THE DELAGOA BAY WORLD

10/05/2024

MENINA EM LOURENÇO MARQUES, INÍCIO DO SÉC XX

Foto dos estúdios dos Irmãos Joseph e Maurice Lazarus.

08/05/2024

A SÍNDROME ISABELLA

Filed under: A Síndrome de Isabela, Helena Cabeçadas — ABM @ 00:11

Nunca rigorosamente ouvi falar sobre ela até ontem, quando li o que se segue.

1.Daqui, li isto: Helena Cabeçadas nasceu em Lisboa, em 1947. O ambiente familiar tê-la-á influenciado politicamente, era sobrinha neta do Almirante Mendes Cabeçadas, o pai era um católico antissalazarista e vários familiares tinham atividade política. Depois de uma passagem por Moçambique, instala-se em Lisboa onde dá os primeiros passos na política ainda no liceu, o que lhe valeu ser vigiada pela PIDE desde os 12 anos. Aos 14 anos acompanha os acontecimentos da Crise Académica de 1962. No ano letivo 1962/63 aderiu à Comissão Pró-Associação dos Liceus e ao Partido Comunista Português (PCP). Depois de ter sido detida em 1965, ocasião em que foi interrogada pelo reitor da Universidade e enviada para o Governo Civil e a prisão de Caxias, é impedida de terminar o último ano do liceu e expulsa de todas as escolas do país. Foi assim obrigada a exilar-se aos 17 anos. Parte sozinha para a Bélgica, onde ficará dez anos, tendo continuado a participar na luta política antifascista e trabalhado com emigrantes portugueses. Aos 20 anos está em Paris onde vive intensamente os acontecimentos de Maio de 1968, ano em que se dá a rutura com o PCP.

Hum, passagem por Moçambique. Vamos lá ver.

2. Daqui, li isto: Nasci em Lisboa e vivi a minha infância no Bairro da Madre de Deus. Era um bairro social, daqueles mandados construir pelo Estado Novo no final dos anos trinta e que, em princípio, se destinava a realojar os pobrezinhos que se atascavam na lama dos bairros de lata circundantes. Só que depois, na realidade, estes bairros sociais acabavam por ser ocupados por residentes oriundos da pequena burguesia, na sua maioria funcionários públicos. Na escola primária que eu frequentava, o Ateneu da Madre de Deus, andavam também as garotas dos bairros de lata, eram nossas companheiras de carteira. Sujas, esfarrapadas e descalças, de uma extrema pobreza, fartavam-se de apanhar das professoras, pois eram más alunas e a maior parte desistia da escola. Assistir a esta realidade era muito chocante e creio que isso contribuiu, ainda que de forma difusa, para a minha tomada de consciência das desigualdades e injustiças sociais.

Dado que só tinha irmãs e a escola era só para meninas, já que os sexos estavam separados, acabei por passar a minha infância e adolescência num universo muito feminino.

O meu pai era engenheiro da Missão Geográfica de Moçambique e passava sempre seis meses em Lisboa, connosco, e os outros seis meses em Moçambique. Até que, tinha eu oitos anos [portanto, 1955], os meus pais decidiram que iríamos todos para Moçambique durante uns anos, até que a minha irmã mais velha tivesse idade para ir para a Faculdade. E assim embarcámos no navio “Pátria”, numa viagem longa de 20 dias, até Lourenço Marques (actual Maputo). Essa é uma memória muito forte que eu guardo.

Na altura eu tinha uma imagem muito idealizada de Moçambique, que nos era transmitida pelo meu pai, através das cartas, das fotografias e dos filmes que nos trazia – sobre animais selvagens, rios imensos, misteriosos rituais indígenas, pacíficas aldeias de palhotas, uma fauna e uma flora exóticas. A geografia de Moçambique era-me mais familiar, ou tão familiar, quanto a geografia de Portugal, mesmo sem lá ter ainda vivido, dado que o meu pai, quando estava em Lisboa, nos mostrava os mapas que construía e nós íamos seguindo atentamente os seus percursos no interior da colónia (“província ultramarina”, como então se dizia).

O confronto com a realidade, em Lourenço Marques, foi chocante: era violenta a segregação racial que existia naquela sociedade colonial dos anos cinquenta. Em Moçambique, a influência do apartheid da África do Sul era então muito forte. Lembro-me de letreiros a avisar “Entrada proibida a pretos e a cães”. E as senhoras brancas, quando se zangavam com os criados negros, levavam-nos à Administração para serem açoitados. Eu era ainda criança, mas quando ouvia estes conversas, no meio dos chás e dos bolinhos, ficava aflita. Também os meus pais ficavam consternados. O meu pai era um democrata e tinha com os trabalhadores africanos uma relação muito próxima, muito afectuosa. Como geógrafo, trabalhava nas zonas mais recônditas de Moçambique, nas zonas de fronteira, onde por vezes era o primeiro homem branco a aparecer. Os seus acompanhantes, cerca de uma centena de africanos por cada engenheiro, vinham todos os anos das aldeias onde viviam com as suas famílias, para trabalhar na Missão, permanecendo com eles durante longos meses, no mato. Guiavam os camiões e os jipes, ajudavam no transporte dos materiais necessários, dos instrumentos científicos, das armas para a caça e dos víveres indispensáveis à manutenção da expedição, ao longo dos meses que durava a campanha. Também ajudavam a montar e a desmontar as torres metálicas para as observações astronómicas e geodésicas, tal como a construir as pontes e as jangadas rudimentares, quando necessário. Assim, estabelecia-se entre eles uma profunda relação de interajuda e amizade.

