e o Paquistão, a tomada da Índia Portuguesa teve impacto significativo em Moçambique, para onde foram viver muitos antigos residentes da Índia, havendo ainda o triste episódio do aprisionamento de cidadãos indianos, efectivamente reféns do estado português, para posterior expulsão e troca por prisioneiros portugueses detidos pela Índia.

Portugal só reatará relações diplomáticas com a Índia após o golpe de Estado que derrubou o governo de Marcelo Caetano em 1974.

Goa parece ter sobrevivido o embate e seguido em frente. Hoje, para variar, é um dos mais pequenos Estados da Índia mas o mais rico em termos de Produto per Capita, considerado como tendo a melhor infra-estrutura e o segundo melhor índice de qualidade de vida na Índia. É um dos principais destinos turísticos em toda a Índia e admirado pelas suas praias, natureza intocada, monumentos e – oh – vida nocturna, significativa herança cultural indo-portuguesa, diversidade religiosa e arquitectura portuguesa e indiana.

Um bilhete de avião entre Lisboa e Goa pode agora ser comprado por entre 500 e mil euros, ida e volta. Os cidadãos portugueses são muito benvindos. E desde 2015, dezenas de milhares de cidadãos indianos têm vindo viver e trabalhar para Portugal (e o Reino Unido, antes deste sair da União Europeia) e outros tantos descobriram raízes portuguesas e reclamaram para si passaportes de Portugal. O ainda actual primeiro-ministro de Portugal descende de famílias com ligações a Goa. As relações entre Portugal e a Índia vão bem e recomendam-se.

Ah como as coisas mudam. Talvez um dia até possa voltar a haver outra vez uma ligação aérea entre… Lisboa e Goa.

16/12/2023

O PADRE ARNALDO ARAÚJO DA IGREJA DE SANTO ANTÓNIO DA POLANA EM LOURENÇO MARQUES, 1929-2019

Filed under: Padre Arnaldo, Padre Arnaldo - Sto Antº da Polana — ABM @ 15:43
O Padre Arnaldo, aqui cocuana em Lamego, década de 2010. Na minha infância foi Pároco da Igreja de Santo António da Polana em Loureço Marques, 1963-1975, onde fiz a catequese e a Primeira Comunhão. Tínhamos um absoluto ódio de estimação um pelo outro. Como alguém se lembrou de colocar uma pessoa tão conservadora numa igreja cuja arquitectura respirava abertura e liberalismo, num bairro como a Polana, não faço ideia (bem, o Arcebispo Alvim Pereira….). Mas tinha muitos adeptos e deve ter feito muito bem a muita gente. Rest in Peace.

Se o Exmo. Leitor premir AQUI, pode ver o Padre Arnaldo no seu prime em 1973 dirigindo os Pequenos Cantores da Polana na Igreja de Santo António da Polana, em 15 de Janeiro de 1973.

Segundo uma nota da Diocese de Lamego de 8 de Outubro de 2019:

Arnaldo Taveira de Araújo nasceu em Calvelo, Ponte de Lima, a 7 de fevereiro de 1929, filho de Manuel José de Araújo e de Maria Virgínia Taveira; tomou hábito a 7 de setembro de 1947, fez a profissão temporária a 8 de setembro de 1948 e a profissão solene a 7 de setembro de 1951 e recebeu a ordenação sacerdotal a 29 de junho de 1955.

No terceiro ano de Teologia, com o Guardião e Reitor do Seminário da Luz, Padre José do Nascimento Barreira, ajudou na recuperação da igreja de Telheiras (Lisboa), que se tinha transformado numa carpintaria. Foi o despertar da sua vocação pastoral. Na igreja de Nossa Senhora das Portas do Céu de Telheiras havia de celebrar a Missa Nova a 3 de julho de 1955.

Moçambique, 1956-1975

Após um ano de Pastoral no convento de Varatojo, foi enviado em missão, em final de 1956, para Moçambique e foi colocado na Missão de João Belo (Xai-Xai) a 21 de dezembro de 1956. Em 1961, foi transferido para Mavila (Missão de Santo António de Zavala). Em meados de 1962 foi colocado como Pároco da nova igreja de Santo António da Polana em Lourenço Marques. Por ocasião da inauguração da igreja, a 13 de junho de 1963, manifestando uma grande sensibilidade musical e humana, criou o grupo coral dos Pequenos Cantores da Polana, e em 1964 introduziu na paróquia o Escutismo católico.

