THE DELAGOA BAY WORLD

11/08/2022

NELSON SAÚTE ASSINALA RUI KNOPFLY E A SUA OBRA LITERÁRIA NO SEU 90º ANIVERSÁRIO

Imagem retocada. Este sublime, invulgar texto de Nelson Saúte foi publicado em 11 de Agosto de 2022 na Carta de Moçambique. Assinala o 90º aniversário natalício de Rui Knopfly, ocorrido ontem. Reproduzo com vénia.

Rui em Lourenço Marques, 1962.

Rui Knopfli, nascido em Inhambane, a 10 de Agosto de 1932, faria hoje 90 anos. Um acaso está na origem da minha descoberta juvenil de o “Reino Submarino”, publicado em 1962. Esse encontro desencadeou um tumulto, difícil de descrever, em mim. Aquele tom estava fora do tom. Aquela poesia parecia estranha. Aquelas imagens, aquela sonoridade, aquelas metáforas. Aquele poder discursivo, barroco, torrencial por vezes, alegórico. Sempre cativante, sedutor e encantatório. Quase sempre pungente, língua dilacerada e dilacerante. Voz dos eleitos. Oriundo de uma educação literária onde avultava a poesia engajada e revolucionária, no lídimo contexto de afirmação de um novo país, desconhecia este poeta tão impressivo. Aliás, havia um ensurdecedor silêncio à sua volta.

Não se falava à época, meados dos anos 80, de Rui Knopfli. Nascera em Inhambane. Filho de um funcionário da Administração, a sua família vivia, nos anos 30, em Vilanculos. A mãe foi tê-lo a Inhambane onde estavam asseguradas condições de assistência médica mínimas. O poeta só aos 20 anos irá conhecer a cidade que lhe dá naturalidade. Viverá na Moamba, na Namaacha, em Magude. Curiosamente, Magude tem uma importância capital sob o ponto de vista literário. Foi lá, aos 15 anos, que começou a ler livros emprestados. Estava-se nos finais dos anos 40.

No final da juventude e já na capital teve encontros decisivos: Fonseca Amaral e João Mendes – os mentores da sua geração – José Craveirinha, Noémia de Sousa, Rui Nogar ou Ricardo Rangel. Em casa da Noémia, a pretexto de ouvir o mítico Daíco, empreendem conversas subversivas. Não estavam isentos da perseguição política. Aquando das eleições de 1949 e da candidatura desafiante de Norton de Matos (que concitou tantos jovens africanos em Moçambique e em outros países) colam cartazes, promovem reuniões, conspiram. Alguns são presos, interrogados e mesmo espancados. Aníbal Aleluia é violentamente sovado. Rangel e Noémia não são isentos da bordoada pidesca. Knopfli, por conta da raça, é humilhado verbalmente. Era branco e a PIDE tinha critérios epidérmicos no seu acto incriminatório. Mais tarde, em 1952, foi parar aos calaboiços por um dia. Tinham importado livros inobedientes.

Em 1959 publica, aos 27 anos, o seu primeiro livro. Alguns companheiros de juventude tinham emigrado ou se exilado noutras latitudes. Rui terá, no entanto, uma passagem por Joanesburgo onde estuda e escreve alguma poesia em inglês. Aliás, no seu livro de estreia essa influência anglo-saxónica já é visível: “Velho poema da cidade do ouro”. Mais tarde ver-se-á ampliada. Sobretudo no seu encontro com T.S. Eliot, que traduz e glosa. Mas é a evocação da sua cidade, do seu tempo de infância, “da sociologia de esquinas”, dos jogos “pueris de sexo”, mas também a consciência de um lugar e de um tempo em tumulto, em transição, em transformação. O título do livro é uma provocação ou, se quisermos, o assumir dessa consciência de um tempo que mudaria, inexoravelmente: “O País dos Outros”.

Como disse, intentei o seu conhecimento através de “Reino Submarino” (1962). Os poemas elegíacos foram aqueles que mais me impressionaram: “A Menina do Retrato”, “Encontro”, “Monólogo”, sobretudo “A Uma Criança Longe”: “Escrevo-te estas palavras/ sabendo que as não lerás” ou ainda: “A morte é isso, é acabar/ simplesmente, não acontecer mais.” Este é um dos poemas que mais remotamente recordo, um poema dolorosamente biográfico.

Rui Knopfli: “Nada me auxiliam as lágrimas/ que me salgam a face/ e o muito que tenho blasfemado/ de borco, rente ao teu silêncio gelado. / Esta a lógica prosaica dos factos: / Continuamos a viver, dolorida/ a consciência/ da tua cada vez maior ausência. / E teu pequeno corpo moreno, / que nem todo o meu amor aquece, / é um palmo de ternura/ que apodrece.”

Este livro dedicado à memória da filha é atravessado por esse tom pungente de versos elegíacos. O poema “Pequena Elegia” termina com estes versos que nunca me esqueci: “Inteira, a tua morte/ viaja dentro de mim.” O livro tem outras elegias, como aquela dedicada ao poeta Reinaldo Ferreira, que morreu em 1959: “O que na vida repartiu seu poema/ por alados guardanapos de papel, / o criador de sonhos logo perdidos/ na berma dos caminhos, / o mago que pressentia o segredo/ da beleza perene”. Este ano, pleno de efemérides literárias, foi também o ano do centenário de Reinaldo.