O meu pai transmitia-nos essas realidades através dos filmes e das fotografias, pelos quais era apaixonado. Às vezes, nas férias, quando não estava muito longe de Lourenço Marques, nós íamos ter com ele ao acampamento e ficávamos lá no mato. Esse era o lado esplendoroso de África, que correspondia àquilo que eu tinha imaginado: os jacarés e os hipopótamos preguiçosos a refrescarem-se nos grandes rios, as zebras e as gazelas saltando à frente do nosso jipe, as girafas olhando-nos interrogativas, os búfalos pachorrentos, os lagartos e os pássaros de cores esplêndidas…uma natureza enigmática, sumptuosa!

Mas a vida na cidade, com a sua estrutura colonial rígida, era desagradável. Penso que as situações de racismo e de injustiça social flagrantes, que presenciei em Lourenço Marques, terão contribuído fortemente para a minha consciência política, apesar de eu ser ainda uma criança na altura.

Entretanto, morreu a minha irmã Guida com uma leucemia e acabámos por ficar menos tempo em Moçambique do que o planeado. A minha mãe ficou traumatizada com África e quis regressar a Portugal. Nessa altura, já eu estava no 1º ano do Liceu Salazar, em Lourenço Marques. Era um Liceu com um ensino relativamente aberto, onde as professoras eram simpáticas, próximas das alunas. Não era frequentado por negros, nem por mestiços, que eu me lembre. Mas era um ambiente alegre, arejado.

3. Para além de um percurso e carreira académica com alguma escrita pelo meio, uma simples pesquisa naquele motor de pesquisa Omnipotente, revela que a Helena faz questão de puxar os pergaminhos de uma teia complexa que inclui ser sobrinha neta do Cabeçadas, de ter sido criada num ambiente mais ou menos liberal em casa, que descambou para comunista e depois “anti-fascista”, tudo durante a vigência do Estado Novo, o que mais ou menos tem em comum com os 9.999.999 portugueses ao fim da manhã do dia 25 de Abril de 1974 (altura em que ela teria, feitas as contas, 27 anos de idade).

Mas o que me chamou a atenção foi aquela sensibilidade obviamente suspeitamente pré-pubescente, prescientemente pré-pós anti-colonial, de ela, com dez aninhos de idade ou afim, lembrar-se da injustiça social omnipresente e -especificamente -de ver letreiros (no plural) algures em Lourenço Marques com (cito) a avisar “Entrada proibida a pretos e a cães”.

The world in LM according to Lena.

Ai sim? Viu letreiros (repito, no plural) na Cidade de Lourenço Marques (cito novamente) a avisar “Entrada proibida a pretos e a cães”?

Onde, exactamente? gostava de saber. Pois apesar de supor que muitos eventualmente pensassem assim, nunca vi enquanto cresci na Cidade nos anos 60 e 70, quando as coisas estavam a mudar e eu andava ocupadíssimo com berlindes, os escudos na escola primária, carrinhos de rolamentos – e natação.

Crédulo, perguntei aos mais velhos.

Ninguém viu.

Após uma prova na piscina do Ferroviário em Lourenço Marques, 1974. Eu, o Rui Abreu (m. suicídio, 1982), o Jaime (m. suicídio, 2023), e o Filipe.

E diz a Lena que reparou ainda que no Liceu Salazar (penso que ela está a falar no Dona Ana da Costa Portugal – só pode) havia poucos estudantes de outras raças? mas, para além da óbvia discriminação que os compatriotas dela alegremente copiaram de todos os regimes similares e afins em África (de que a África do Sul era apenas o mais surreal) e aplicaram alegremente nas duas ou três cidadezinhas que Moçambique tinha, será que a Lena apercebeu-se que o Liceu ficava na parte mais branca do bairro mais branco da cidade mais branca e afim e na altura quase sem residentes de outras raças? o que é que ela queria, que se trouxessem estudantes negros da Mafalala para a Polana para ficar bem na fotografia? que fizessem mais liceus? pois recordo que pouco depois, ainda ela estava lá em LM, os colonialistas compatriotas dela, talvez já antecipando a crítica, fizeram o enorme Liceu António Ennes, no Alto-Maé, uma zona muitíssimo mais misturada social e racialmente, e o António Ennes (que frequentei um ano, apesar de viver na Polana) era assim mesmo – misturado. Não se lembra? Muitos moçambicanos negros em lugares de responsabilidade hoje em Moçambique estudaram no António Ennes. Nos anos 60, depois do Veiga Simão dar um murro na mesa, lá se fez a Universidade de Lourenço Marques. Antes, até o filho do colono, se quisesse um ensino superior ia para Pretória, Johannesburgo, Cidade do Cabo, Lisboa ou Londres.

Ou Bruxelas, suponho. Ou a Suíça, no caso da Teresa Simões (mais tarde, Heinz).

Mas a Lena já não viu isso, ou não se lembra.

O António Ennes.

O ponto da questão é que é muito, demasiadamente até, fácil, cinquenta anos depois da forma desastrosa como Moçambique caminhou e ascendeu para a sua independência, mandar papos “retro-progressistas” sobre Lourenço Marques- que é o que eu acho que são – para ficar bem na fotografia.