Após a independência de Moçambique, em 1975, voltou para Portugal. Chegou na véspera do Natal. Em março de 1976, foi colocado na Paróquia da Pontinha, com residência no Seminário da Luz. Em 1979, também na Pontinha, criou um novo Grupo Coral de Pequenos Cantores. Em 1995 foi transferido para Vila Real como Pároco da paróquia de São Pedro.

Em 2001 publicou “Memórias da Paróquia de São Pedro de Vila Real”. Além de historiar o serviço pastoral dos franciscanos na Paróquia de São Pedro (100 anos ininterruptos), e de Santo António da Araucária, a partir de 15 de dezembro de 1995 até hoje, referiu em particular a criação da Fraternidade Franciscana de Vila Real, que aconteceu em 23 de Maio de 1916, bem como a entrega, à Fraternidade, dos cuidados pastorais da mesma Paróquia, primeiro ao Fr. Domingos Gonçalves Sanches, como Encarregado, a 13 de junho de 1917 e, depois, como pároco, a 3 de janeiro de 1918.

Por ocasião dos 8 séculos de presença franciscana em Portugal e 500 anos da presença dos Franciscanos em Vila Real, Frei Arnaldo Taveira de Araújo publicou a “Vida e ação dos Franciscanos em Vila Real”.

Em 2018 publicou a História dos Franciscanos em Lamego “Vida e ação dos Franciscanos em Lamego” pelos 100 anos de presença na Igreja de São Francisco e um pequeno livro com o título Igreja de São Francisco em Lamego (visita guiada à Igreja de São Francisco, Lamego).

Em 30 de setembro de 2013 foi transferido da Fraternidade de Vila Real para a de Lamego, onde viveu e trabalhou até ao fim dos seus dias.

Faleceu no dia 8 de outubro de 2019, pelas 7h30, no Hospital de Vila Real. Tinha 90 anos de idade, 71 de profissão religiosa e 64 de sacerdócio.

A PISCINA DO DESPORTIVO EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 70

Era um clube, mas ao mesmo tempo detinha e operava, praticamente sem custos para os atletas, quiçá a melhores instalações desportivas da capital moçambicana. A piscina, a primeira para lazer e prática de natação, salto e pólo aquático, construída no final dos anos 40 e inaugurada em 24 de Julho de 1949, usou uma engenharia especial proposta por um engenheiro alemão, “flutuava” sobre o solo, que ali tinha uma linha freática praticamente à superfície, resultando que, de outro modo, a piscina afundar-se-ia com o peso. Tinha 33.3 metros por 25 jardas, o comprimento a dimensão de uma piscina olímpica na altura, e uma parte funda com cerca de 4.5 metros, permitindo os saltos das suas pranchas com 3, 5 e 10 metros de altura. Num edifício do lado esquerdo, operava uma potente bomba, ligada a gigantescos filtros, que mantinham a água da piscina limpa (bem, de vez em quando aquilo descambava). A piscina tinha o nome formal de Paulino dos Santos Gil, então talvez o maior empresário de Moçambique, que contribuiu de forma expressiva para a sua construção.

O mesmo sucedeu com o campo de futebol, cuja construção foi uma história épica, que contei num artigo que escrevi aquando do centenário do Desportivo em 2021 e merece ser lido. Nas décadas de 1920 e 1930 o campo de futebol do Clube ficava situado directamente em frente à entrada principal, encaixado entre essa entrada (que não existia então) e a então Câmara Municipal da Cidade, que hoje é um tribunal. No final dos anos 30, a Câmara fez uma troca, em que o campo, que tinha bancadas de madeira do lado da Câmara Municipal, foi demolido e foi cedido um terreno a seguir ao campo do Sporting. Mas nada se fez até que o Benfica, com quem o Desportivo tinha uma afiliação, não só ganha o campeonato nacional como a Taça Latina, e é decidido fazer uma turnée que iria até Lourenço Marques. Para que os eventos na Cidade não se realizassem nos estádios do Sporting ou do Ferroviário, os sócios do Desportivo construiram um novo estádio em…. menos que oito semanas. O campo também tinha o nome de Paulino dos Santos Gil.