Deste livro destaco ainda o poema “Adeus Xico”, uma dolorida memória da juventude, poema que eu declamei inúmeras vezes. O poema é uma longa homenagem a um companheiro da juventude morto aos trinta anos. Ainda hoje quando recordo este texto oiço os acordes da “Patética” que o poeta cita profusamente neste texto. Seria, porém, “Winds of change” e “Velho Colono”, dois dos mais reveladores poemas deste impressivo “Reino Submarino”, que me acompanhariam, mais frequentemente, ao longo destas quatro décadas de convívio apertado com a poesia de Rui Knopfli.

Rui Knopfli: “Sentado no banco cinzento/ entre as alamedas sombreadas do parque. / Ali sentado só, àquela hora da tardinha, / ele e o tempo. O passado certamente, / que o futuro causa arrepios de inquietação. / Pois se tem o ar de ser e o passado, / os dois ali sentados no banco de cimento. // Há pássaros chilreando no arvoredo, / certamente. E, nas sombras mais densas/ e frescas, namorados que se beijam/ e se acariciam febrilmente. E crianças/ rolando na relva e rindo tontamente. // Em redor há todo o mundo e a vida. / Ali, está ele, ele e o passado, / sentados os dois no banco de frio cimento. / Ele, a sombra e a névoa do olhar. / Ele, a bronquite e o latejar cansado/ das artérias. Em volta os beijos húmidos, / as frescas gargalhadas, tintas de outono/ próximo na folhagem e o tempo. // O tempo que cada qual, a seu modo, / vai aproveitando.”

Citei o poema na íntegra. Aqui está já o grande poeta que se iria revelar, na plenitude, no livro “Mangas Verdes com Sal” (1969), depois de “Máquina de Areia” (1964). Apetecia-me citar na íntegra também o “Winds of change”. Li-o até à exaustão. Há outros poemas extraordinários neste livro. Como “Fim de tarde no café”. Como tantos outros. Não há aqui espaço para os acolher. A segunda obra de Rui Knopfli que eu li foi esse inigualável “Mangas Verdes com Sal”, o livro da sua completude. Tinha um sulfuroso prefácio do Eugénio Lisboa. Recordo-me de poemas e versos que me ficariam para sempre na memória. Do poema “Não obstante”: “nunca escrevi versos que não fossem de amor”. Ou “o meu Paris é Joanesburgo”, do poema “A Paris”. O poema aforístico “Progresso”: “Estamos nus como os gregos na Acrópole/ e o sol que nos mira também os fitou. / Mas fazemos amor de relógio no pulso”. Livro sardónico, como sempre, pungente, dolorido, profundo. Ali se amplia o estro que fala do seu quotidiano, do seu profundo humanismo. Ali está o poeta erudito e, sobretudo, a mestria do seu labor limae. O seu depurado labor oficinal.

Durante anos impressionou-me o poema “Aparição”, li e reli “Hackensack”, que cito no frontispício do “Maputo Blues” e como o título revela é uma referência a Thelonious Monk. Citei abundantemente o poema “Velasquez”: “Só de perto te apercebemos: é de baixo/ que os gigantes te miram”, li e reli “A Descoberta da Rosa”, declamei “Mangas Verdes com Sal”, glosei “Lembranças do futuro”: “só os poetas têm lembranças do futuro”, comovi-me com “Praça Sete de Março”, exultei com “Disparates seus no Índico”, pilhei versos como em “Contrição” ou consignei ao futuro a minha escolha da melhor poesia moçambicana do século XX o título “Nunca Mais é Sábado”.

A mitologia da Ilha como tema central da poesia moçambicana devemo-lo a Rui Knopfli e ao seu roteiro belíssimo sobre a “A Ilha de Próspero” (1972): “Ilha, velha ilha, metal remanchado, / minha paixão adolescente, / que doloridas lembranças do tempo/ em que, do alto do minarete, / Alá – o grande saca! – sorria/ aos tímidos versos bem comportados/ que eu te fazia”. Este livro é notável, uma alquimia perfeita entre texto e imagem, com fotografias belíssimas do poeta e fotógrafo. O livro tem uma origem remota – o poema “Ilha Dourada” -, que vem no seu livro de estreia O País dos Outros.

Rui Knopfli: “A fortaleza mergulha no mar/ os cansados flancos/ e sonha com impossíveis/ naves moiras. /Tudo mais são ruas prisioneiras/ e casas velhas a mirar o tédio. / As gentes calam na / voz/ uma vontade antiga de lágrimas/ e um riquexó de sono/ desce a Travessa da Amizade. / Em pleno dia claro/ vejo-te adormecer na distância, / Ilha de Moçambique, / e faço-te estes versos/ de sal e esquecimento”.

Se “Mangas Verdes com Sal” era, indubitavelmente, o seu alto canto, a plenitude, a maturidade, “O Escriba Acocorado” (1978), publicado depois de o poeta abandonar “a capital da memória”, coagido pelos ventos da História, seria aquele que haveria de me parecer o seu livro mais conseguido. Aliás, tanto este titulo, como “Máquina de Areia”, “A Ilha de Próspero”, ou, mais tarde, “O Corpo de Atena (1984) são poemas únicos em vários cantos.

Rui Knopfli: “Servidor incorruptível da verdade e da memória, / escrevo sentado e obscuro palavras terríveis/ de ignomínia e acusação” – começa assim o poema “Proposição”, que termina: “A História que há-de ler-se é por mim escrita. / Anonimato igual nos cobrirá. A estas palavras não.”. O poema seguinte chama-se “Pátria” e foi glosado por outros tantos poetas, entre os quais Heliodoro Baptista ou Luís Carlos Patraquim. “As árvores chamavam-se casuarina, / eucalipto, chanfuta. Plácidos os rios também/ tinham nomes por que era costume designá-los”.