Estes dias, está na moda.

E apesar de eu cada vez ter menos saco para esta lamentação insípida sobre o colono e o que fez e não fez e como fez, parece que debaixo de cada pedra descubro sempre um (e ela era um) que não era racista, que era contra a ditadura, que era anti-salazarista, etc e tal.

É impressionante. Nem sei como o Eddy Mondlane (Pai) não viu isto quando escreveu naquele livro que os cubanos publicaram lá em Havana em 1971 a explicar, preto no branco (vide págs. 238 e 239) que os brancos em Moçambique eram todos uma cambada de racistas inveterados irrecuperáveis e que não havia mesmo nada a fazer – a não ser correr com eles, o que, aliás. resume muito bem o programa das actividades cívicas assim os Frelimos tiveram a chance em 74.

(na mesma passagem, algo tortuosamente, quiçá por atenção ao Marcelino, ao Eneas, ao Baltazar e a mais dois ou três, magnanimamente, e se calhar também por ele próprio ter filhos mulatos, Eddy exculpou todos os mulatos do pecado racialista, por isso mantenho as minhas expectativas de poder haver um presidente tipo Celso ou -why not – Ilundi – mas esperarei sentado).

Claro que aquilo tudo era uma porcaria e uma injustiça. Não estou aqui para debater isso. Eu se fosse “originário” (eufemismo corrente para “preto” em Moçambique) se calhar pegava fogo àquilo tudo duas vezes e penso que muitos pensaram fazer isso mas, generosamente, tiveram bom senso e esperaram.

Note-se: não era possível o que aconteceu, quando aconteceu e como aconteceu se não fosse assim. Não eram cem mil brancos em meia dúzia de sítios com fisgas e a ocasional pistola que seguravam oito milhões de pessoas. Mas era claro que tinha que acabar um dia, não distante, e – oh -acabou mesmo, e eu quando tinha 14 anos, que foi quando o Otelo (que era “originário” de Lourenço Marques) lá fez aquilo lá em Lisboa e que tanto animou a malta. Mas eu ainda estava lá a viver e já sabia que iria acabar. Até porque a guerra -uns 3 mil guerrilheiros com minas terrestres e AK’s bastou – nunca mais acabava e regime vigente não mudava de ideias e o mundo já dera três voltas. Era portanto por demais evidente e por si não era imprevisível.

A minha Mãe, uma açoreana ocupada a criar sete filhos que assistia à vida de uma distância apolítica mas vidente, resumiu tudo uma vez: “esta terra não é nossa”. À sua maneira, o Pai fazia a mesma leitura.

Ou seja: a vida em Moçambique era muito agradável para os brancos e tinha os dias contados.

No fim do dia aquilo não era mais que o que os portugueses (os de Portugal, os de Lisboa, o dos do Terreiro do Paço) e os outros faziam e fizeram em África, na Ásia, nas Américas e na Europa. Ainda hoje, grandes potências globais – a China, a Austrália, o Canadá, o Brasil, os EUA e a Rússia – têm extensos passados e presentes puramente coloniais. Só que lá as “elites colonas” (ou os seus descendentes) é que continuam a mandar e ninguém se atreve a meter-se com eles. Regra geral dão uns subsídios e uns terrenos aos “originários” alguns pedem “desculpa” e assunto arrumado. A China nem uma coisa nem outra: prende-os e mata-os, aparentemente.

E, de facto, a Rússia, que tem tanto terreno que não sabe o que fazer com ele, neste preciso momento está a tentar adquirir mais uma colónia, o Putin diz que aquilo afinal sempre fora dele, que faz-lhe falta para a sua geoestratégia. Os indígenas locais não concordam e resistem. Enfim, o problema habitual.

E mais colonialismos certamente surgirão, e mais resistência advirá. Faz parte do percurso dos habitantes deste desgraçado planeta, a girar perdido na imensidão infinita de um cosmos que cada vez mais ninguém percebe.

A ideia de que o menos que incipiente punhado de brancos em Moçambique é que criaram as colónias ou que mandavam nalguma coisa é quase alucinante. Tanto assim que quando quiseram largar as colónias, e os colonizados arranjaram quem patrocinasse a sua revolta, fizeram-no. E, ao contrário da Lena, que pelos vistos estava em Bruxelas (capital de um mais que infame ex-colonizador) a cultivar-se, espero, em agradável recato europeu, custeado pelos salários que a Missão Geográfica de Moçambique pagava ao Pai, eu (e mais umas centenas de milhares) estava lá na África que os Portugueses diziam que era deles quando isso tudo mudou e decidiram uma retirada rápida e em força, e portanto vi o filme todo a cores e em 3D. Foi horrível, mas catárquico, para todos excepto para as elites que imediatamente sucederam a ditadura colonial, de ambos os lados.

Mas quem só tem limões na vida aprende a fazer limonada. E a vida continua. Os portugueses têm a sua liberdade, uma vida nem boa nem má, antes pelo contrário, e maior parte dos moçambicanos, a maioria mal sobrevivendo, já está noutra há muito tempo. 90 por cento dos moçambicanos vivos hoje nasceram muito depois de 75. Quando muito, ouvem dos pais e pouco mais.

