THE DELAGOA BAY WORLD

08/10/2023

O FORTE DE SÃO CAETANO DE SOFALA

Imagens retocadas e coloridas.

A primeira presença física dos portugueses no que é a actual costa de Moçambique não foi na Ilha de Moçambique. Foi em Sofala, para onde, na altura, o ouro do interior chegava à costa e onde construiram a fortaleza de São Caetano de Sofala. A fortaleza durou uns quatrocentos anos mas não resistiu à sua localização num areal junto à costa, onde não foi protegida do mar e preservada. Hoje praticamente já não existe, o que é uma pena pois acho que tinha valor histórico.

A fortaleza em 1902
A fachada em 1905.
O que resta da fortaleza, actualmente. Foto de Amimartins.

Segundo um texto da Wikipédia. ligeiramente editado por mim:

A primitiva povoação de Sofala constituía-se num entreposto comercial Muçulmano, que juntamente com Angoche, Moçambique e Quíloa, possuíam o monopólio do ouro, oriundo de Manica e da Rodésia do Sul (Reino Monomopata), mas cujo resgate se fazia principalmente em Sofala.

Vasco da Gama, em 1502, fez um reconhecimento do local onde os portugueses viriam a estabelecer-se poucos anos depois.

De facto, decidida a impor no Oceano Índico o monopólio do comércio de especiarias, a Coroa Portuguesa enviou de Lisboa, no início de 1505, uma poderosa Armada sob o comando de D. Francisco de Almeida. Tendo a nau capitaneada por Pêro de Anaia naufragado ainda nas águas do rio Tejo, o soberano deu ordem a D. Francisco de Almeida, para partir com 14 naus e 6 caravelas, que levantaram ferro a 25 de Março de 1505. Substituída a nau de Anaia, o restante do grupo, seis embarcações, partiu a 18 de Maio, com instruções para se juntar ao primeiro grupo na altura de Moçambique (o local está ilegível no “Regimento” de D. Francisco de Almeida). Este segundo grupo tinha a missão de erguer uma fortificação em Sofala, de que Anaia levava a traça, artífices e cantarias lavradas (para o Portão de Armas, portas e janelas), e da qual ficaria Capitão-mor.

Anaia navegou para o Sul, seguindo a rota definida para contornar o cabo da Boa Esperança. Acredita-se que possa ter descido demasiadamente a Sul, talvez mesmo alcançando os 45° de latitude Sul, uma vez que sofreu com o frio do Inverno austral, tendo chegado a Sofala apenas com os navios comandados pelo seu filho, Francisco de Anaia, e pelo de Manuel Fernandes. Mais tarde reuniram-se-lhe os navios de Pero Barreto de Magalhães, João Queirós e João Vaz de Almada (este último no lugar de João Leite, que perecera em um acidente durante a viagem no Oceano Atlântico).

O Forte de São Caetano de Sofala foi estabelecido inicialmente de forma pacífica, mediante um acordo com um chefe local. Os trabalhos de sua construção iniciaram-se a 25 de Setembro de 1505, quando foi erguida uma paliçada de madeira, de planta quadrada, tendo Pero de Anaia determinado abrir um fosso ao redor para, em segurança, poder começar a erguer os muros do forte. Cada lanço do fosso tinha 120 passos de comprido, por 12 palmos de largo, e outros tantos de profundidade. Externamente ao fosso, com a terra dele retirada, o capitão determinou ainda erguer um muro entre as paliçadas que serviam de taipais, com uma altura de cerca de vinte palmos. Todo o terreno circundante foi desmatado, a fim de se abrir o campo de tiro. Essa tranqueira ficou pronta ainda em 1505, período em que foi defendida pela armada. Assim que ficou em condições de defesa, Anaia ocupou-a com uma pequena guarnição, apoiada por alguma artilharia e uma embarcação construída no local. O seu filho ficou como Capitão-do-mar da costa de Sofala, que passou a patrulhar com dois navios, visando controlar o comércio de ouro que a partir dali se fazia, principalmente com Cambaia (um centro mercantil em Gujerate, na Índia). Os demais navios seguiram viagem para a Índia, onde deveriam carregar especiarias.

Em face de ataques dos nativos, que em pouco tempo destruíram parte da tranqueira, constatou-se a insuficiência do primitivo reduto, cogitando-se a possibilidade da construção de uma fortificação mais sólida, em alvenaria de pedra. Com a morte de Pero de Anaia em 1506, foi eleito capitão o feitor Manuel Fernandes, que no ano seguinte iniciou a construção com alvenaria de pedra e cal trazidas de Quíloa, tendo sido por ele erguida a chamada Torre de Menagem.

De 1509 a 1512, sob o comando do capitão António de Saldanha, construiu-se uma barbacã em redor da fortificação e novas casas para a guarnição que, até então, se alojava no local onde se situava a cisterna. Em 1516 a 1518, vemos João Vaz de Almada como seu capitão e alcaide-mor.