O poema que mais me impressionou deste livro – “As Imagens Quebradas” – um diálogo intertextual com Eliot: “Uma última vez percorro a cidade no dia / em que começa a minha morte. Reconheço/ estes lugares apesar da mudança e a sua / esquiva familiaridade roça-me as tolhidas/ asas da memória. Aqui escrevi. Naquela // sombra imaginei. Entre uma e outra coisa, / vivi. (…) // Caminho// pelos lugares queridos, sem tristeza, nem mágoa, / altas, condoídas árvores, lagos serenos escorrendo/ de meus olhos, hálito azul da tarde que, por cair, / de sombras vai tranquilizando o horizonte. Só, / meu coração, bate contra a pedra e o silêncio.”

Publicaria antes, como aludi o livro “O Corpo de Atena”, em 1984, no qual recupera um belíssimo poema – “Notas para a regulamentação do discurso próprio”, inicialmente dado a conhecer nos cadernos Caliban, que promoveu com o poeta João Pedro Grabato Dias. Há depois um longo interregno, um ínterim poético que dura treze anos. “O Monhé das Cobras” (1997), a sua derradeira obra, é publicada meses antes do seu falecimento, que ocorre no dia de Natal desse ano.

Rui Knopfli dizia-me, numa remota entrevista, quando lhe perguntei como via a questão da nacionalidade literária, o seguinte: “A nacionalidade literária é aquela que é proclamada pelos livros que nós escrevemos, pela conjuntura cultural, pela inteligência social que os produziram. Os meus livros – mesmo aqueles que eu escrevi desde que saí daqui – o seu referente é sempre, obrigatoriamente, moçambicano”. Nessa mesma conversa, nobilitava Craveirinha: “Ele é o maior de todos nós, com a Noémia ao lado e eu. Honra minha.”

O poeta, que retornaria a Moçambique, numa comovida visita em 1989, não ficou apenas na “exclusividade da memória privada”. Encontrou-se, num jubiloso convívio, com uma nova geração, que o reivindicava. Vivia então em Londres, o seu “exílio doirado”. Haveria só de ir a Portugal para, no final da vida, se entrevistar com os deuses. No poema “As Origens”: “Paro diante do jazigo de família, / Vila Viçosa, Alentejo profundo. Afinal tudo/ principiou aqui. O apelido seria, / puramente como outros, alentejano, / não fora a incursão oportunista// do estrangeiro, que perturbaria o resto, / confundido o futuro e as interpretações.”

Seria despiciendo, nesta homenagem, referir-me, com exaustão, à extensa polêmica sobre a nacionalidade literária e a dificuldade que sempre houve em enquadrar a obra de Rui Knopfli, sobretudo em Portugal. Isso caberia numa outra circunstância, não sendo o escopo desta breve evocação neste dia em que celebramos os seus 90 anos. Regozijo-me, a esta distância, por verificar que há uma geração, muito mais nova que a minha, que o reivindica, cultua e mitifica. (Rui Knopfli: “Chamais-me europeu? Pronto, calo-me. / Mas dentro de mim há savanas de aridez/ e planuras sem fim/ com longos rios langues e sinuosos, / uma fita de fumo vertical, / um negro e uma viola estalando.”)

Quando o descobri, há quarenta anos, estava de certo modo proscrito. O tempo, esse grande escultor, devolveu-o ao nosso convívio. O tempo, que é a matéria primordial da sua fecunda poesia, uma das mais altas expressões líricas deste país. Felizmente, remido: lemo-lo, cultivamo-lo, amamo-lo. Citamo-lo e glosamos a sua obra. Há teses universitárias, há livros evocativos, os poemas circulam, na medida do possível. Esta recidiva acontece apenas dentro da tribo literária? Não importa. Ele está tão esquecido e deslembrado como estão tantos outros poetas. Coisas desta pátria, que é nossa, esta pátria que também é sua. Mesmo quando ele quer, como Fernando Pessoa”: “pátria é só a língua em que me digo”, Rui Knopfli é também, ou sobretudo, poeta moçambicano. Um grande poeta moçambicano.

Rui Knopfli: “Porque eu teimo, / recuso e não alinho. Sou só. / (…) / Não entro na forma, não acerto o passo, / não submeto a dureza agreste do que escrevo / ao sabor da maioria. / Prefiro as minorias. / De alguns. De poucos. De um só se necessário/ for. Tenho esperança porém: um dia / compreendereis o profundo significado da minha / originalidade: I am really the Underground.”

22/07/2020

JOSÉ RODRIGUES JÚNIOR, UM ESBOÇO BIOGRÁFICO

Imensamente grato a Mário Silva, Neto de JRJ, pela ajuda.  Imagem retocada por mim.

 

José Rodrigues Júnior em 1974.

José Rodrigues Júnior (JRJ) pode ser hoje considerado uma uma figura de destaque e uma referência na agora chamada literatura e escrita colonial portuguesa, devotada a Moçambique, a sua vasta obra tornada em parte uma curiosidade quase museológica pelos eventos da História, em parte porque, alas, a partir do dia 25 de Abril de 1974, ele constatou achar-se, mais que no lado errado da História, no lado que perdera estrondosamente. Ainda por cima ele, que tão acarinhado fora pelos augustos e afins do regime derrubado. Hoje, há estudos e teses académicas que debicam e dilaceram, ora deliciosamente, ora sadicamente, as variadas formas em que isso está reflectido no seu pensamento e naquilo que escreveu. O Rui Knopfli refere-se a Rodrigues Júnior displicentemente, assim: “ele é exemplo extremo da pseudoliteratura que pontifica sob os auspícios do establishment”. A querida Fátima Mendonça vociferou qualquer coisa sobre “produtos pseudo-culturais nascidos artificialmente da aberrante situação colonial”. Para não falar do que aconteceu em 1964 entre ele, o então jovem Luis Bernardo Honwana e o Malangatana. Enfim.