Não é que a Lena se distinga tanto nas suas memórias, como o fez descaradamente a Isabela, que tem andado a vender e a fazer render o peixe das suas crónicas, que têm estado na moda revancho-revivalisto-revisionista, especialmente lá no Brasil, onde passa a vida em colóquios para espicaçar as miríades formas em como os negros locais (que presumo todos descendentes de escravos trazidos de Moçambique e Angola) têm sido abusados desde os primeiros carregamentos de escravos para a…Ilha da Madeira. Ao contrário desta, a Lena teve um Pai de quem obviamente gostou e cujo trabalho apreciou. E isso faz a diferença pelo menos para quem lê. A Missão Geográfica de Moçambique, que obviamente é do que mais de “colonial” se pode arranjar, e que pelos vistos deu para manter a família dela e custear a sua educação belga, de facto fez um trabalho excelente e esse foi um preciocíssimo legado aos moçambicanos de hoje (basta ver o milando fronteirço entre o Malawi e a Tanzânia, que já quase descambou em guerra aberta, para se perceber), que não herdaram contendas, especialmente aquela lá no Lago Niassa. O Pai da Lena depreendo culto, sensato, sensível e percebia o que se passava à sua volta. E havia muitos assim. Conheci alguns.

Um destes agora custa 95 paus no OLX.

Portanto e resumindo só me fica atravessada aquela dos letreiros (no plural) em Lourenço Marques com (cito novamente) letreiros a avisar “Entrada proibida a pretos e a cães”.

Até pode ser verdade. Malucos há-os em toda a parte. Dizem que hoje mesmo existem pessoas em Portugal que pensam assim e procura-se uma cura, nem que seja por decreto.

No entanto, já vi este filme mais que uma vez, como em cima com a Isabelinha, que, quando ainda era gorda e feia (descrição dela), descreveu Lourenço Marques como um “vasto campo de concentração para os pretos”. E como a do (já o contei aqui) Joey Hanlon, um venerando académico inglês comuna que durante anos andou a fazer o frete à Frelimo em Maputo (agora, mais redimido, tem uma newsletter que se dedica a reportar as deliciosas e engenhosas mil maneiras como a Frelimo rouba as eleições todos desde 1994, incluindo a próxima, a do

El Chapo) depois da independência e que, uma vez, num artigo a propósito de nada, afirmou que o desgraçado do dono do então futuro Hotel 4 Estações (já demolido), antes de escapar depenado da Libertação em 75, talvez, putativamente, raivoso pelo fim do colonialismo, tinha mandado encher os canos de água do seu edifício com cimento, para lixar quem viesse a seguir. Como se tal fosse possível. Só quem não estava em Maputo quando a Frelimo tomou conta daquilo é que pode dizer estas coisas. Quando um dia o interpelei directamente sobre isso (“mas tu viste isso?” o homem disse-te?”, “tens fotos?”, “qual é a tua fonte?”) limitou-se a dizer “bem, era o que se dizia em Maputo”.

O 4 Estações, inacabado. Demolido há uns anos, no seu lugar, agora está a nova embaixada norte- americana.

Ah bom, pois. Claro.

Se era o que se dizia em Maputo, então é porque era verdade.

Só pode.

02/05/2024

MULHER MOÇAMBICANA, LITOGRAFIA DE MALANGATANA, 1983

À venda por 250 euros, AQUI.

Em 1983, Moçambique estava a entrar em plena Era do Repolho e do Carapau e o próprio Malangatana passava por um mau bocado.

Litografia de Malangatana, “Mulher Moçambicana”, 1983.

01/05/2024

O 5º ANIVERSÁRIO DA INAUGURAÇÃO DO SCALA EM LOURENÇO MARQUES, 1936

Imagens retocadas.

Anúncio do Scala de Lourenço Marques, cerca de 1936, na altura da celebração do 5º aniversário da sua inauguração. A sala foi inaugurada no dia 13 de Junho de 1931 e tinha uma capacidade de 1300 lugares, sendo os proprietários então a incontornável Delagoa Bay Investiment Company (que posteriormente vendeu o imóvel à sul-africana Kinekor Theatres uma subsidiária detida a 100% pelo Grupo Primedia, que creio que ainda hoje opera sob o nome Ster-Kinekor e tinha, entre 54 outros, um cinema no Eastgate Shopping Centre em Johannesburgo). Penso que o Scala depois passou para as mãos de um nacional moçambicano que deve estar a fazer o jogo de eventualmente demolir aquilo e vender o terreno a um turco e assim ganhar uma pipa de massa. Sobre o filme em cartaz, em inglês The Informer, que era excepcional, ver mais em baixo.
Bilhete do Cinema Scala, anos 70.

A Wikipédia descreve assim o filme The Informer (1935):

The Informer is a 1935 American drama thriller film directed and produced by John Ford, adapted by Dudley Nichols from the 1925 novel of the same title by Irish novelist Liam O’Flaherty. Set in 1922, the plot concerns the underside of the Irish War of Independence and centers on a disgraced Republican man, played by Victor McLaglen, who anonymously informs on his former comrades and spirals into guilt as his treachery becomes known. Heather Angel, Preston Foster, Margot Grahame, Wallace Ford, Una O’Connor and J. M. Kerrigan co-star. The novel had previously been adapted for a British film of the same name in 1929.