Frei João dos Santos, o cronista da “Etiópia Oriental”, no último quartel do século XVI, assim descreveu a Fortaleza de São Caetano de Sofala:

“É a fortaleza de Sofala quadrada e cercada de muro de vinte e cinco palmos de altura. Tem quatro baluartes redondos nos quatro cantos, guarnecidos de artilharia grossa e miúda. Em uma quadra da banda do mar, tem uma larga e formosa torre de dois sobrados, e ao pé dela uma sala formosíssima, as quais casas são aposentos do capitão da fortaleza. Nos baixos desta sala tem o capitão suas despensas, e no vão da torre do chão até o primeiro sobrado, uma mui formosa e boa cisterna de água da chuva, de que bebe ordinariamente a mais gente de Sofala, por ser muito melhor que a dos poços, e não bebem do rio, porque ali é toda sua água muito salgada. Dentro desta fortaleza está a igreja matriz, que é a freguesia de toda a gente da terra.”
Embora a importância comercial de Sofala tenha decaído ao longo dos séculos, de tal modo que em 1650 o Vice-rei D. Filipe de Mascarenhas recomendava a sua demolição por falta de condições para resistir a um eventual ataque dos Neerlandeses, activos no litoral de Moçambique desde o início do século XVII. A Coroa, entretanto, seguiu renovando as recomendações pela conservação e apetrechamento do forte, devido não apenas ao prestígio de que este desfrutava junto do rei do Quiteve, em cujas terras se situava, mas também pelo temor que infundia aos africanos.

Em 1758, entretanto, a erosão marítima solapava-lhe os muros e a igreja em seu interior apresentava sinais de desgaste.

No século seguinte, em 1826 já não havia vestígios da igreja, e um dos baluartes circulares ruíra por completo, após o mar ter-lhe solapado os alicerces. Ainda assim, resistiu com sucesso, em Outubro de 1836, ao assalto dos Mathaus, vindos do sul da Zululândia. No último quartel do século XIX, o Governador-geral de Moçambique, Augusto de Castilho (1885-1889), num Relatório de Junho de 1885, deixou-nos uma clara descrição de seu estado de conservação:

“(…) A fortaleza de Sofala, que é a mais antiga de todas as da província, é só inferior em importância à de S. Sebastião de Moçambique e está ainda em muito regular estado de conservação, apesar das injúrias do tempo e das maiores injúrias dos homens. Carece, todavia, de algumas reparações indispensáveis e algumas urgentes, tais como: remoção dos madeiramentos de quase todas as coberturas do terraço das casas que o cercam por dentro e sobre as quais assentam as baterias; reconstrução de dois baluartes que olham a Noroeste e Sudoeste e que parecem ter sido demolidos de propósito, pois que os alicerces mostram estar magníficos; reconstrução de uma sala contínua à secretaria e que serve hoje de terraço descoberto; apropriação de um quarto do pavimento inferior para capela, onde se arrecada condignamente uma venerável e antiquíssima imagem de S. Caetano, orago da fortaleza; reparação no carretame e palamenta da artilharia e substituição de algumas peças, quase de todo inúteis, por outras boas. Há ainda outros arranjos que o bom gosto recomenda e que o respeito pelos monumentos históricos exige. São desse número: a limpeza de todas as cantarias lavradas que estão hoje quase totalmente invisíveis sob uma espessa e estúpida camada de cal, como sucede às armas portuguesas sobre a porta de entrada; a desobstrução de outras cantarias que estão mesmo escondidas debaixo de paredes de alvenaria como se vê ainda em uma formosa arcaria manuelina junto à casa da guarda da porta; a construção de ameias no alto da torre de menagem no género das que existem no terraço das baterias baixas da torre de S. Vicente de Belém, etc. (…).”
No início do século XX as ruínas do forte ainda podiam ser apreciadas.

Actualmente, na prea-mar, o que dela restou fica quase totalmente submerso.

(fim)

25/06/2021

O FORTE DE SÃO CAETANO DE SOFALA, INÍCIO DO SÉC. XX

Filed under: Sofala - Forte de São Caetano — ABM @ 23:08

Imagem retocada, postal de G. Barth, Beira, início do Século XX.

O que restava do Forte de Sofala. O forte antecedeu a presença portuguesa na Ilha de Moçambique e foi a primeira edificação portuguesa em toda a costa oriental africana. O facto de o negócio do ouro eventualmente ter acabado ali e de a estrutura ter sido construída numa língua de areia que entretanto foi basciamente comida pelo mar, ditou o seu fim. Talvez um dia seja reconstruído e ali estabelecido um centro turístico e de interpretação histórica.

Zarina Matsinhes escreveu o seguinte sobre este monumento (editado por mim), que, por estúpido desleixo, já praticamente não existe:

O Forte de Sofala (ou mais corretamente, Forte de São Caetano de Sofala) era uma fortaleza localizada em Sofala, uma povoação costeira da actual Província de Sofala em Moçambique. A fortaleza foi mandada construir em 1505 pela coroa portuguesa, sendo a primeira fortificação de Portugal na costa oriental africana.

