THE DELAGOA BAY WORLD

07/08/2023

MAPA DA ILHA DE MOÇAMBIQUE DE JAN HUYGEN VAN LINSCHOTEN, 1619

Imagem colorida e retocada por mim a partir de uma digitalização, dedicada ao pesquisador Dr. David Draper, que nas suas pesquisas sobre as rotas e o uso do café acabou um dia por visitar este blog.

Moçambique existe hoje como nação tal como é por causa da pequena Ilha com o mesmo nome e porque Vasco da Gama, um navegador ao serviço do então rei de Portugal, cerca de 1500, concebeu, correctamente, que este pequeno pedaço de terra seria absolutamente crítico para manter uma rota comercial entre a base em Portugal, e a Índia e o Extremo Oriente. Uma decisão que viria a ser estruturante para Portugal, a Europa e o Mundo – e Moçambique. Os portugueses daquela altura viriam a criar pontos de comércio semelhantes quase pelo mundo inteiro, nas costas de África, Arábia, Índia e Ásia, quebrando o secular monopólio e a Barreira Otomana e muçulmana que cingia o comércio entre a Europa e o resto do mundo. Mas se Goa era a Roma do Oriente, a Jóia e o centro de decisão, a Ilha de Moçambique, que seria gerida a partir da Índia portuguesa durante dois séculos e meio, era a Base Fundamental. Sem ela, e sem os outros arquipélagos pelo caminho (Açores, Madeira, Cabo Verde, São Tomé, etc) a Rota não podia ser mantida e protegida. E como tal, tinha que ser e foi sempre defendida. A sua fortaleza, criada nesse primeiro século de ocupação, viria a ser sempre inexpugnável, durante quase cinco séculos, até ao dia em 1975 em que foi entregue por uma guarnição portuguesa à Frelimo em 1975.

Agora é um museu a cair aos bocados.

Cedo, o arrojado plano comercial português (que seria muitíssimo mais que isso, para melhor e para pior), talvez inspirado pela arrojada conquista de Ceuta em 1415 e as descobertas da Madeira e dos Açores uns anos depois – e que hoje é bafejado pelos mais alucinantes revisionismos histórico-culturais (até hoje não há um museu português para se focar nisto tudo – mas Lisboa tem museus milionários para….coches e jóias da coroa), viria a ser copiado por outras nações da Europa – nomeadamente os espanhóis, os franceses, os ingleses e os holandeses. De certa forma selando uma era de comercialização e de influência cultural, científica, social, política e militar que teve um enorme impacto e que só diminuiria no Século XX após duas guerras mundiais e o surgimento de uma curiosa vertente neo-colonial e ao mesmo tempo descolonizadora por parte das duas nações vitoriosas no segundo conflito, os Estados Unidos da América e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Talvez teimosa mas apropriadamente, Portugal foi a última nação a desfazer o nó desses tempos, principalmente porque podia ignorar uma e apertar as bolinhas à outra.

Ainda hoje, os portugueses e os seus putativos ex-colonizados não sabem bem o que fazer com todo esse legado.

A Ilha de Moçambique, mapa desenhado por Jan Huyguen van Linschoten (1563-1611) e publicado em 1619. Tosco e basicamente mais evocativo que real, o impacto da publicação dos seus mapas e relatos na Europa foi enorme na altura. Ler mais abaixo sobre o Jan. Na imagem, quatro naus estão fundeadas junto à Ilha, enquanto, em baixo, uma está a chegar. Em dois botes, homens pescam.

Sobre Jan van Linschoten, pouco conhecido dos portugueses e ainda menos dos moçambicanos, copio (com algumas edições) o texto da Wikipédia:

(início)

Jan Huygen van Linschoten (Haarlem, 1563 – Enkhuizen, 8 de Fevereiro de 1611), cujo nome é por vezes também designado Jan Huijgen van Linschoten, foi um explorador e espião holandês que viajou extensamente pelas zonas de influência portuguesa na Ásia. Convivendo intimamente com mercadores e navegadores portugueses, Linschoten terá copiado mapas e obtido outras informações sobre a navegação e práticas mercantis dos portugueses na Ásia, que permitiram a entrada dos seus compatriotas nas então denominadas Índias Orientais e, na senda destes, dos ingleses. O interesse despertado nos Países Baixos e na Inglaterra pelas informações de viajantes como Linschoten e Cornelis de Houtman (o senhor que mais tarde comandou a primeira expedição holandesa à actual Indonésia), esteve na origem do movimento de expansão comercial europeia para a Índia e sueste asiático que levou à fundação da Companhia Holandesa das Índias Orientais e da Companhia Britânica das Índias Orientais.

