THE DELAGOA BAY WORLD

13/09/2021

EXPEDIÇÃO NA ZAMBÉZIA, INÍCIO DO SÉC. XX

Postal de Spanos e Tsitsias, retocado.

No fim do Século XIX e início do Século XX,, exceptuando os (muito) poucos centros urbanos coloniais mais estabelecidos, como a Ilha de Moçambique, o Ibo, a Beira e Lourenço Marques, praticamente não havia estradas em Moçambique, no sentido em que se entende o termo actualmente. Quando muito, havia uns caminhos de areia, conquistados ao mato à pazada e com enxadas. Comboios, só as duas linhas Lourenço Marques- Transvaal e Beira-Rodésia do Sul.

A maioria dos futuros moçambicanos, cerca de 3 milhões de almas, vivia no mato e nas costas, da agricultura, pastoreio, caça e pesca.

A ausência de estradas significava que, para o resto da nova colónia, que era quase tudo o resto, as pessoas e os bens moviam-se essencialmente de barco (quando na costa), a pé, com carregadores, e, de burro e, mais raramente, em carroças de bois, e isto só nas zonas em que não havia a mosca tsé-tsé. E quando tocava a atravessar cursos de água, as pessoas tinham que entrar na água e molhar-se – ou, alternativamente, recorriam aos serviços de machileiros, comuns nas deslocações dos poucos europeus que se venturavam para além da costa e que raramente tinham estaleca para aguentar as doenças, os intermináveis percursos e o clima inclemente (a taxa de mortalidade dos europeus em Moçambique era assustadora face aos padrões actuais).

O postal de Spanos e Tsitsias.

Na imagem em cima, se o Exmo. Leitor prestar atenção, à frente há dois homens com chapéus contendo a sigla “CL”, significando a Companhia do Luabo. Luabo era uma localidade situada a sudeste de Quelimane e durante muitos anos foi um prazo. Por esta altura a CL era uma empresa privada.

Mas o que é que se passava nesta região da Zambézia por estas alturas? Sem dinheiro mas tendo que fazer alguma coisa para “colonizar”, o governo de Portugal alugava a maior parte da sua colónia a estrangeiros.

Na sua obra A Configuração da Estrutura Económica de Manica e Sofala e Processos de Resistência à Colonização, às tantas a autora, Janete Cravino, escreveu o seguinte:

O processo de ocupação e exploração económica, no período da colonização, era uma forma de implantação da soberania portuguesa em pontos onde o seu domínio era apenas nominal. Desse modo, a clara ameaça britânica, através do seu representante Cecil Rhodes (1890), em ocupar certas regiões com potenciais riquezas mineiras e agrícolas, tornava-se injustificada, a não ser que fosse pela força.

No centro do país, os complexos de açúcar surgiram em 1890 com a criação da Companhia de Açúcar de Moçambique, fundada em Mopeia por John Peter Hormung. O seu primeiro trabalho consistiria em transformar a produção de ópio, detida pela Mozambique Opium Cultivating and Trading Company (1877), em plantações de açúcar.

Com a ampliação do território da Companhia, em 1900, funda-se a Sociedade Açucareira da África Oriental Portuguesa, empresa constituída por capitais franceses e da qual nasceria a primeira fábrica açucareira em Marromeu, que, posteriormente, expandiria as actividades para Caia.

A Companhia do Búzi (originalmente Companhia Colonial do Búzi) teria sido fundada em 1898, por contrato entre a firma portuguesa Arriaga em Comandita e a Companhia de Moçambique que, na altura, tinha poderes majestáticos sobre o território de Manica e Sofala. Para além da agro-indústria do açúcar, a Companhia do Búzi tinha interesses nas áreas da agro-indústria, do algodão, da pecuária, da exploração madeireira, da construção naval e do fabrico de sal, conforme estipulado no artigo 10 da sua carta constitutiva.