O forte apresentava planta quadrada, com muralhas de 22 metros de extensão, e baluartes de planta circular nos vértices. Do lado voltado para o mar, erguia-se a torre de menagem que se comunicava com a residência do capitão do forte. No vão da dita torre havia uma cisterna de grandes dimensões que fornecia água para toda a guarnição aí instalada. Pelo lado de terra, erguia-se os edifícios destinadas à feitoria. A povoação dispersava-se fora dos muros do forte.

A principal razão para a criação do forte naquele local foi o facto de ter sido identificado pelos portugueses como o porto de saída do ouro minerado na região. Ali aportavam numerosos mercadores muçulmanos para recolher o ouro que trocavam por tecidos provenientes da Índia. Ao construir aí um forte, os portugueses passavam a controlar este comércio extremamente lucrativo.

A responsabilidade pela construção do forte foi atribuída a Pêro de Anaia, que em 18 de maio de 1505 partiu de Lisboa com seis naus especificamente com esse objetivo. Chegado a Sofala, Anaia fez alguns acordos com um chefe local e deu início à construção do forte em 25 de setembro de 1505. O local escolhido para a sua edificação foi um pequeno promontório, baixo e arenoso, junto à barra e acessível ao fundeadouro. Construída inicialmente em madeira, foi sendo substituída a partir de 1507 por estruturas em pedra (incluindo as muralhas e a torre principal), mais seguras e resistentes. Dada a escassez de materiais na região, foi necessário trazê-los de locais mais distantes e até mesmo da metrópole.

Apesar da importância que lhe foi atribuída inicialmente, a manutenção desta estrutura veio a revelar-se muito cara para os benefícios que proporcionava, tendo mesmo chegado a ser arrendada a particulares. No século XVII, Sofala perdera já muita da sua importância em favor da ilha de Moçambique, que dispunha de um melhor porto e se encontrava muito melhor posicionada para atender ao comércio do vale do rio Zambeze, principal eixo de penetração para o interior do continente desde o século XV e ainda o suporte à rota marítima entre Portugal e a Índia e o Extremo Oriente. Esta perda de importância levou ao seu gradual abandono e à falta de manutenção. No século XIX já muitas das suas estruturas tinham desaparecido ou encontravam-se em estado de ruína.

O Forte, 1864.

Em 1900 parte da muralha entrou em derrocada e em 1903 é a vez da torre de menagem ruir parcialmente, vindo a ruir totalmente pouco depois. Em 1905, após a derrocada da torre, o Secretário de Estado dos Negócios da Marinha e Ultramar autorizou a entrega da fortaleza à Companhia de Moçambique, com a condição de que fosse conservada como monumento histórico. Contudo, e face aos elevados custos, o forte nunca seria recuperado, tendo grande parte das pedras usadas na sua construção levadas para a cidade da Beira e para outras cidades para a construção de edifícios.

Actualmente, o pouco que resta do forte está submerso, podendo ser visto em parte durante a maré baixa.

05/10/2018

O FORTE DE SÃO CAETANO EM SOFALA, FINAL DO SÉCULO XIX

Filed under: Sofala - Forte de São Caetano — ABM @ 00:30

 

O Forte de São Caetano em Sofala, final do Século XIX. Visitada por Pêro da Covilhã por terra em 1489, foi identificada como o ponto de ligação com o mar do ouro minado na zona de Manica. Erguido cerca de 1505 por ordem da Coroa portuguesa e após um hespanhol, Pero da Naia, ter obtido o ok de um chefe local, dele hoje já só restam as suas fundações. Foi o segundo ponto na costa que os portugueses se estabeleceram, depois de Quíloa (na actual Tanzânia) que foi ocupada uns meses antes. Mas o negócio secou, as areias tornavam perigosa a navegação, os portugueses ali caíam que nem tordos por causa da malária e eventualmente os portugueses abandonaram o local, após Vasco Gomes de Abreu ter, em 1507, capturado uma ilhota mais ao Norte, considerada mais salubre, sustentável e defensável, chamada Moçambique.

 

Escreveu Luis de Camões:

“Esta ilha pequena, que habitamos,
em toda esta terra certa escala
De todos os que as ondas navegamos
De Quíloa, de Mombaça e de Sofala;
E, por ser necessária, procuramos,
Como próprios da terra, de habitá-la;
E por que tudo enfim vos notifique,
Chama-se a pequena ilha Moçambique.

(em Os Lusíadas, Canto I, Estrofe 54)

e

«Deixando o porto, enfim, do doce rio
E tornando a cortar a água salgada,
Fizemos desta costa algum desvio,
Deitando pera o pego toda a armada;
Porque, ventando Noto, manso e frio,
Não nos apanhasse a água da enseada
Que a costa faz ali, daquela banda
Donde a rica Sofala o ouro manda.

(em Os Lusíadas, Canto V, Estrofe 73)

e ainda no Canto X, Estrofe 94:

«Olha as casas dos negros, como estão
Sem portas, confiados, em seus ninhos,
Na justiça real e defensão
E na fidelidade dos vizinhos;
Olha deles a bruta multidão,
Qual bando espesso e negro de estorninhos
Combaterá em Sofala a fortaleza,
Que defenderá Nhaia com destreza.

Aqui tem mais uns dados sobre Sofala.

Site no WordPress.com.