Tudo o que, a meu ver, só valoriza a obra de JRJ, pois, no seu agregado, ela ajuda, de forma singular e quase épica, a tentar explicar, ou procurar entender, porque é que aquilo de os portugueses permanecerem alegremente em colónias africanas durou o que durou. Naturalmente, não foi porque meia dúzia de colonos achavam que aquilo lá era porreiro. Foi, em boa parte, porque a elite de Lisboa e os sucessivos regimes portugueses, reforçaram uma visão do mundo em que ter-se colónias cheias de gente que era o que era era normal, e que até era justa, moral, legal e desejável, se necessária, a sua presença – até porque aquilo era “nosso”. A partir daqui, a perspectiva eurocêntrica, da mania da superioridade racial e cultural, o uso dos factos históricos para justificar isto ou aquilo, decorreram alegremente, para grande irritação dos poucos como o Rui Knopfli, um seu contemporâneo mais iluminado, especialmente e precisamente durante as seis décadas em que JRJ pontificou em Moçambique.

Até que ponto JRJ foi aproveitado pelo regime português? assumo que o foi, claro. Para eles, ele era um dos “bons”, era genuíno, de confiança  e falava, à sua maneira, com algum conhecimento de causa (bem, ele vivia em Moçambique). Daí advinham os contrastes. É que, durante a vigência do regime criado por Salazar, quem entre os brancos não fosse, não podia publicar, era perseguido, preso, convidado a estar calado e arrumado num canto. O privilégio, putativamente reservado aos brancos, de viverem em conforto lá na Cidade da Luz no cimo da Colina, tinha, no caso moçambicano, um preço: a cooptação para estarem calados, especialmente perante o enorme elefante na sala – que um dia, mais cedo ou mais tarde, o país teria que ascender à independência e ver a sua soberania exercida por moçambicanos, esmagadoramente negros, estivessem bem ou mal preparados (estavam mal mas isso é irrelevante para a questão).

Mais: na altura, muitos, brancos e também pretos, fundamentalmente, e independentemente de outras questões, pensavam exactamente como RJR: que Portugal sem as suas colónias seria nada, e que as colónias sem Portugal estariam perdidas.

Uma vez queixei-me que, fora das poucas boutiques académicas que se degladiam com estes assuntos mais ou menos esotéricos sobre a espuma da História, existia pouca informação sobre JRJ. Mas esta semana fui agradavelmente surpreendido pelo trabalho disponibilizado na Wikipédia, em boa parte compilado por Mário Silva, um seu neto.

Eis o texto da Wikipédia, aqui ligeiramente editado por mim:

(início)

José Rodrigues Júnior (Lisboa, 26 de Outubro 1902- 16 de Novembro de 1990) foi um escritor e jornalista português que se dedicou, durante as mais que seis décadas em que ali viveu, ao estudo de Moçambique e os seus desafios e problemas, realizando viagens de inquérito económico e social através de todo território moçambicano. Embora possa ser hoje considerada controversa por alguns, a sua obra é caracterizada por um espírito ideologicamente independente, e inclui mais de 50 publicações, entre ensaios, estudos, romances e reportagens.

Descendente de madeirenses, José Rodrigues Júnior nasceu acidentalmente em Lisboa, a 26 de Outubro de 1902. Em 1919, com 17 anos de idade, embarcou para Moçambique, onde iria viver durante os 57 anos seguintes, até abandonar aquela ex-colónia portuguesa após a formalização da sua independência, em 19 de Outubro de 1976.

Foi membro da Secção de Letras da Sociedade de Estudos de Moçambique, presidente do Centro Cultural dos Novos, chefe da redação de O Emancipador, de O Jornal e do Notícias, de Lourenço Marques, e redator-principal e proprietário da revista de arte e crítica Miragem. Colaborou na revista Seara Nova, de que foi correspondente em Nampula, assim como também na revista portuense Civilização, e representou, durante muitos anos, em Lourenço Marques, o Diário de Luanda.

Como delegado do Notícias, em 1953, foi convidado pela KLM para o vôo inaugural da carreira Amesterdão-Joanesburgo, em aviões Super-Constellation, escrevendo então o livro Viagem à Holanda. Da mesma forma, em 1955, ao serviço do mesmo jornal, participou na viagem inaugural dos Super-Constellation, que então passaram a ser usados na carreira da TAP entre Lisboa e Lourenço Marques, de que veio a publicar o volume Aguarelas. No ano de 1960, em representação do jornal Diário, foi a Goa, Damão e Diu, editando o livro Terra Nossa na Costa do Malabar. Em 1962, a convite do governo da República Federal Alemã e também ao serviço do jornal Diário, visitou aquele país, publicando em seguida o livro Caminhos da Alemanha Ocidental. Em 1963, também pelo mesmo jornal, foi a Angola integrado na comitiva de jornalistas que acompanhou o Presidente da República Portuguesa, dando ao público o volume Angola-Terra de Portugal. Da mesma forma o fez, na viagem do Presidente Américo Tomás a Moçambique, de que escreveu o livro Moçambique-Terra de Portugal. Em outubro de 1965, indicado pelo ministro do Ultramar, representou Moçambique no Primeiro Encontro de Escritores Portugueses, realizado na cidade do Porto, editando o volume de crónicas e ensaios Encontros.