A piscina do Grupo Desportivo Lourenço Marques, anos 70.

Em frente à piscina, vê-se um edifício redondo, construído na década de 1940 antes da piscina. que, com a esplanada, coberta nos anos 60, permitia realizar eventos particulares e do clube, que permitiam angariar receitas para operar as suas instalações. Festas de fim do ano, passagens de filmes, festas de final do ano,carnaval, bingos, ocorriam ali. Do lado esquerdo, nos anos 50, foi construida uma piscina para crianças, composta por dois círculos interligados entre si. A meio, havia uma pequena carreira de tiro, que no meu tempo (anos 60 e 70 até 1975) não era assim tão utilizado, se bem que tinha uma secção activa. Esta piscina tinha o seu próprio sistema de filtragem de água. Mais à frente, junto à casa das máquinas, ficava o que foi originalmente um campo de hóquei, construída com velocidade vertiginosa quando os jogadores do Desportivo ganharam o campeonato do Mundo penso que no final dos anos 40 (quem me contou isto foi o Sr. José Craveirinha, sócio, depois conhecido pela sua poesia). Foi depois convertido para uso no basquet, depois de construído um novo estádio de hóquei na década de 1950 (na foto,do lado direito, vendo-se a bancada poente), que foi desenhado pelo Eng. Tomás Gouveia, um sócio e Pai das Irmãs Gouveia (João, Dulce, Anabela e Lídia). Ainda antes de 1975, esse espaço foi coberto e era usado também para a prática do basquet. A Norte deste estádio, havia uns campos de ténis que foram convertidos no final dos anos 60 para uso no mini-basquet.

Em 1971, ano do cinquentenário do Clube, os sócios projectaram criar um novo pavilhão desportivo, o maior que a Cidade teria, também desenhado pelo Eng. Tomás Gouveia. Até houve uma cerimónia de descerramento de uma “primeira pedra” no dia 23 de Maio desse ano. Felizmente, atrasou-se e acabou por nunca ser construído, pois digamos que a partir de 1974 as prioridades de quem veio a seguir passarm a ser outras.

Há duas semanas, foi conhecido um processo de falência, resultante da contracção de dívidas pelas sucessivas direcções, dando o seu património como garantia. O que prenuncia o fim do clube, após 102 anos de existência.

15/12/2023

O PRIMEIRO ASSASSINATO DE UM PRESIDENTE PORTUGUÊS, DEZEMBRO DE 1918

Filed under: O assassinato de Sidónio Pais 1918 — ABM @ 20:50

Imagens retocadas.

Esta o Exmo. Leitor não leu nos livros da 4ª Classe: a Primeira República (5 de Outubro de 1910-26 de Maio de 1926) foi apenas mais uma enorme fraude cometida por uma elite raivosa e gananciosa de Lisboa, organizada em gangs mais ou menos líricas e perfumadas e que descambou quase imediatamente desde o momento da sua imposição aos portugueses, e dali para a frente percorreu um caminho descendente, até à sua eliminação em 1926, quando o país já estava praticamente em guerra civil e falido, um caos e onde já valia tudo. A alteração prática de um sistema monárquico reconhecidamente em crise para um sistema presidencial apenas mudou um pouco a tónica do discurso. Os sucessivos líderes republicanos afinal percebiam tanto de gerir e melhorar um país como eu de ciência espacial. E, como ainda hoje, todos falavam, falavam, falavam, mas não faziam quase nada de útil. E, como hoje, quem se lixa é o povo. que sobrevive ou emigra.

Mais do que tudo, foi dessa crise, e da memória desse período horrendo, que resultou uma das ditaduras mais longas da Europa. Na verdade, quem ler bem os documentos primários, Salazar nem sequer tinha que justificar ideologicamente a sua ditadura de partido único e a violência dos instrumentos que usava para reprimir os seus extremos (dum lado os comunistas, e do outro os fascistas e os naziófilos). Bastava aludir, ao de leve, as esses tempos, e toda a gente percebia: não se pode voltar a esses tempos. Nunca mais. E o “nunca mais” durou até 1974.

