THE DELAGOA BAY WORLD

10/11/2020

JOÃO DE SOUSA, 1947-2020

Filed under: João de Sousa - jornalista — ABM @ 01:24

Faleceu no dia 26 de Outubro de 2020 em Maputo o jornalista e personalidade da rádio, João de Sousa. Tinha 73 anos de idade e deixa mulher e penso que dois filhos.

Em jovem, assisti ao surgimento e rápida ascenção do então jovem João de Sousa na rádio de Lourenço Marques, resultante da sua voz serena e aveludada, dicção quase perfeita e presença. Depressa fez disso a tónica da sua carreira. Por volta de 1974, quando ocorreu a brusca mudança de regime, ele, que já era um figura conhecida em quase todo o Moçambique, alinhou pelo nascente regime da Frelimo e, navegando por entre os pingos da chuva (de que destaco a sua divertidíssima versão de como foi quase raptado” durante os nefastos eventos do 7 de Setembro de 1974, presumo que como forma de não ser ostracizado pela ditadura da Frelimo) prosseguiu a sua carreira dentro do possível, chegando a ser administrador da Rádio Moçambique, que entretanto se tornou no canal privilegiado da propaganda do regime até aparecer a concorrente TVM (concorrente, durante anos, apenas nas poucas cidades onde o sinal da televisão aparecia).

Afirmando-se nacionalista, João fazia questão de criticar o regime anterior, o que era – e é – demasiadamente fácil, mas coibia-se de comentar tudo o que se seguiu, o que, aliás, se calhar era como teria que ser. Ainda assim, afirmar que ele foi descriminado por não ser branco no tempo colonial é, penso, um pouco hiperbólico. Eu acho que não. Mas ele lá sabia.

Nos quase quarenta anos que se seguiram a 1974, João valorizou como pôde o que se foi fazendo em Moçambique, emprestando a sua qualidade profissional ao mesmo tempo que omitindo o passado que havia testemunhado, até se reformar da Rádio Moçambique, altura em que, presumo que para se manter ocupado, começou a escrever umas crónicas simpáticas e interessantes em que (afinal) referia o notório passado desportivo e as personalidades que o fizeram e com quem conviveu de perto. Muitos que se lembravam dele antes da Independência, quase todos hoje pelo menos sexagenários e vivendo fora de Moçambique, liam essas crónicas com prazer e até saudade – ou saudosismo. Frequentemente, copiava fotografias dos meus blogues de Moçambique para ilustrar o que dizia.

Penso que nunca mais falámos desde a minha infância.

Nas emissões que a Rádio Moçambique o deixou fazer até finalmente lhe cortarem algo abruptamente o último programa que ainda produzia, há poucos anos, ainda o ouvi algumas vezes. A mesma voz suave e aveludada, a mesma presença, a mesma qualidade de sempre.

João de Sousa “entrevistado” pelo meu Pai em Lourenço Marques, década de 1960. O meu Pai sempre se referiu ao João com enorme afecto.

João faleceu cedo demais, infelizmente.

À sua Família, desejo que guardem as mesmas boas memórias que retenho dele.

Aspecto do velório de João de Sousa no antigo Parque José Cabral. Imagem a preto e branco colorida por mim.

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