Em 1904 surgiu a Sena Sugar Factory e, em 1905, o processo de expansão daquela, inicia-se com a expropriação dos camponeses. Em 1909, John Hornung assumiu o controle da Companhia do Luabo com todas as suas terras, tendo assinado um acordo com Paiva de Andrada, como subarrendatário dos prazos Luabo, Marral e da Companhia Assucareira de Marromeu.

A estes juntar-se-iam os prazos de Maganja d’Aquém Chire e Charre, e em 1913, o prazo Angónia como região de abastecimento de força de trabalho.

Em 1920 procede-se à fusão de todas as terras da antiga Companhia do Luabo, da Sena Sugar Factory, da Companhia de Assucar de Moçambique e da Companhia Assucareira de Marromeu. Deste alargamento surge, a Sena Sugar Estates, Ltd, com as suas plantações e instalações fabris em Luabo e em Marromeu.

(…)

A produção do açúcar da fábrica de Marromeu aumentou regularmente até à década de 70. Foi com base nas tecnologias introduzidas que, em 1972, a Sena Sugar Estates alcançou a sua maior produção de sempre, na ordem das 153.000 toneladas de açúcar, das quais, 77.850 foram produzidas pela fábrica de Marromeu e 75.150 pela fábrica de Luabo.

(…)

Em 10 de Agosto de 1978, a Sena Sugar Estates é nacionalizada, quando tinha um efectivo de 12.000 trabalhadores na fábrica de Luabo e 13.000 na de Marromeu.

Em 1985 deu-se a paralisação das duas fábricas da Sena Sugar Estates, devido ao efeito alargado da guerra civil, que afectava, não só, a estrutura social do distrito de Marromeu e Luabo, como, também, não permitia o escoamento do produto da fábrica para outras províncias e para o exterior.

11/09/2020

A SENA SUGAR ESTATES E LOCOMOTIVAS NO LUABO E EM MARROMEU, 1969

Imagem retocada.

Locomotiva Nº20 da Sena Sugar Estates, de bitola estreita, alimentada por madeira, junto da fábrica de processamento no Luabo, 1969.

Locomotiva Nº24 da Sena Sugar Estates, de bitola estreita, a levar cana de açúcar para a fábrica de processamento em Marromeu, 1969. A locomotiva foi construída pela Peckett & Sons em Bristol, Reino Unido, entre 1949 e 1957.

Sobre a Sena Sugar Estates

A Sena Sugar Estates Ltd. foi uma empresa agro-industrial dedicada à produção de açúcar, inicialmente formada com recurso a capitais maioritariamente britânicos, à qual foram atribuídas pela Companhia de Moçambique concessões de terras para o cultivo de açúcar em Luabo e Marromeu, perto da foz do rio Zambeze, e ainda uma grande plantação de copra junto de Chinde.

Escritório da Sena Sugar Estates.

Criada em 1920, resultou da fusão de várias companhias açucareiras, nomeadamente, da Companhia do Assucar de Moçambique (fundada em 1890 por John Peter Hornung e outros investidores), Companhia Açucareira da África Oriental – 1904, e da The Sena Sugar Factory – 1910.

John Peter Hornung (1861-1940). Filho de pai rico, ficou zilionário com o seu investimento na Sena Sugar e viveu a vida como um rei, em Sussex, no Reino Unido.

Não sei bem o que aconteceu à Sena Sugar Estates quando a Frelimo tomou conta de Moçambique. Provavelmente os então donos levaram um 24/20 e uns camaradas locais e daqueles países inicialmente “amigos” devem ter tentado gerir a coisa, presumo que sem grande sucesso. Um documento refere que o complexo de seguida foi severamente afectado pela guerra civil. Parece que o que restou da empresa em Moçambique, e que soa ser uma sombra do passado, foi reactivada em 2007 com o nome de Companhia de Sena. Não percebo se é detida por capitais das Ilhas Maurícias ou brasileiros e ainda se as coisas estão a correr bem ou mal. É um mistério.

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