Claro que o Estado Novo continha o que considero tiques de personalidade do Ditador: um economicismo quase bacoco (mas que funcionou lindamente até 1945), a exortação exacerbada dos “tempos glórios” que desembocava na teima de que as colónias “herdadas” nunca se podem largar, um recentrar do catolicismo na vida cívica do país que até foi popular mas que foi demasiadamente forçado e que acabou sendo um oscilar do pêndulo em relação às escandalosas perseguições da Primeira República.

Um dos episódios enigmáticos dessa era caótica, em que governos, eleições manipuladas, parlamentos e leis se sucediam a um ritmo alucinante, foi a presidência de Sidónio Pais, primeiro sinal e prenúncio do que viria em 1926, antecedido, seis mese santes, por um estranho fenómeno social, ocorrido nas profundezas do mato português, em que multidões asseguravam que nada menos que Maria, a Mãe de Jesus, tinha surgido, e falado, num buraco perdido perto da localidade de Fátima, com três crianças pobres e analfabetas, chamadas depois os Pastorinhos.

A presidência de Sidónio Pais durou aproximadamente um ano, de 8 de Dezembro de 1917 até ao dia 14 de Dezembro de 1918, um mês e uma semana depois de uma Europa exangue ter conseguido negociar um armistício com o Império alemão, efectivamente uma rendição, mesmo quando a Alemanha ainda comandava regiões inteiras da França.

Estupidamente, a elite de Portugal estava entre os Aliados desde 1916, convencida da vitória aliada e de que assim preservaria as suas colónias e ganharia aguma coisa mais. Claro que ninguém ganhou coisa nenhuma com essa guerra, que, dependendo de como se lâ a História, duraria até à caída do muro de Berlim em Novembro de 1989.

Sidónio, que fora embaixador de Portugal em Berlim entre Agosto de 1912 e Março de 1916, era contra a entrada dos portugueses no conflito.

Populares em Lisboa juntam-se na Praça do Comércio para celebrar, ao tomarem conhecimento do Armistício, celebrado a 11 de Novembro de 1918.

Bem, na conferência dos espólios e indemnizações em Versailles Portugal recebeu “de volta” o Triângulo de Quionga, no extremo norte da sua colónia na África Oriental, a nesga de território que hoje permite aos moçambicanos alimentar sonhos húmidos de riquezas fabulosas a vender os mesmos gases offshore altamente poluentes que, segundo o COP do Dubai 2023, todos somos supostos deixar de usar em 2050. Portanto, a elite de Maputo tem exactamente 27 anos para chupar o que puder do gás natural e do carvão de Tete, enquanto que ao mesmo tempo vai afirmar-se vítima dos efeitos das alterações climáticas advindas do mesmíssimo gás e carvão que vende, e pedir ajuda aos mais endinheirados. Presumo que parte deste dinheiro há-de chegar ao povo. Do outro, nem pensar.

O Ano de Sidónio foi não menos alucinante que o resto da Primeira República. Com três diferenças de fundo: 1) ele decidiu governar sozinho, acumulando a presidência com o poder executivo, ignorando o parlamento, recorrendo a decretos “dictatoriais”; 2) reverteu o anticlericalismo ferrenho que caracterizava o regime desde 1910; e 3) aprova um decreto que prevê que, pela primeira vez, o Presidente da República (neste caso, ele) seria eleito directamente pelos eleitores, passando a legitimidade do cargo para fora da alçada dos políticos.

O povo gostou.

Entretanto em Abril de 1918 aconteceu o desastre de La Lys, um campo de batalha na França, em que em 3 horas os alemães mataram uns sete mil soldados e oficiais portugueses. De repente, o liricismo bélico e a ideia de defender as colónias (havia guerra no Sul de Angola e no Norte de Moçambique, ambas desastrosas também) passou a ter um tom mais sombrio.

O verão de 1918 foi um caos contido, Que piorou quando, finda a guerra, parece que não havia maneira de repatriar as tropas portuguesas.

Entretanto veio a Pandemia da chamada Gripe Espanhola. As ruas de Lisboa encheram-se de mortos e ninguém sabia o que fazer.

No dia 14 de Dezembro, ao se dirigir à Estação ferroviária do Rossio para uma deslocação, Sidónio foi assassinado a tiro por José Júlio da Costa, um qualquer.