Along with Mutiny on the Bounty, The Informer was a big contender at the 8th Academy Awards, competing directly in all six categories they were nominated for (though Mutiny got eight nominations in total, given its three Best Actor nominations). The Informer won four Oscars: Best Director for Ford, Best Actor for McLaglen, Best Writing Screenplay for Nichols, and Best Score for Max Steiner.

In 2018, the film was selected for preservation in the United States National Film Registry by the Library of Congress as being “culturally, historically, or aesthetically significant”.

O filme tinha a particularidade de nela participar a actriz Margot Grahame, (1911-1982) que cresceu e começou a sua carreira artística em Pretória, na África do Sul.

Margot Grahame.

30/04/2024

OS ARTIFACTOS NA SÉ CATEDRAL DE LOURENÇO MARQUES

Imagens retocadas.

Parte do interior da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, padroeira da capital de Moçambique (e de Portugal). Por detrás do altar-mor, está sepultado D. Teodósio Clemente de Gouveia, na altura Cardeal e Arcebispo de Lourenço Marques.
Artigo detalhando as obras de arte presentes na Sé Catedral, inaugurada em 14 de Agosto de 1944 (Dia da Assunção de Nossa Senhora, penso que ainda feriado nacional em Portugal), em plena II Guerra Mundial. O percurso, por exemplo, dos vitrais da ábside e das janelas posteriores, feitos na Holanda numa Europa ocupada pelos Nazis e trazida de barco para Lourenço Marques, foi quase alucinante.
A Sé Catedral não foi a primeira igreja em Lourenço Marques. A primeira foi a também chamada Igreja de Nossa Senhora da Conceição, que se pode ver num postal de AW Bayly, também chamada Igreja Paroquial, edificada em meados da década de 1880 (mais ou menos a mesma altura em que foi edificada a Mesquita da Baixa) e que existiu onde hoje está a monumental sede do Rádio Clube de Moçambique (aka Rádio Moçambique). Foi demolida enquanto a Sé Catedral estava a ser construída. Gerações de habitantes da Cidade foram baptizados, casados e homenageados na morte nesse local, sendo os seus registos transferidos para a nova estrutura.

04/04/2024

A BANDA ROSIE & RALPH AND THE SCARECROWS EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Filed under: Banda Musical Rosie and Ralph — ABM @ 14:08

Imagem retocada e colorida.

No final dos anos 60, assisti numa festa de fim do ano no Grupo Desportivo a esta banda, que tocou toda a noite e em que ficou inesquecível a sua interpretação da música The Age of Aquarius, criada pela banda norte-americana The 5th Dimension.

Rosy & Ralph e The Scarecrows, foto tirada no no palco do Dancing Aquário na Rua Araújo em Lourenço Marques, no final dos anos 1960. Da esquerda para a direita: Maurílio, Amaro, Rosy, Rui, Ralph e António Pedro Rocha. (fonte: Onda Pop)

MADALENA IGLÉSIAS EM LOURENÇO MARQUES, 1964

Imagens retocadas e coloridas.

Madalena Lucília Iglésias do Vale de Oliveira Portugal (Lisboa, 24 de outubro de 1939 – Barcelona, 16 de janeiro de 2018), foi uma cantora portuguesa. Venceu o Festival RTP da Canção de 1966 com “Ele e Ela”. A par de Simone de Oliveira, tornou-se numa das vozes mais importantes do chamado nacional-cançonetismo que dominou em Portugal na década de 1960.

1 de 2. Bony, Corte, Madalena Iglésias, Eduardo Pereira, Renato Silva e Fausto, em Lourenço Marques, 1964. Eles eram membros da Banda Renato Silva, de origem goesa (que incluía Sita Fernandes como vocalista, mulher de Renato) e de Lourenço Marques, e que colaboraram no Teatro Manuel Rodrigues numa exibição da artista portuguesa.
2 de 2. Madalena Iglésias.

ANÚNCIO DA SIMAL EM LOURENÇO MARQUES, 1965

Imagem retocada.

Anúncio da SIMAL, 1965.

02/04/2024

O CONJUNTO DJAMBO EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Filed under: Banda Musical Djambo — ABM @ 13:31

Imagem colorida e retocada.

Os Djambo tocando em Lourenço Marques. Membros incluem Raimundo Brugue Tiago Moisés Hansane e Domingos Mabombo.
A mesma imagem, indexada. Se o Exmo. Leitor souber quem é quem, por favor envie uma nota para aqui.
O Clássico Elisa Gomara saia

O CONJUNTO NIGHT STARS EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Filed under: Banda Musical os Night Stars — ABM @ 12:55

Imagem colorida e retocada.

Os Night Stars. Da esquerda: 1-?, 2-?, 3-?, 4-? e 5-? Se o Exmo. Leitor conhecer os nomes dos membros, por favor envie uma nota para aqui.

31/03/2024

TURMA DA ESCOLA PRIMÁRIA REBELO DA SILVA EM LOURENÇO MARQUES, 1970

Imagem retocada e colorida, encontrada pela Suzana Abreu Barros durante umas limpezas na arrecadação.

A minha turma na Escola Primária Rebelo da Silva (actualmente, 4 de Fevereiro), cerca de 1970.
A mesma imagem, indexada, em que: 10- Professor Feliciano Lobo; 15- eu; 18- José Manuel Abreu; 19- Mário João Baptista (NMG); 25- Diogo Cabrita. Se o Exmo. Leitor conhecer mais nomes, por favor envie uma nota para aqui.