Na opinião da critica metropolitana da altura, “os seus estudos sobre Moçambique são, a par de notáveis obras literárias, trabalhos de sociólogo, de colonialista, de moralista e, até, de economista – e muitas das melhores páginas da nossa novelística e da nossa reportagem, destes últimos 30 anos, por exemplo, saíram das suas infatigáveis mãos”.

Da sua obra destacam-se as publicações dos livros, O Homem Negro das Regiões do Sul do Save, Os Indígenas de Moçambique, Do Homem Negro – da Sua Vida e da sua Arte, Para Uma Cultura Africana de Expressão Portuguesa, A Aventura do Mato e a Colonização Dirigida, O Negro de Moçambique, Africa – Terra de Promissão (Prémio Literatura Ultramarina), Meque o Pescador Negro (1º Prémio de Jornalismo), Terra Nossa da Costa de Malabar (Prémio Nacional Afonso de Bragança), Ruy de Noronha – Poeta de Moçambique, os romances/obras de ficção, Sehura, O Branco da Motase, Calanga, Muende (Prémio Nacional Fernão Mendes Pinto), Era o Terceiro dia de Vento Sul (Prémio Ricardo Malheiros da Academia de Ciências de Lisboa) e Omar Ali.

Rodrigues Júnior foi ainda distinguido com o Prémio Afonso de Bragança, de jornalismo, entregue no Palácio Foz, em Lisboa, em 1962. Pelo conjunto da sua obra literária, foi distinguido com o Grau de Oficial da Ordem do Infante Dom Henrique e com a Cruz de Cavaleiro da Soberana Ordem dos Cavaleiros de Colombo, pelo seu livro Caminhos da Alemanha Ocidental, em 1963.

A sua obra projectou-se para além de Portugal. Vários autores citam com relevo o seu trabalho como escritor, nas suas publicações, nomeadamente O ensaio Mozambique-Pueblo Nuevo, de Dom Francisco Elias Tejada, catedrático da universidade de Sevilha; o estudo Portuguese Africa, de James Duffy, catedrático da universidade de Harvard, em Cambridge, Massachussetts; o estudo crítico e histórico African Literature in the Portuguese Language, do Prof. Dr. Gerald M. Moser, da Pennsylvania University e o ensaio Estudios de Derecho Bantu, do prof Dr. José F. Lorca Navarrete, da Universidade de Córdova.

Após deixar Moçambique e radicar-se em Portugal, em 1976, com 74 anos de idade, residiu, entre Cabeço de Bustos (Distrito de Aveiro) e Benfica e Queluz de Baixo (Distrito de Lisboa), profundamente desiludido e amargurado com o que considerou um mundo hipócrita que não conseguiu entender, afastando-se dos homens, deixando-se aproximar e aconchegar no Mundo da Fé de Cristo, como católico que passou a acreditar ser em determinada fase da sua vida. Com 88 anos de idade, José Rodrigues Júnior faleceu no dia 16 de novembro de 1990, exilado da terra que tanto sentiu e amou durante a maior parte da sua vida – Moçambique.

Obras Publicadas:

Ensaios
A Paz e a Vida (1937)
Homem, Trabalho e Salário (1937)
Para Uma Cultura Moçambicana (1951)
Afirmação de Presença (1952)
Literatura Colonial (1953)
Considerações (1954)
Terra, Homens e Ideias (1957)
Literatura Ultramarina (O escritor, o Homem e o meio) (1962)
Depoimento (1964)
Poetas de Moçambique (1965)
Encontros (1966)
Mãe Negra (1967)
O Homem Negro das Regiões ao Sul do Save (contribuição para um juízo interpretativo do problema da sua promoção social) (1969)
Os indígenas de Moçambique (1971)
Alguns Poetas de Moçambique (1972)
Do Homem Negro – da sua Vida e da Sua Arte (1974)
Para Uma Cultura Africana de Expressão Portuguesa (1977)
Ruy de Noronha – Poeta de Moçambique (1980)
Estudos de Assuntos Ultramarinos
Caminhos de Ferro de Moçambique (1938)
Sobre indígenas e Missões (1940)
Aventura do Mato e Colonização Dirigida (1945)
O Negro de Moçambique (1955)
Transportes de Moçambique (1956)
Colonização (Contribuição para o seu estudo em Moçambique) (1959)
Alguns Aspectos Culturais do Turismo em Moçambique) (1961)
Reportagens-Inquérito
Problemas de Moçambique (1942)
Diário de Viagem (8.000 kms em Moçambique) (1943)
Actividades e Problemas do Niassa e de Manica e Sofala (1944)
A Voz dos Colonos de Moçambique (1945)
Terra Moçambicana (1945)
À Procura de Outras Terras e Outras Gentes (1947)
África – Terra de Promissão (1949)
Meque – O Pescador Negro (1950)
Por Terras de Monomotapa (1951)
Viagem à Holanda (1954)
Aguarelas (1956)
Negros e Brancos (1958)
Terra Nossa na Costa do Malabar (1961)
Caminhos da Alemanha Ocidental (1963)
Angola Terra de Portugal (1964)
Moçambique Terra de Portugal (1965)
Caminhos do Colonato do Limpopo (1965)
Quando se Pensa nos Que Lutam (1970)
Cabota-Bassa (1973)
A Alma da Nossa Rua (1974)
Romances
Sehura (1944)
O Branco da Motase (1952)
Calanga (1965)
Muende (1960)
Era o Terceiro Dia de Vento Sul (1968)
Omar Ali (1ª Edição em 1975 e 2ª Edição em 1977)
Prémios
Alguns destes trabalhos foram galardoados com diplomas, prémios nacionais e internacionais.