Júlio da Costa mata o presidente a tiro na Estação do Rossio.

Foi uma comoção nacional.

Postal da época, em que se cita a alegada última frase de Sidónio antes de morrer.

Sidónio seria sepultado na Sala do Capítulo do Mosteiro dos Jerónimos após um mega-funeral. Os seus restos seriam transferidos para o então recentemente inaugurado Panteão Nacional em 1966, onde ainda se encontra, ao pé do Eusébio e da Amália.

A Primeira República retomou o clima de circo político de antes, que duraria até o Marechal Gomes da Costa impor a Ditadura em 1926, que acabou com a experiência.

José Júlio da Costa, o assassino, nunca seria julgado nem nunca seria libertado. Morreu em 1946.

Ontem fez 105 anos que Sidónio foi morto na Estação do Rossio.

Um dos seus filhos, Afonso Pais, médico, viveu muitos anos em Lourenço Marques. Samora conhecia-o perfeitamente.

14/12/2023

A MORTE DO ANTIGO GRUPO DESPORTIVO LOURENÇO MARQUES

Imagem retocada e colorida. Post dedicado à grande nadadora do Desportivo, Dulce Gouveia, que ontem celebrou o seu 71º aniversário em Cascais e cujo Pai, o eng. Tomás Gouveia, gratuitamente, desenhou e dirigiu a construção, na década de 1950, do campo de basquet situado à direita de quem entra no Desportivo.

No meu blog “desportivo” The Delagoa Company, ontem, referi a publicação de um aviso judicial, há cerca de duas semanas, no Notícias de Maputo, indicando a falência do Grupo Desportivo de Maputo e a previsão da execução do seu património pelo Banco Comercial e Investimentos, SA (cujos accionistas são um instrumento da CGD e do BPI e terceiros da Insitec que nunca percebi quem são) e posterior venda, para ressarcir os seus credores.

O símbolo do Grupo Desportivo Lourenço Marques, 1921-1975.

A agonia final do Clube, fundado em 1921 com o nome do putativo e de outro modo anónimo navegador que andou por aquela zona há quinhentos anos, já era previsível nos últimos anos, por absoluta incompetência, incúria e quiçá má fé dos seus subsequentes dirigentes (um deles o advogado Michel Grispos, que discretamente vendeu o estádio de futebol do clube há menos que dez anos), uma massa associativa que obviamente estava a assobiar para o lado, e a contaminação do seu espaço com terceiros que ali fizeram um salão de festas/discoteca tipo Bollywood em Cuecas e tornaram a histórica piscina, inaugurada em 1949, num tanque para lavar os pés aos fins de semana. No fim, aposto cem Meticais que por detrás disto tudo estão interesses imobiliários, empresários “de sucesso” com rios de dinheiro cuja proveniência só eles e Deus sabem, que ali farão milhões com algum empreendimento imobiliário apetitoso.

Para criar mais uns ricos. Mais uns Florindos, que tanta falta fazem a Moçambique e aos moçambcanos.

Não descansaram enquanto não deram cabo daquilo e deliberadamente chuparam, a crédito e a prestações, pelos vistos, o valor e os recursos criados com muito sacrifício nas décadas de 1940 e 1950. Que o BCI, um banco detido maioritariamente por dois bancos com sede em Lisboa – um já é hespanhol – e supostamente com algumas credenciais lá na Praça (bem, mais ou menos) se predispusesse para fazer este frete, sabendo perfeitamente que a seguir iria ter que executar o clube para recuperar o que emprestou, é de bradar aos céus. Mas depois vem, como os outros bancos, carpir para a rua e encher as páginas dos pasquins àcerca da sua elevada responsabilidade social e da sua moçambicanidade. Pois.

E lá vão cem anos de tradição que era boa e sã tradição, ao ar. A não ser que se recorra à velha e desgastada cassette de que tudo o que foi feito antes de 1975 era para destruir.

Eu costumo pensar, e agora se torna verdadeiro, por exclusão de partes, que o Desportivo, que era os seus sócios e os seus descendentes, que fizeram o Clube, reside em Portugal e os seus membros almoçam juntos uma vez por ano na Linha do Estoril. Eu apenas guardo umas boas memórias e umas fotografias, só para lembrar como era.