A BANDA ATLAS EM LOURENÇO MARQUES, 1967

Imagem retocada e agora colorida. Quem está a cantar é o Grande Aurélio Le Bon.

Os Atlas, durante uma exibição na Associação Africana, 1967. Viola baixo – Humberto Coimbra; Guitarra solo . Tony Martins; Baterista – Álvaro Coimbra; Outro guitarrista – Faruk; Vocalista – Aurélio Le Bon.

26/03/2024

A BAIXA DE LOURENÇO MARQUES INUNDADA, 5 DE FEVEREIRO DE 1907

Imagem de Joseph e Maurice Lazarus, retocada e colorida.

Inundação da Baixa de Lourenço Marques, 5 de Fevereiro de 1907. A Avenida Dom Carlos (depois da República e hoje a 25 de Setembro) na esquina entre o Scala e o Continental (que então não existiam). Atrás os Avenida Buildings. De todos os erros cometidos a construir a Cidade a partir da ilha original, este foi o maior: quando fizeram os aterros ligando a ilha à parte continental, o nível da Avenida ficou situado abaixo do nível da antiga ilha, sem nunca ter sido concebida uma forma de fazer escoar para a baía a água que ali se acumula e que escorre de toda a encosta desde o Alto Maé à parte central.

Uns meses depois de tirada esta fotografia, a Cidade receberia em apoteose o herdeiro da Coroa Portuguesa, D. Luis Filipe de Orléàns e Bragança. E em seguida os Irmãos Lazarus mudar-se-iam para abrir uma loja de fotografia em Lisboa, a Photographia Ingleza, onde faleceriam no princípio da década de 1940.

VASCO ABREU NO CLUBE NAVAL, ANOS 30 e 40

Filed under: LM Clube Naval, Vasco Abreu — ABM @ 17:28

Imagens retocadas, gentilmente cedidas por Suzana Abreu Barros.

Vasco Abreu fez parte de uma família que foi viver para Moçambique no início do Século XX. Nasceu em Lourenço Marques em 25 de Julho de 1924. Foi mais conhecido por ter sido piloto comandante da DETA (entre 1945 e 1980) e Pai da nadadora Suzana Abreu e seus irmãos Vasco, Rui e José Manuel. Dois dos seus irmãos, Jorge e João, eram conhecidos empresários de Moçambique.

Capa
Interior do BI de filho de Sócio Nº10, dando-lhe o estatuto de marinheiro.
Grupo de convivas no Clube Naval da Polana, primeira metade da década de 1930. O jovem Vasco de Abreu está sentado na fila da frente, terceiro a contar da direta, descalço e com camisa branca.

23/03/2024

TURMA DA ESCOLA RAINHA SANTA ISABEL EM LOURENÇO MARQUES, JUNHO DE 1961

Imagem gentilmente cedida por Suzana Abreu Barros. A Escola Rainha Santa Isabel ficava ao lado da Escola Rebelo da Silva (actual 3 de Fevereiro) na Avenida Pinheiro Chagas (hoje Dr Eduardo Mondlane) na Polana.

Turma da Escola Primária Rainha Santa Isabel em Lourenço Marques, Junho de 1961.
A mesma imagem, indexada. Em que: 1-?, 2-?, 3-?, 4- Professora Adelaide; 5-?, 6-?; 7-?; 8-?; 9-?; 10-?; 11-?, 12-?, 13-?, 14-?, 15-?, 16-?, 17-? 18-?, 19.?. 20-Suzana Abreu; 21-?; e 22-?
Verso da fotografia com alguns nomes. Se o Exmo. Leitor souber quem é quem, por favor envie uma nota para aqui.

09/03/2024

LEONTINA

Filed under: Leontina Botelho de Melo — ABM @ 16:05

Imagens retocadas.

Antes de ontem fez 98 anos que a minha Mãe nasceu em Ponta Delgada, na ilha açoreana de São Miguel. Ela viria a ter oito filhos: dois nos Açores, três em Macau e três em Moçambique (eu o sétimo, nascido na esplêndida Lourenço Marques), sempre a reboque das decisões espúrias do meu Pai e das circunstâncias de um mundo em turbulência. Para assinalar a data, a minha Irmã Lelé enviou-me um poema que ela escreveu, e que mostro em baixo. Só quase no fim da sua longa vida (ela faleceu a 28 de Janeiro de 2005 nos Estados Unidos da América) é que eu soube que ela escrevia poemas, à mão, de uma assentada, que guardava numa caixa sem mostrar a ninguém.

Sinceramente, não sei como é que ela, numa vida que se revelou um turbilhão que incluiu recomeçar tudo literalmente do zero aos 50 anos, foi capaz de enfrentar os desafios que teve e ainda assim manter a serenidade, o discernimento e a perspectiva. E uma classe à prova de bala. É das muito poucas pessoas na vida por quem eu sentia respeito inquestionável e um afecto e uma cumplicidade ímpar, que dispensava palavras.

E só queria dizer que sinto uma imensa falta dela.

A minha Mãe, num parque público em Macau, pouco depois de se juntar ao Pai Melo, para onde ele foi prestar serviço militar, início da década de 1950. Em frente a ela, a minha irmã Lelé.
O poema escrito pela minha Mãe que a minha Irmã me mandou há dois dias.