Diploma de Honra do Núcleo de Arte (1945)
Diploma de Honra do Concurso de Literatura Ultramarina (1945)
Prémio de Literatura Ultramarina (1949)
1º Prémio de Jornalismo (1950)
Diploma de Honra do Concurso de Literatura Ultramarina (1951)
Prémio Fernando Mendes Pinto, Nacional, de Literatura Ultramarina (1960)
Prémio Afonso de Bragança, Nacional, de Jornalismo (1962)
Grau de Oficial da Ordem do Infante Dom Henrique, pelo conjunto da sua obra literária (1964)
Cruz de Cavaleiro da Soberana Ordem dos Cavaleiros de Colombo, distinção Internacional, pelo seu livro “Caminhos da Alemanha Ocidental” (1965)
Prémio Ricardo Malheiros da Academia de Ciências de Lisboa, da classe Letras (1969)

(fim)

18/04/2019

RUI KNOPFLI

Filed under: Rui Knopfli - poeta — ABM @ 21:43

R K fotógrafo amador.

Rui Manuel Correia Knopfli (Inhambane, 10 de agosto de 1932 – Lisboa, 25 de dezembro de 1997) foi um poeta, jornalista, tradutor e crítico literário e de cinema português.

Filho de portugueses, contava na sua ascendência um bisavô suíço, de quem herdou o apelido, segundo ele mesmo, “estranho”.

Ainda criança, foi com a família viver para Lourenço Marques .

Fez os seus estudos em Lourenço Marques e em Joanesburgo.

Entre 1958 e 1974, foi delegado de propaganda médica em Lourenço Marques.

Publicou uma obra que cruza as tradições literárias portuguesa e anglo-americana. Integrou o grupo de intelectuais que, em Lourenço Marques, se opôs ao regime português de então. Brevemente, foi director d’A Tribuna (1974-1975).

Editou ainda o caderno Letras e Artes da revista Tempo, no qual publicou traduções de numerosos poetas, tais como T.S. Eliot, William Blake, Sylvia Plath, Kaváfis, Dylan Thomas, Ezra Pound, René Char e Octavio Paz.

Com o poeta João Pedro Grabato Dias (aka o pintor António Quadros), fundou em 1972 os “célebres” e esgotados cadernos de poesia Caliban.

r k b 1

r k b 2

Deixou Moçambique em Março de 1975, com 43 anos de idade, expulso pelo sintomático e então alto-comissário Vítor Crespo, que tomou esta decisão com base num editorial em que Knopfli denunciava o conúbio da Frelimo com a polícia política de Ian Smith, passou quatro meses em Lisboa antes de partir para a capital britânica.

A nacionalidade portuguesa não impediu que a sua alma fosse assumidamente africana, mas a sua desilusão pelos acontecimentos políticos está expressa na sua poesia publicada após a saída da sua terra.

Colaborou em vários jornais e revistas.

Foi adido de imprensa da delegação portuguesa na assembleia-geral das Nações Unidas (1975).

Foi Conselheiro de Imprensa na Embaixada de Portugal em Londres (1975-1997).

Morreu de doença (penso que cancro) no dia 25 de Dezembro de 1997. O seu corpo está sepultado no cemitério de Vila Viçosa, no Alentejo em Portugal, de onde a sua Família originou.

Visitou Moçambique independente apenas uma vez, em 1989.

 

NATURALIDADE

Europeu, me dizem.
Eivam-me de literatura e doutrina
européias
e europeu me chamam.

Não sei se o que escrevo tem raiz de algum
pensamento europeu.
E provável… Não. E certo,
mas africano sou.
Pulsa-me o coração ao ritmo dolente
desta luz e deste quebranto.
Trago no sangue uma amplidão
de coordenadas geográficas e mar Indico.
Rosas não me dizem nada,
caso-me mais à agrura das micaias
e ao silêncio longo e roxo das tardes
com gritos de aves estranhas.

Chamais-me europeu? Pronto, calo-me.
Mas dentro de mim há savanas de aridez
e planuras sem fim
com longos rios langues e sinuosos,
uma fita de fumo vertical,
um negro e uma viola estalando.

 

Princípio do dia

Rompe-me o sono um latir de cães

na madrugada. Acordo na antemanhã

de gritos desconexos e sacudo

de mim os restos da noite

e a cinza dos cigarros fumados

na véspera.

Digo adeus à noite sem saudade,

digo bom-dia ao novo dia.

Na mesa o retrato ganha contorno,

digo-lhe bom-dia

e sei que intimamente ele responde.

Saio para a rua

e vou dizendo bom-dia em surdina

às coisas e pessoas por que passo.

No escritório digo bom-dia.

Dizem-me bom-dia como quem fecha

uma janela sobre o nevoeiro,

palavras ditas com a epiderme,

som dissonante, opaco, pesado muro

entre o sentir e o falar.

E bom dia já não é mais a ponte

que eu experimentei levantar.

Calado,

sento-me à secretária, soturno, desencantado.

(Amanhã volto a experimentar).

Velho Colono

Sentado no banco cinzento
entre as alamedas sombreadas do parque.
Ali sentado só, àquela hora da tardinha,
ele e o tempo. O passado certamente,
que o futuro causa arrepios de inquietação.
Pois se tem o ar de ser já tão curto,
o futuro. Sós, ele e o passado,
os dois ali sentados no banco de cimento.

Há pássaros chilreando no arvoredo,
certamente. E, nas sombras mais densas
e frescas, namorados que se beijam
e se acariciam febrilmente. E crianças
rolando na relva e rindo tontamente.

Em redor há todo o mundo e a vida.
Ali está ele, ele e o passado,
sentados os dois no banco de frio cimento.
Ele a sombra e a névoa do olhar.
Ele, a bronquite e o latejar cansado
das artérias. Em volta os beijos húmidos,
as frescas gargalhadas, tintas de Outono
próximo na folhagem e o tempo.