O que ficou em Maputo era apenas um sítio, e pelos vistos muito mal frequentado.

Bom proveito para todos.

O CAFÉ NICOLA EM LOURENÇO MARQUES

Filed under: Café Nicola LM, LM Café Nicola — ABM @ 12:51

A primeira imagem foi retocada e colorida, a segunda é um recorte da Revista Turismo (Janeiro-Março de 1959), gentilmente enviada por Paulo de Azevedo.

Depois da autêntica razia que foi a (triste) reconfiguração da histórica Praça 7 de Março na primeira metade da década de 1940, praticamente não existiram ali cafés ou restaurantes até aparecer nos anos 50 o Nicola, que durou até ao início da década de 1970, quando o restaurante fechou e o espaço foi adquirido para ser um balcão bancário. O Nicola tinha a particularidade de ter a sua esplanada em plena praça. Os empregados andavam de bandeja entre o restaurante e a mesma, tendo de atravessar a rua.

Gravura que data da década de 1960, cujo autor desconheço, mostrando a esplanada do Café Nicola, na Praça 7 de Março (hoje 25 de Junho) em Lourenço Marques.
Anúncio do Nicola na Revista Turismo, Janeiro-Março de 1959.

10/12/2023

OS QUADROS E OS FREITAS NO CARNAVAL EM QUELIMANE, FEVEREIRO DE 1953

Imagem de Vasco Freitas, retocada, muito gentilmente cedida esta noite pelo Vasco, em memória de Maria João Quadros, que faleceu em Lisboa no dia 8 de Dezembro de 2023.

Festa de Carnaval em Quelimane, Fevereiro de 1953. Da esquerda: Lena, Maria João (Feijão), Vasco Freitas, Pingo, Isabel, Chica, Nuno e Ana. Atrás, ao colo do Pai Afonso Quadros, é a Cristina Freitas, irmã do Vasco Freitas.

CERIMÓNIAS FÚNEBRES DE MARIA JOÃO QUADROS

Segundo uma nota de uma filha da Maria João, as cerimónias fúnebres decorrerão assim:

Velório hoje, domingo, 10 de Dezembro de 2023, a partir das 18 horas na Basílica da Estrela em Lisboa, com Missa às 20 horas;

Funeral amanhã, dia 11 de Dezembro de 2023, com Missa às 10 horas, seguida de enterro no Cemitério do Alto de São João.

09/12/2023

MORREU MARIA JOÃO QUADROS

Imagem retocada e colorida.

A família Quadros (Mãe e nove irmãos) em Lourenço Marques, anos 60. Da esquerda para a direita: Lena, Isabel, Pingo, Rui, Mãe Maria com Nuno ao colo, Feijão(alcunha de Maria João Quadros), Chica, Ana Maria e Jorge. A foto deve ter sido tirada pelo patriarca da Família, Afonso Quadros. Moravam na mesma rua que eu na Polana em Lourenço Marques, a Rua dos Aviadores (hoje Rua da Argélia).

A imprensa portuguesa noticiou hoje o falecimento ontem, por doença, de Maria João Quadros, irmã do antigo caçador Rui Quadros e de Nuno Quadros, que eu conheci.

Tinha 75 anos de idade.

Maria João Quadros.

Nascida na localidade de Mtwali, em Nampula em 19 de Fevereiro de 1948 , Maria João Barbosa Teles de Castro e Quadros começou a cantar em Lourenço Marques e era uma fadista muito apreciada pelos aficionados. Na Debandada de Moçambique em meados da década de 1970, foi viver para Portugal, onde começou a a actuar profissionalmente. Ao longo da sua carreira ali, editou vários discos e participou em numerosos espetáculos. Geria a Casa da Mariquinhas em Lisboa, uma casa de fados.

É uma das figuras mencionadas no trabalho de Margaret Nabarro, publicado em 1976, sobre o fado em Moçambique, que pode ser lido no meu outro blog, The Delagoa Bay Review, premindo AQUI.

Aos seus familiares, apresento as minhas condolências.

08/12/2023

O FERIADO DA IMACULADA CONCEIÇÃO EM PORTUGAL EM 8 DE DEZEMBRO

Imagem retocada.