25/02/2024

O KIOSK ORIENTAL EM LOURENÇO MARQUES, INÍCIO DO SÉC. XX

Imagem retocada e colorida por mim.

Os Kiosks na Praça Mouzinho de Albuquerque (depois 7 de Março e hoje 25 de Junho) foram um marco da Cidade até ao início da década de 1940, quando a Praça foi completamente refeita.

O Kiosk Oriental. Na altura a Praça estava “cortada” ao meio por uma estrada que era efectivamente um prolongamento da Rua Araújo (hoje de Bagamoyo) e este kiosk estava situado nesse prolongamento, do lado nascente.

13/02/2024

CENTRO RETRANSMISSOR DO RÁDIO CLUBE DE MOÇAMBIQUE NA MATOLA, ANOS 60

Imagem retocada.

A fachada do Centro Retransmissor do Rádio Clube de Moçambique na Matola, anos 60. À volta, estavam as antenas de emissão em ondas médias e curtas.

O MAGAZINE LM EM LOURENÇO MARQUES, 1968

Imagens retocadas e coloridas.

Capa do Nº1 do Magazine LM, Julho de 1968, com uma foto de Baltazar Rebelo de Sousa, na altura um quase completo desconhecido que acabava de ser nomeado por Salazar Governador-Geral da Província.
Ficha técnica da revista – incluindo o “visado pela Censura”. Acho que o Carlos Alberto é o lendário fotógrafo mas ainda não consegui confirmar. O Jorge Rino também ainda não consegui apurar quem era.

19/01/2024

ROMÃO FÉLIX CELEBRA 88º ANIVERSÁRIO

Filed under: Romão Félix - Parafuso — ABM @ 15:36

Imagem retocada.

Romão Félix, relacionado com a figura de Parafuso, nasceu em 20 de Janeiro de 1936. Vive na zona de Tavira.

16/01/2024

A PRAÇA MOUZINHO DE ALBUQUERQUE E A AVENIDA DOM LUIS I EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Imagem retocada.

Vista parcial da Praça Mouzinho de Albuquerque (hoje, Praça da Independência) e da Avenida Dom Luis I (actual Av. Marechal Samora Machel). À direita, o Prédio do Montepio (ou da TAP).

06/01/2024

A BOATE DO HOTEL POLANA EM LOURENÇO MARQUES, ANOS 60

Imagem retocada.

O interior da boate do Hotel Polana em Lourenço Marques, anos 60.

03/01/2024

A FEITORIA HOLANDESA EM LOURENÇO MARQUES, 1721-1730

Imagens retocadas.

É quase uma nota de rodapé no longo percurso da Baía que culminou na sua margem Norte se tornar na Capital de Moçambique. Digo nota de rodapé porque daí nada resultou, ao contrário das iniciativas (1777-1781) de Guilherme Bolts, que ao colocar feitorias na Inhaca e na Catembe, provocou uma reacção portuguesa – a de as desactivar e de erguer um forte e feitoria permanente no que é hoje o local da “fortaleza” na Baixa da Cidade, em 1782.

A ideia de criar uma feitoria holandesa em Lourenço Marques obviamente deve ter parecido boa para os agentes da Vereenigde Oost-Indische Compagnie, ou VOC, originalmente uma empresa majestática de direito privado holandês (ou seja, tinha investidores privados, alguns dos quais judeus de ascendência portuguesa, no que foi a primeira a existir no mundo) criada em Março de 1602 para explorar o comércio internacional, e que tinha uma das suas principais bases de actuação no que é hoje a Cidade do Cabo.

A feitoria duraria cerca de nove anos, após o que foi abandonada.

A feitoria da VOC na margem Norte da Baía de Lourenço Marques, desenho de Jacob de Bucquoy (1693–1772).
A localização da Feitoria da VOC na margem Norte da Baía.

Seria interessante, do ponto de vista histórico e arqueológico (e turístico), identificar o que resta destas construções no que é hoje a Cidade de Maputo. Só que a zona onde a feitoria foi edificada foi significativamente alterada pelos Aterros da Maxaquene, efectuados no final da década de 1910. Pode ainda lá estar alguma coisa pois os aterros tinham uma quota de uns seis metros em relação ao nível da água do mar, o que significa que, em princípio, as fundações desta feitoria terão ficado soterradas. E segundo uma nota do grande Alfredo Pereira de Lima, elas devem estar localizadas aproximadamente em frente ao antigo campo de futebol do Grupo Desportivo.

A enseada da Maxaquene em 1891, com uma estimativa (A) da localização da antiga feitoria holandesa.
A enseada da Maxaquene, antes dos aterros feitos a partir do final da década de 1910, com uma estimativa (A) da localização das ruínas da antiga feitoria da VOC.
A mesma zona após a conclusão dos aterros, meados dos anos 1920. Ao fundo, um armazém e a Capitania do Porto, que ainda existem junto ao Maputo Shopping Centre do Sr. Bachir.
Lourenço Marques na segunda metade da década de 1950. A parte verde corresponde ao Aterro da Maxaquene, e ali é assinalado (A) o local aproximado da antiga Feitoria da VOC, segundo Pereira de Lima.

Este poderia ser um projecto arqueológico interessante. Infelizmente, não sei quase nada sobre o que andam a fazer os arqueologistas moçambicanos estes dias. Mas, se existirem, eu pedia um subsídio à Holanda para pelo menos investigar.