O tempo que cada qual, a seu modo,
vai aproveitando.

Testamento

Se por acaso morrer durante o sono

não quero que te preocupes inutilmente.

Será apenas uma noite sucedendo-se

a outra noite interminavelmente.

Se a doença me tolher na cama

e a morte aí me for buscar,

beija Amor, com a força de quem ama,

estes olhos cansados, no último instante.

Se, pela triste monotonia do entardecer,

me encontrarem estendido e morto,

quero que me venhas ver

e tocar o frio e sangue do corpo.

Se, pelo contrário, morrer na guerra

e ficar perdido no gelo de qualquer Coreia,

quero que saibas, Amor, quero que saibas,

pelo cérebro rebentado, pela seca veia,

pela pólvora e pelas balas entranhadas

na dura carne gelada,

que morri sim, que não me repito,

mas que ecoo inteiro na força do meu grito.

ILHA DOURADA

A fortaleza mergulha no mar

os cansados flancos

e sonha com impossíveis

naves moiras

Tudo mais são ruas prisioneiras

e casas velhas a mirar o tédio

As gentes calam na

voz

uma vontade antiga de lágrimas

e um riquexó de sono

desce a Travessa da “Amizade”

Em pleno dia claro

vejo-te adormecer na distância,

Ilha de Moçambique,

e faço-te estes versos

de sal e esquecimento

De “A Ilha de Próspero”

UNIFORME DE POETA

Ajustei minha cabeleira longa,

coloquei-lhe ao de cima meu

chapéu de coco em fibra sintética,

sacudi a densa poeira das asas encardidas

e, dependurada a lira a tiracolo,

saio para a rua

em grande uniforme de poeta.

Tremei guardas-marinhas,

alferes do activo em

situação de disponibilidade:

meu ridículo hoje suplanta

o vosso e nele se enleia e perturba

o suspiro longo das meninas

romântico-calculistas.

MAXILAR TRISTE

Suave curva dolorosa

atenuando o bordo rijo

desse rosto derradeiro

de brancura infinita.

Impugnando-lhe a doçura,

a antinomia do tempo

acentuará os duros ângulos

num mapa de tristeza

irreparável. O sorriso

vago nela projecta um

brilho fosco de loiça antiga:

espreitando na carne

os dentes anunciam o resto.

 

Notas e ligações:

Comentário no sítio da extinta Livraria Trindade sobre Rui e a Ilha de Próspero.

Eduardo Pitta, que foi seu amigo, deixou uma impressionante nota memorial.

Sobre a obra do Rui, ver aqui e aqui.

Poetas de Moçambique – Rui Knopfli, antologia poética organizada pelo Eugenio Lisboa, Belo Horizonte: Editora ufmg, 2010. 198208 p. ISBN 978-85-7041-715-2, aqui.

Sobre o significado de Próspero e Caliban, ler aqui e aqui.

Ana Cristina Dias, quando estava na Universidade de Macau, escreveu isto sobre Próspero e Caliban.

19/08/2018

A ILHA DE PRÓSPERO, DE RUI KNOPFLI, 1972

Filed under: Livro A Ilha de Próspero, Rui Knopfli - poeta — ABM @ 00:06

Para um livro tão conceituado como este do Rui Knopfli, a única maneira de o ler é comprar num alfarrabista.

Outra questão semântica e dialética: pode um branco de origem portuguesa e nascido em Inhambane reclamar a moçambicanidade antes de 1975? é que no caso do Rui, para alguns, parece que sim. Não que ele tivesse mexido uma palha nesse sentido para além do que escreveu. Não que alguém em Moçambique tivesse mexido uma palha nesse sentido, alguma vez.

Pois, são os fantasmas que nunca desaparecem. Porque não podem. Enfim, adiante.

Capa

 

Ficha

 

O Rui com a máquina fotográfica.

 

 

 

Algumas leituras adicionais relacionadas, online:

A geografia do espelho na poesia de Rui Knopfli

A Ilha de Próspero e o Repensar do Colonialismo

Knopli’s Melody

Uma leitura de A Ilha de Próspero

Entre as savanas de aridez e os horizontes da poesia: a multifacetada geopoética de Rui Knopfli

Artigo da Ana Mafalda Leite

17/08/2018

ALBERTO DE LARCERDA COM RUI KNOPFLI EM LOURENÇO MARQUES, 1963

Filed under: Alberto de Lacerda poeta, Rui Knopfli - poeta — ABM @ 16:31

O original desta foto faz parte do espólio de Alberto de Lacerda e é reproduzido com vénia.

Foto tirada durante a única vez que Lacerda visitou Moçambique depois de sair da colónia em 1946.

 

Os dois poetas num jardim em Lourenço Marques, 1963.

02/08/2018

A CASA VIEGAS EM LOURENÇO MARQUES, DESENHO DE DANA MICHAHELLES

 

A Casa Viegas acho que ficava na Rua Consiglieri Pedroso. Desenho de Dana Michahelles.

 

Anúncio da Casa Viegas na primeira página do Diário de Lourenço Marques, 7 de Agosto de 1966.

 

Poema de Rui Knopfli, retirado daqui, dedicado a Dana e em que menciona a Casa Viegas.