A cúpula da Igreja de Santo António da Polana em Lourenço Marques, iluminada pelo sol, onde, solenemente, eu fiz a Primeira (e última) Comunhão da Igreja Católica na manhã de Domingo, dia 8 de Dezembro de 1968, Feriado da Imaculada Conceição, Padroeira de Portugal e de Lourenço Marques. A Sé Catedral de Lourenço Marques foi e está consagrada a Nossa Senhora da Conceição. O presídio de Lourenço Marques, que deu origem à capital de Moçambique, depois “fortaleza”, tinha o nome formal de “Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição” e a primeira igreja católica construída em Lourenço Marques (no local onde hoje está a sede do antigo Rádio Clube de Moçambique, demolida na década de 1930) tinha o nome de “Igreja Paroquial de Nossa Senhora da Conceição”.

Hoje é feriado nacional em Portugal, celebrando a chamada Imaculada Conceição. O que é e de onde veio esta celebração nacional?

Segundo um texto da Câmara Municipal de Penaguião que consultei (e editei), Nossa Senhora da Conceição foi a Mãe de Jesus Cristo:

O dia invoca a vida e a virtude de Virgem Maria, mãe de Jesus, concebida sem mácula, ou seja, sem marca do pecado original, o que recebeu o estatuto de dogma católico pelo Papa Pio IX no dia 8 de dezembro de 1854 (ou seja, passa a ser considerado assim pela Igreja e não se pode questionar). Assim, tem origem a celebração dessa comemoração, que é uma data de grande significado para a Igreja Católica.

A imaculada conceição é um dos chamados quatro dogmas marianos. Os outros três são que ela é a Mãe de Deus, a Perpétua Virgindade (pois) e a Assunção.

Antes de ter sido considerado um dogma, a celebração da data pelos Católicos já havia sido decretada em 1476 pelo Papa Sisto IV.

Em 25 de março de 1646, cinco anos e quatro meses depois da chamada Restauração da Independência (outro feriado nacional português, celebrado a 1 de Dezembro) e sabe-se lá porquê, o rei D. João IV organizou uma cerimónia solene, na solarenta e alentejana Vila Viçosa, para agradecer a Nossa Senhora da Conceição pela Restauração da Independência de Portugal em relação à Espanha. O rei foi até a igreja de Nossa Senhora da Conceição na Vila, declarando-a padroeira e rainha de Portugal e anunciando que, desde esse dia (e até ao fim da dinastia dos Bragança em 1910), mais nenhum rei português usaria a coroa real na cabeça, privilégio que, diziam, estaria disponível apenas para a Nossa Senhora Imaculada da Conceição.

Importa referir que durante séculos, o Dia da Mãe em Portugal era comemorado no dia 8 de dezembro, tendo sido mudado para maio há relativamente poucos anos, por ser esse considerado o mês de Nossa Senhora. Quando eu era miúdo em Lourenço Marques, ainda assinalei o Dia da Mãe a 8 de Dezembro, primeiro comprando uns postais alusivos na lojinha de artigos religiosos da Igreja de Santo António da Polana, que ficava ao lado do monumento. Depois fiquei esperto e passei a guardar o dinheiro para ir ao cinema no Scala no domingo e fazia uns cartões desenhados à mão usando lápis de cor, que a Mãe Melo muito apreciava, apesar de serem digamos que toscos.

Mas isto dos feriados nacionais portugueses tem o que se lhe diga.

Originalmente, não eram “feriados” como são considerados hoje. Por exemplo, o feriado de 1 de Dezembro era usado para a celebração de solenes missas, chamadas Te Deums. Só em meados do Século XIX é que começaram a ter um carácter mais histórico e laico.

E, no caso da chamada monarquia constitucional (1834-1910) os dias em que os reis nasceram, casaram e morreram eram feriados nacionais. E eles eram mais do que muitos.

Curiosamente, nessa altura, a data de 8 de Dezembro não era um feriado público, era uma data assinalada privadamente apenas pela Família Real portuguesa.