Pois isto é História.

01/01/2024

1 DE JANEIRO DO ANNO DE 2024

Imagem retocada.

Desejo aos Exmos. Leitores um bom ano.

Capa de folheto promocional de Lourenço Marques, década de 1930, mostrando parte da Praça 7 de Março (actualmente, 25 de Junho).

31/12/2023

O DIA EM QUE O MUNDO CONHECEU EUSÉBIO, 19 DE JULHO DE 1966

Imagens retocadas.

O jogo aconteceu ao fim do dia 19 de Julho de 1966 (uma terça-feira) no venerando Estádio Goodison, desde 1892 a casa do clube Everton, situado nos arredores da relativamente proletária cidade britânica de Liverpool, durante o Campeonato do Mundo de Futebol de 1966, em que se disputava a Taça Jules Rimet, de ouro maciço.

De entre as 32 equipas presentes para a competição naquele ano de 1966, figuravam Portugal e a Coreia do Norte.

A equipa de Portugal, com uma expressiva costela moçambicana, no Mundial de 1966.
A equipa da Coreia do Norte, 1966.

A Coreia do Norte surge de forma rocambolesca no campeonato, uma mistura de sorte, talento e muita política. A sua mera presença no Reino Unido foi uma aventura. O Reino Unido não reconhecia nem tinha relações diplomáticas com o então já estado pária.

Por sua vez, Portugal vivia os últimos anos da ditadura de partido único de Salazar e já alimentava uma guerrilha nacionalista na Guiné, em Angola e no Norte de Moçambique.

Em 12 de Julho, em Ayresome Park, a Coreia do Norte joga pela primeira vez no Grupo 4, contra a União Soviética, e vence por 3-0.

O segundo jogo foi contra o Chile. O resultado foi 1-1.

O jogo seguinte foi épico para o Norte-Coreanos. Foi contra a Itália, um potentado, que, desgraçadamente, tinham perdido contra a União Soviética mas vencido o Chile.

A Coreia do Norte vence os Italianos com um excepcional golo de Pak Doo-Ik e qualifica-se para os oitavos de final.

Nesses oitavos de final, a ser disputado no dia 19 em Goodison Park, defrontariam a equipa de Portugal, onde Eusébio, Torres e Coluna pontuavam. Por um lado, havia uma expactativa de que Portugal não poderia perder, especialmente conhecida a actuação prévia dos norte-coreanos.

Por outro lado, a actuação dos asiáticos fora excepcional. Nesse jogo, a audiência estava totalmente expectante do que iria acontecer.

Entre a audiência, solitário, estava um açoreano que adorava futebol e que deixara a família em Lourenço Marques (mulher e sete filhos) por um mês, para ver o campeonato: o meu Pai.

Bilhete de entrada para o jogo dos Oitavos de Final do Campeonato do Mundo de Futebol, 19 de Julho de 1966.

O jogo ficará para a História. Os Coreanos marcaram, sem resposta portuguesa, nos minutos 1, 22 e 24 . O guarda-redes era Alberto da Costa Pereira, nascido em Nacala e que viera do Belenenses.

Ao intervalo, todos em choque, o resultado era 3-0 em favor da Coreia do Norte.

A segunda parte foi a entronização do avançado, Eusébio, que tomou conta do jogo e marca quatro golos em menos que meia-hora, incluindo dois penalties. O marcador foi fechado no fim de segunda parte com um quinto golo marcado por José Augusto.

Resultado: 5-3, vitória de Portugal.

Após este jogo, Portugal perderia nas Meias-Finais contra a Inglaterra (que venceria o Campeonato) e a equipa da Coreia do Norte regressou ao seu país, primeiro recebidos como heróis mas depois mal tratados pelo regime, alguns acabando em campos de trabalhos forçados. Com o passar das décadas, alguns foram reabilitados e em 2002, a convite dos britânicos, os membros da equipa foram recebidos no Reino Unido com simpatia e admiração em 2002.

Até esta data, este foi o melhor desempenho de uma equipa de futebol portuguesa num campeonato mundial.

Para Eusébio, foi a apoteose.

Eusébio dá uma breve entrevista ao sair do túnel, 1966.
Uma cópia do Morning Telegraph de Sheffield, edição de 20 de Julho de 1966, com um autógrafo de Eusébio, inscrito sobre uma fotografia de um dos seus golos contra a Coreia do Norte no dia anterior.

Eusébio ficaria para sempre no coração dos portugueses, que o “adoptaram” ainda que mantendo a sua identidade moçambicana. Após falecer em 5 de Janeiro de 2014, o seu corpo foi colocado no Panteão Nacional em Lisboa. Uma estátua em sua homenagem é local de romaria junto do Estádio do Benfica em Lisboa. Não sendo abertamente hostil, o regime moçambicano instaurado em Setembro de 1974 nunca conviveria facilmente com o seu legado, ainda que tenha tratado o Sr. Mário Coluna (que voltaria para Moçambique) com respeito, sendo que a ambos confiscaram imóveis seus, comprados com os seus ganhos, que nunca devolveriam, “para não abrir precedentes”. Pois, como eu entendo.

Desejo aos Exmos Leitores que têm acompanhado este blog um 2024 sem incidentes. Conto continuar a estar por aqui.

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