Jan Huygen era filho de um notário da cidade de Haarlem, mas na sua infância a família fixou-se na aldeia de Enkhuizen. A adopção do apelido van Linschoten parece indicar que a sua família era originária da aldeia do mesmo nome, Linschoten, nos arredores de Utrecht.

Partiu para Espanha em Dezembro de 1576, com apenas 13 anos de idade, para se juntar aos seus meio-irmãos Floris e Willelm Tin, que eram mercadores em Sevilha. Ali fez a sua aprendizagem nas artes do comércio internacional, acabando por se associar a mercadores portugueses e trabalhando entre Lisboa e Sevilha, actividade que manteve durante pelo menos seis anos. Para além de gosto por viagens, Jan Huygen era dotado para a aprendizagem das línguas.

Dificuldades no comércio, o desejo de aventura ou eventualmente uma missão de espionagem comercial a soldo de mercadores neerlandeses e flamengos, fizeram com que, apesar de originariamente protestante, religião então tão contestada pelos católicos portugueses como o islamismo (o carinho era mútuo) aceitasse acompanhar, na qualidade de guarda-livros, o dominicano frei Vicente da Fonseca, então nomeado arcebispo de Goa. Desse modo, integrado na comitiva do prelado, partiu para o Estado da Índia a 8 de Abril de 1583, chegando a Goa cinco meses depois, tendo feito as escalas usuais na ilha da Madeira, na Guiné, Cabo da Boa Esperança, Madagáscar e Ilha de Moçambique.

Durante a sua estadia em Goa e nas suas viagens, Jan Huyghens teve acesso aos mapas e a outras informações privilegiadas sobre o comércio e a navegação dos portugueses em África e no sueste asiático, utilizando a sua capacidade cartográfica e de desenho para copiar e desenhar novos mapas, produzindo um muito considerável acervo de informação náutica e mercantil. Algumas das cartas náuticas que copiou tinham sido mantidas cuidadosamente secretas pelos portugueses por mais de um século.

A morte do arcebispo em 1587, durante uma viagem a Lisboa, fez com que Jan Huygen deixasse a Índia e regressasse à Europa. Partiu de Goa em Janeiro de 1589, escalando a ilha de Santa Helena em Maio daquele ano.

A viagem de regresso foi interrompida na pequena ilha do Corvo, nos Açores, quando o comboio de seis embarcações em que viajava (cinco da Índia e uma de Malaca), começou a ser perseguido por galeões corsários ingleses, forçando a que as embarcações portuguesas se dirigissem para Angra, na Ilha Terceira, em busca de refúgio. A 4 de agosto de 1589, entretanto, uma violenta tempestade abateu-se sobre a cidade e os navios ancorados na baía, vindo o galeão de Malaca a naufragar. Sobre esta ocorrência, o próprio Linschoten referiu, posteriormente, no seu registo:

“Neste naufrágio da nau de Malaca perderam-se muitas valiosas mercadorias, pois era a mais rica de todas as naus, e trazia da China, das Molucas e de outras ilhas muitas preciosidades, tais como sedas, damascos, objetos de ouro e de prata, porcelanas e outras coisas de valor, cujos fardos andavam à tona de água e vinham dar à costa, recolhendo-se ainda alguns, bem como alguma quantidade de pimenta, cravo e noz moscada (…). Estes despojos foram levados para a Alfândega, que é o lugar dos impostos, a fim de que não deixassem de pagar a sua taxa, não havendo consideração pela condição miserável daqueles que, depois de fadigas incríveis e da miséria extrema da viagem de três anos, tinham sofrido uma tão grande perda com o naufrágio desta nau.”