Com o golpe de Estado que aboliu a monarquia portuguesa, em 5 de outubro de 1910, a lista de feriados foi completamente alterada pelos radicais republicanos, ferozmente anti-clericais. Apenas uma semana depois do golpe, um decreto aboliu todos os dias santificados e estabeleceu apenas cinco feriados nacionais – laicos, claro – sendo eles o 1 de janeiro, 31 de janeiro, 5 de outubro, 1 de dezembro e 25 de dezembro. O 1 de janeiro passou a ser observado como o Dia da Fraternidade Universal em vez da Circuncisão do Senhor, o 25 de dezembro passou a ser o Dia da Família em vez do Natal (como aconteceu em Moçambique depois da instauração do comunismo da Frelimo). O 31 de janeiro era em homenagem à revolta republicana falhada de 31 de janeiro de 1891 no Porto, o 5 de outubro aos Heróis da República e o 1 de dezembro à Autonomia da Pátria Portuguesa.

Dois anos depois, adicionaram um feriado a 3 de Maio, evocando a descoberta do Brasil.

Só em 1929, já na Ditadura que antecedeu o Estado Novo, é que o dia 10 de Junho, então feriado municipal em Lisboa, evocando o poeta Luis de Camões (que terá falecido nesta data em 1579 ou 1580, parece que não se sabe), foi declarado feriado, chamada simplesmente “Festa Nacional”.

Salazar, que era católico e associava a nacionalidade ao catolicismo (um truismo) manteria a lista dos feriados nacionais assim até 1948, ano em que se passou a celebrar a data de 8 de dezembro, então chamado Dia da Consagração de Portugal à Imaculada Conceição.

Em 1952 foi publicada uma reforma abrangente do sistema de feriados português: dois feriados civis -31 de janeiro e 3 de maio — e um religioso – Quinta-Feira da Ascensão – foram extintos e em vez disso foram criados 3 feriados religiosos — Corpo de Deus, Assunção de Nossa Senhora (15 de agosto) e Todos-os-Santos (1 de novembro). Além disso, o feriado da Festa Nacional (10 de junho) passou a ser o Dia de Portugal (para além da Festa Nacional) ao qual Salazar, no decorrer da inauguração do Estádio Nacional do Jamor, em 10 de Junho de 1944 tinha acrescentado o epíteto de “dia da “Raça” e o 5 de outubro passou a estar consagrado à Implantação da República (e não aos Heróis da República). E os dias 1 de janeiro e 25 de dezembro voltaram oficialmente a ser feriados religiosos (Circuncisão e Natal, respectivamente). O feriado de 8 de dezembro também passou a ser chamado apenas o Dia da Imaculada Conceição.

Com o derrube do regime em 1974, adicionou-se o 1 de Maio, depois o 25 de Abril, a Terça-Feira de Carnaval, a Sexta-Feira Santa e um feriado da localidade. O 10 de junho passou a ser chamado como Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. E em 2003 o Domingo de Páscoa passou a ser feriado obrigatório (ou seja, quem trabalhar nesse dia, recebe mais 50 por cento do salário).

Em 2013, na sequência de uma – mais uma – falência das contas nacionais pelo PS, desta vez o famoso episódio do José Sócrates, o governo de Pedro Passos Coelho, sustentado pelo PSD e o CDS, para além de aumentar os impostos expressivamente e cortar nas despesas, eliminou “temporariamente” 4 feriados – que dois anos depois a Geringonça de António Costa (sustenada por uma maioria parlamentar composta pelo PS, comunas, Bloco da Esquerda e Partido dos Animais e da Natureza) alegremente restituiu. Eles eram o Corpo de Deus, Todos os Santos, 5 de Outubro e 1 de Dezembro.

Enfim. Com o milhão e meio de imigrantes que se prevê virão viver para Portugal nos próximos anos para complementar os que daqui se piram para melhores paragens – a actual tendência é virem brasileiros, indianos, paquistaneses, angolanos, nepaleses, chineses e afins (ou seja protestantes, islâmicos sunnis, budistas, judeus, sikhs, ismaelitas, etc, – até já há em Lisboa uma “catedral” da Cientologia ) quero ver onde é que vão parar estes feriados todos. Para já, andam muitos a comentar a nova simbologia da bandeira portuguesa, recentemente aprovada pelo governo do demissionário António Costa, cujo desenho foi especificamente concebido para ser mais “laico” e “inclusivo”. Pois claro.

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