DANA

Pelo trajecto sangrento das acácias,
da Mafalala às areias da Polana,
ou à maré morta da Catembe;
do Ho Ling à Casa Elefante,
da Casa Viegas ao Prédio Pott;
da opulenta sombra do cajueiro
à nobre majestade do eucalipto,

ainda resiste, na memória, uma cidade.
Por tardes de longa canícula,
sentada em seu regaço, a menina
dos cabelos cor de cobre regista-lhe,
com paciente labor, na brancura
do A3, a minúcia do perfil
que esbatido aos poucos, lentamente,

no deserto da memória vai morrendo.
Dele, em tempo, só restará o sal
teimoso que, a algum verso,
há-de emprestar o travo amargo
e o que, no rigor afectuoso dos seu traço,
da insanável ferida oculta,
é, obstinadamente, a visível cicatriz.

10/06/2013

OS POETAS DE MOÇAMBIQUE EM DISCO, AGOSTO DE 1960

Muito grato ao João José Osório Reis. O seu pai, que era dono da Poliarte, foi quem editou o disco, que contém uma nota do Rui Knopfli no verso (ver em baixo) e no qual são lidos pela grande Manuela Arraiano poemas de Reinaldo Ferreira, Rui Nogar, José Craveirinha e do Rui Knopfli. Já meti uma cunha para se fazer uma gravação para meter aqui, vamos lá a ver.

Capa do disco "Poetas de Moçambique", da Poliarte em Lourenço Marques.

Capa do disco “Poetas de Moçambique”, da Poliarte em Lourenço Marques.

Verso da capa.

Verso da capa.

Imagem do disco.

Imagem do disco.

03/05/2013

A GRANDE DANA MICHAHELLES (1933-2002) E LOURENÇO MARQUES NOS ANOS 70

Dana quando mais jovem, em Lourenço Marques.

Dana quando mais jovem, em Lourenço Marques.

Dana alguns anos mais tarde, a trabalhar.

Dana alguns anos mais tarde, a trabalhar.

Cópia de um dos desenhos a tinta da Dana, aqui a Rua Consiglieri Pedroso em Lourenço Marques, 1972.

Cópia de um dos desenhos a tinta da Dana, aqui a Rua Consiglieri Pedroso em Lourenço Marques, 1972.

Dana Michahelles (1933-2002) was born in Florence, Italy, and was the daughter of artists. Her father was the Florentine painter RAM (Ruggero Michahelles), her uncle was the Futurist painter Thayaht, and her great-grandfather was Hyram Powers, the Neoclassical American sculptor. She attended the Institute of Fine Arts in Florence, but at age 15, she left for Africa where she remained for 27 years, creating a contrasting identity as an artist. In Mozambique, she remained for 27 years, she had a family, and worked extensively, never ceasing to paint. Dana’s work is relatively unknown in her birth city, and this exhibition represents a selected retrospective of her finest works which can be considered narratives, cityscapes, and visual documentation illustrating life as it is being lived, never having lost her Florentine spirit. Many people remember her drawing in the streets with her pad of paper and her pens in Maputo (Mozambique), in Lisbon, in Cape Town, and in Florence. To everyone, she has left an impression of being a quiet yet very personable artist of great talent.Dana made her drawings in the midst of people, surrounded by noise, voices, movement, by LIFE itself. She put on paper the architecture that impressed her, with a decisive and strong line to represent the heavy and structural parts, while at the same time, she was able to capture an ephemeral world in constant mutation and movement, of people — of which she sketched lightly, giving the sensation of momentary passing and fleeting moments, as one can see in many of her works. Fundamentally for her drawing style, she worked as a draftsman for 10 years with the studio of the famous Portuguese architect Amandio Alpoim Guedes (known as Pancho Guedes). It was an era when everything was still drafted by hand; the technology and instruments of today did not exist. This was an advantage that permitted her to develop a fine sense of proportion and perspective while she perfected, year after year, a particular way of using pen and ink, her very specialization.

(texto copiado e ligeiramente editado, do sítio da SACI Gallery (Palazzo dei Cartelloni, Via Sant’Antonino, 11, 50123 Florença, Itália, T 055 289 948, e-mail gallery@saci-florence.edu) que entre Janeiro e Fevereiro de 2013 fez uma exposição das obras da Dana, indicando que algumas das suas peças ainda podem ser compradas à sua Família contactando directamente a Galeria.

Em 2001, a Editora Caminho publicou um livro ilustrado com 168 páginas de cópias dos trabalhos, capa azul, com o nome da Dana (ISBN: 9789722114301). que habitualmente está esgotado e que vai por uns 50 euros.

No Facebook há um pequeno grupo de amigos e admiradores de Dana que pode ser encontrando digitando o seu nome completo.

Um sketch de Malangatana Valente, 1961.

Um sketch de Malangatana Valente, 1961.

A AVenida Dom Luiz em Lourenço Marques, junto ao Avenida Building ("Prédio Pott"), 1972.

A Avenida Dom Luiz em Lourenço Marques, junto ao Avenida Building (“Prédio Pott”), 1972.

Interior do Bazar de Lourenço Marques, 1972.

Interior do Bazar de Lourenço Marques, 1972.

Mais uma artéria de Lourenço Marques, 1972.

Mais uma artéria de Lourenço Marques, 1972.

A netrada do Hotel Club na baixa de Lourenço Marques, 1972. Actualmente o edifício é um centro cultural estrangeiro.

A entrada do Hotel Club na baixa de Lourenço Marques, 1972. Actualmente o edifício é um centro cultural estrangeiro.

A Travessa que liga da Rua Araújo à Rua Consiglieri Pedroso, na baixa velha de Lourenço Marques, 1972.

A Travessa que liga da Rua Araújo à Rua Consiglieri Pedroso, na baixa velha de Lourenço Marques, 1972.

Poema de Rui Knopfli dedidcado a Dana.

Poema de Rui Knopfli dedidcado a Dana.

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