Por força deste acidente, Linschoten permaneceu em Angra por dois anos para contabilizar as riquezas recuperadas no galeão naufragado. Nesse período percorreu a ilha, tanto por terra quanto por mar, tendo registado as suas impressões num livro anos mais tarde, acompanhadas por dois mapas detalhados: um de Goa e outro de Angra. Este último é considerado uma das mais antigas representações da cidade.

De regresso aos Países Baixos em 1592, e com a ajuda de Cornelis Claesz, um editor de Amsterdão especializado em literatura náutica e de viagens, Linschoten publicou um primeiro relato da sua viagem, a que deu o título de “Reys-gheschrift vande navigatien der Portugaloysers in Orienten” (“Relato de uma viagem pelas navegações dos portugueses no Oriente”), que foi publicado em 1595. A obra contém cartas e indicações sobre como navegar entre Portugal e as Índias Orientais, e ainda entre a Índia, a China e o Japão.

Em 1594 tomou parte na expedição de Willem Barents aos mares do norte à procura de uma passagem para o Oriente através do Árctico (Passagem do Noroeste), navegando a bordo do navio de Cornelis Nay pelos mares da Noruega e da Carélia (actual Mar de Barents, assim designado em homenagem ao comandante da expedição).

No ano seguinte (1595), voltou a participar na segunda expedição de Barents ao Oceano Árctico.

Jan Huyghen publicaria três outras obras:

– “Beschryvinghe van de gantsche custe van Guinea, Manicongo, Angola ende tegen over de Cabo de S. Augustijn in Brasilien, de eyghenschappen des gheheelen Oceanische Zees” (“Descrição de toda a costa da Guiné, Manicongo e Angola e da travessia para o Cabo de Santo Agostinho no Brasil, com as características de todo o Oceano Atlântico”) em 1597;
– “Itinerario: Voyage ofte schipvaert van Jan Huyghen van Linschoten naer Oost ofte Portugaels Indien, 1579-1592” (“Descrição da viagem do navegante Jan Huyghen van Linschoten às Índias Orientais portuguesas”) em 1596; e
– “Voyagie, ofte schip-vaert, van Ian Huyghen van Linschoten, van by Noorden om langes Noorvvegen de Noortcape, Laplant, Vinlant, Ruslandt, de VVite Zee, de custen van candenoes, Svvetenoes, Pitzora…” (“Viagem do navegante Ian Huyghen van Linschoten pelo Norte ao longo da Noruega até ao Cabo do Norte, Lapónia, Carélia, Rússia, Mar Branco, …”) em 1601.
Para além de mapas dos diversos locais por onde viajou, Linschoten também deixou conselhos cruciais, entre eles sobre a forma de se ultrapassar o controlo que os portugueses exerciam no Estreito de Malaca, sugerindo como alternativa a passagem pelo sul de Samatra através do estreito de Sunda, percurso que de facto veio a ser a principal via de penetração holandesa no sueste asiático e que esteve na origem da sua colonização dos territórios que hoje constituem a Indonésia.

Faleceu, já considerado como uma celebridade pela sua obra e num momento em que, face à perda de influência portuguesa resultante da incorporação da coroa de Portugal na monarquia castelhana durante a Dinastia Filipina (1580-1640), oportunidades para uma presença holandesa nas Índias Orientais começavam a surgir.

(fim)

19/10/2013

NAVIO PORTUGUÊS AO LARGO DA ILHA DE MOÇAMBIQUE, 1890

Filed under: Navio português na Ilha de Moç 1890 — ABM @ 21:16

Esta fotografia faz parte de uma colecção encontrada e adquirida por Francisco Villa-Lobos na feira da ladra da Porte de Clignancourt, em Paris, há alguns anos, contendo uma série de fotografias tiradas entre 1889 e 1891 por Manoel Romão Pereira, durante a Expedição Fotográfica de Marianno de Carvalho à Colónia de Moçambique. Restaurei a digitalização para colocar aqui, com agradecimentos profundos ao Francisco.

 

Navio com a bandeira portuguesa (azul e branca) fundeado creio que ao largo da Ilha de Moçambique, cerca de 1890.

Navio com a bandeira portuguesa (azul e branca) fundeado creio que ao largo da Ilha de Moçambique, cerca de 1890.

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